O Estado de São Paulo, n. 45197, 16/07/2017. Política, p. A6
Sem liquidar a fatura
Eliane Cantanhêde
16/07/2017
O início do recesso parlamentar, nesta semana, empurra o impasse e a guerra entre governo e oposição por tempo indeterminado. A oposição protela decisões porque aguarda novas bombas e não tem votos para autorizar o processo contra o presidente Michel Temer. O governo não faz outra coisa senão contar quem é contra e quem é a favor da denúncia para tentar “persuadir” os favoráveis.
No meio, está o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no colo de quem a Presidência da República pode cair caso Temer não vença no plenário da Câmara ou não resista à pressão e decida jogar a toalha. Até aqui, o presidente nem pensa em derrota nem deu o mínimo sinal de que tenha a intenção de renunciar, mas Maia parece bem animado.
Horas depois da votação da reforma trabalhista no Senado, ele avisou que não iria colaborar para Temer cumprir o acordo com os senadores de fazer mudanças via MP. Dias depois, já dava mais uma canelada no Planalto, ao negar a votação da denúncia de Rodrigo Janot pelo plenário na sexta-feira ou amanhã.
Para piorar, Maia acatou a estratégia do PT de exigir que a votação da denúncia contra Temer por corrupção passiva só possa começar com 342 deputados presentes. Senão, a denúncia não é votada, a Câmara para e o governo fica engessado e refém do Congresso, sabe-se lá por quanto tempo. Por fim, Maia encerrou a semana passada bloqueando os canais com o seu “quase sogro” Moreira Franco, um dos homens fortes do governo.
Temer reage como fera ferida e não poupa os instrumentos de governo. Fez o troca-troca dos membros da CCJ da Câmara sem nenhum pudor e, segundo a ONG Contas Abertas, despejou R$ 134 milhões em emendas parlamentares para conquistar deputados. Não custa lembrar que foi o governo quem determinou o teto de gastos e fez da busca do equilíbrio fiscal o eixo da política econômica...
É assim que o recesso de 2017 tende a ser bastante diferente do habitual, com PT, PC do B e Rede torcendo para que o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o operador Lúcio Funaro façam ainda em julho delações premiadas demolidoras contra Temer e que Rodrigo Janot apresente logo a segunda denúncia contra o presidente, por obstrução da Justiça, e, quem sabe, até a terceira, por formação de quadrilha com o “PMDB da Câmara”.
De seu lado, Temer, Moreira Franco e Eliseu Padilha vão continuar encastelados no Planalto lutando com unhas e dentes, não apenas para conquistar novos votos, mas até para evitar a sangria dos votos que o governo hoje tem. São votos suficientes para evitar que a oposição complete os 342 da derrota de Temer, mas não os 342 que o próprio governo precisa para garantir a abertura da votação e liquidar a fatura.
Significa que os dois lados continuam sem uma previsão sobre o desfecho e que muita coisa ainda pode acontecer até o dia 2 de agosto, data acordada para a votação da denúncia de Janot contra Temer no plenário. Nem a oposição tem votos para aprová-la, nem o governo, para derrubála. Os dois lados esticam a corda e ela pode estourar para lá ou para cá.
A situação de Temer continua bastante delicada e ele passa a priorizar sua defesa, em detrimento da economia e do controle de gastos. Até porque, mesmo que vença a guerra contra a denúncia por corrupção passiva, seus delatores, acusadores e adversários não descansarão até o fim do governo, seja o natural, em 2018, seja o antecipado, sabe-se lá quando.
Tornozelos à mostra. Com tantos presos e tantas prisões domiciliares, as tornozeleiras eletrônicas andam em falta, o que gera disputa e mal-estar entre polícias, Estados, instituições e até entre presos.
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Renan Truffi e Isadora Peron
16/07/2017
Dos 40 deputados que votaram pela rejeição do parecer que recomendava a abertura de investigação contra o presidente Michel Temer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, 39 tiveram R$ 266 milhões em emendas parlamentares empenhadas. Esse valor corresponde ao período entre junho, após a divulgação da delação do empresário Joesley Batista, que foi usada na denúncia contra Temer, e as duas primeiras semanas deste mês, às vésperas da votação.
Na quinta-feira passada, o colegiado barrou por 40 votos a 25 o parecer do relator Sergio Zveiter (PMDB-RJ) que recomendava a admissibilidade do pedido da Procuradoria-Geral da República para investigar Temer por corrupção passiva. Em seguida, governistas conseguiram aprovar um texto alternativo que sugere a rejeição do mesmo pedido, assinado pelo deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).
Apenas um dos 40 parlamentares que barraram o parecer de Zveiter não teve emendas liberadas desde junho: Maia Filho (PP-PI), que é suplente.
Já os 25 parlamentares que votaram contra Temer receberam cerca de metade desse valor no mesmo período. Foram liberados R$ 135 milhões em emendas dos cofres públicos para os deputados que acreditam haver indícios suficientes para uma investigação contra o presidente.
Composição. As trocas feitas pelo governo na CCJ da Câmara, antes da votação da denúncia, também ajudaram a elevar o valor desembolsado. Os 14 deputados que se tornaram titulares do colegiado da Casa com ajuda do Palácio do Planalto receberam mais de R$ 106 milhões em recursos. No entanto, dois deles contrariaram o governo e votaram pela admissibilidade da denúncia: Renata Abreu (Podemos-SP) e Laércio Oliveira (SD-SE).
O governo começou a usar as emendas como forma de aglutinar a base aliada no Congresso justamente quando as acusações contra Temer passaram a ameaçar seu mandato. Entre janeiro e maio deste ano, os mesmos 40 que votaram a favor do governo já haviam recebido pouco mais de R$ 1,6 milhão em emendas. O ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, disse que não favorece a base na liberação de emendas.
Entre os maiores beneficiados com esse tipo de recurso estão os deputados Domingos Neto (PSD-CE), com R$ 10,7 milhões, Paes Landim (PTB-PI), com R$ 10,4 milhões e o tucano Paulo Abi-Ackel, que teve outros R$ 10,1 milhões em recursos do Orçamento.
Condições. Um dos campeões no ranking, Landin negou que o valor repassado a ele tenha a ver com o seu voto. “Eu sempre votei com o governo Temer, independentemente das emendas. Sou amigo pessoal do presidente, conheço ele desde a Constituinte, eu tenho bom relacionamento com ele, e acho que, por se tratar de um julgamento político,
e politicamente falando neste momento, é imprópria a saída do presidente”, afirmou.
Terceiro colocado no “ranking de emendas”, AbiAckel foi o parlamentar responsável por apresentar o parecer favorável ao presidente na CCJ. Ele também negou que seu voto esteja ligado a isso. “Eu não me submeteria a isso, em hipótese nenhuma. O meu voto faz parte de uma convicção absoluta de que a denúncia é frágil e não suficiente para afastar um presidente da República. O voto foi baseado no meu conhecimento jurídico depois de 20 anos como advogado”, afirmou.
O deputado Domingos Neto não foi encontrado pela reportagem para comentar o assunto.
CCJ. Governistas comemoram aprovação de relatório que rejeita denúncia contra Temer
Calendário
O presidente da Câmara , Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse ontem que acredita que a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer será concluída na Casa ainda em agosto. "Vou pautar dia 2 de agosto e acredito que haverá quórum, afirmou Maia
MAIORES REPASSES
Domingos Neto (PSD-CE)
R$ 10.722.953,00
Paes Landim (PTB-PI)
R$ 10.447.143,75
Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG)
R$ 10.149.219,00
Juscelino Filho (DEM-MA)
R$ 9.821.220,00
Beto Mansur (PRB-SP)
R$ 9.809.663,00
André Moura (PSC-SE)
R$ 9.582.835,55
Hildo Rocha (PMDB-MA)
R$ 9.579.964,00
Bilac Pinto (PR-MG)
R$ 9.531.258,78
Toninho Pinheiro (PP-MG)
R$ 9.415.475,60
Fausto Pinato (PP-SP)
R$ 9.007.550,00
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Votação rápida em plenário ajudaria Temer
16/07/2017
O agendamento da votação da análise de admissibilidade da denúncia por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer para o dia 2 de agosto no plenário da Câmara, para Murillo de Aragão e Antônio Augusto de Queiroz, da Arko Advice e do Diap, atrapalham a estratégia de defesa. Embora o parecer a ser levado aos deputados seja pela rejeição da denúncia, seria melhor para o presidente liquidar a discussão sobre a acusação o quanto antes. “É evidente até certa altura que seria melhor para o presidente Michel Temer que a votação fosse rápida”, diz Aragão. Leia depoimento sobre o processo:
DEPOIMENTOS
MURILLO DE ARAGÃO, CIENTISTA POLÍTICO DA ARKO ADVICE
SEGUNDA DENÚNCIA DA PGR SERÁ FRACA
É evidente até certa altura que seria melhor para o presidente Michel Temer que a votação fosse mais rápida. Com o parecer favorável do relator da Comissão de Constituição e Justiça, no entanto, a data do dia 2 de agosto vai dar mais tempo para que Temer prepare melhor sua maioria parlamentar. Não acho que seja ruim. É até bom porque tira a pressão da imprensa sobre ele nesse período. Para ele, tecnicamente, é bom. Caso saia uma nova denúncia, pode ter algum impacto sobre a votação do dia 2. Essa suposta denúncia, de obstrução da Justiça, é fraca porque revela um diálogo que está mal colocado. O açodamento do procurador-geral Rodrigo Janot terminou enfraquecendo o que seria a bala de prata.
ANTÔNIO AUGUSTO DE QUEIROZ, ANALISTA POLÍTICO DO DIAP
DATA DIFICULTA DEFESA DO GOVERNO
Esse espaço de tempo de agora até o dia 2 de agosto dificulta a defesa de Michel Temer. Se o parecer fosse votado agora, o parlamentar votaria na sequência da aprovação da reforma trabalhista no Senado e após a rejeição do parecer favorável à denúncia contra Temer. Tudo isso daria moral para a tropa de choque do presidente. Os deputados ficariam mais à vontade para votar. O adiamento faz com que os parlamentares fiquem expostos à pressão de suas bases. Uma coisa é o parlamentar ir para casa e sentir essa indisposição em suas cidades. Outra coisa é ficar em Brasília sem perceber o nível de pressão sobre eles. Mesmo assim, só com o povo na rua é possível reverter esse placar. E está fácil acender a centelha.