O Estado de São Paulo, n. 45197, 16/07/2017. Economia, p. B1

 

Jucá admite fatiamento da reforma da previdência para facilitar aprovação

Fernando Nakagawa

16/07/2017

 

 

Posição. Líder do governo no Senado diz que algumas mudanças que não passarem agora poderão ser feitas ‘no futuro’; em relação à reforma trabalhista, afirma que a medida provisória que modificará alguns pontos será editada em consenso com o Congresso

As vitórias do governo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em relação à denúncia contra o presidente Michel Temer, e na reforma trabalhista injetaram ânimo no governo. Mesmo assim, o Palácio do Planalto parece não ter confiança suficiente de que será possível aprovar a reforma da Previdência na íntegra. Por isso, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), já admite votar apenas parte do projeto proposto e adiar “para 2018 ou para o futuro” a decisão sobre temas polêmicos que podem ser barrados pelo Congresso.

Após acompanhar a vitória do governo na CCJ na quinta-feira ao lado de Temer, Jucá recebeu o Estadão/Broadcast em seu gabinete em clima de comemoração. Ao classificar como “um sucesso” a tramitação da reforma trabalhista, o senador demonstrava especial otimismo com o fato de o governo ter conseguido no Senado votos suficientes até para aprovar uma mudança na Constituição, como a reforma da Previdência.

“Aprovamos (a trabalhista) com quórum constitucional sem necessitar. Eu precisaria ter maioria simples e botei 50 contra 26.” Segundo ele, a nova legislação trabalhista ajudará a criar até 1,5 milhão de novos empregos nos próximos dois anos.

Apesar da euforia, Jucá sabe que a situação na Câmara é bem diferente, especialmente quando se trata da impopular reforma da Previdência. “Nós temos de discutir seriamente com a base na Câmara e no Senado. Discutir e colocar para votar a reforma da Previdência. Eventualmente, se algo não passar, devemos pautar esse algo para discussão em 2018 e para o futuro”, defende.

Com o argumento de que essa reforma “não é vital para o presidente Temer”, mas que a mudança “é vital para o próximo presidente da República”, o homem forte de Temer no Congresso sinaliza que jogar parte dessa bomba no colo do próximo ocupante do Palácio do Planalto não é um problema.

“Os próximos presidentes também terão de fazer reforma da Previdência”. Ele lembra que, sem a reforma, o sucessor de Temer terá situação fiscal bem mais apertada que o atual governo. “O próximo não terá espaço (fiscal) para tergiversar diante do limite de gastos e com a situação da arrecadação e da despesa.”

O apoio do governo ao fatiamento da reforma da Previdência confirma movimento revelado pelo Estadão/Broadcast no fim de maio, quando líderes de alguns partidos passaram a defender uma reforma da Previdência mais enxuta diante do agravamento da crise política. A ideia defendida pelos deputados é manter no texto apenas a fixação de uma idade mínima para aposentadoria no País (65 anos para homens e 62 para mulheres).

Empregos. Ao contrário das nuvens sobre a reforma da Previdência, o líder do governo é muito otimista ao falar da reforma trabalhista. Para Jucá, a retomada do crescimento da economia e as novas regras do mercado de trabalho ajudarão a criar entre 1 milhão e 1,5 milhão de empregos em até dois anos. “Se a conjuntura melhorar, é claro que isso será acelerado”, diz o senador. Sobre a medida provisória que o governo prepara para alterar pontos da reforma sancionada na quinta-feira, o senador do PMDB explica que haverá discussão sobre a redação final com o Congresso e o Executivo. “Vamos discutir e, se possível,

podemos até aprimorar o texto. Daí, vai sair um entendimento e a medida provisória.”

Questionado sobre a pertinência de se realizar debate apenas agora com a reforma trabalhista já sancionada, Jucá rebate críticas. “Se debateu muito, mas é claro que sempre vai haver algo que se pode melhorar. A maioria das críticas feitas pela oposição desvirtuavam a natureza do debate, sofismavam situações inverídicas que tinham apenas o condão de atrasar o projeto”, rebate.

1,5 milhão

de empregos serão criados em dois anos com as novas regras, segundo Jucá

PERGUNTAS & RESPOSTAS

As mudanças na CLT

1. Como funciona o conceito de que o negociado prevalece sobre o legislado?

A nova legislação prevê que acordos coletivos terão força de lei em temas que não restringem direitos constitucionais. Assim, empresa e funcionário poderão negociar temas como reduzir o horário de almoço ou de trabalho e compensação por feriados. No entanto, acordos não poderão alterar temas como FGTS, 13.º salário e salário mínimo.

2. A Constituição já prevê acordos coletivos. Por que a reforma alterou a regra?

Muitos acordos atualmente são anulados pela Justiça do Trabalho mesmo sem que haja irregularidades, o que eleva custos para a empresa e contraria a vontade de trabalhadores. Com a reforma, defensores da mudança acreditam que serão fechadas “brechas jurídicas” que têm motivado muitas ações trabalhistas.

3. Qual a modificação da reforma em relação às férias?

Atualmente, só podem ser parceladas em duas vezes, sendo que um dos dois períodos não pode ser inferior a dez dias. Daqui a quatro meses, quando a nova legislação entra em vigor, será possível parcelar em até três vezes, mas nenhum desses períodos pode ser inferior a cinco dias corridos e um deles deve ser superior a 14 dias corridos.

4. Para quem já é contratado, será possível parcelar as férias de 30 dias em até três períodos no ano? Trabalhadores precisarão de um novo contrato para dividir as férias?

Segundo o Ministério do Trabalho, só será necessário novo contrato se o atual prever período de férias de 30 dias. Normalmente, contratos não mencionam o tema e vale a regra geral. Nesse caso, não é preciso nenhuma mudança para parcelar férias.

5. Quais são as modificações em relação a hora extra e banco de horas?

Hoje, horas acumuladas devem ser compensadas em, no máximo, um ano; com a reforma, o prazo para compensação é de seis meses. Hoje, são permitidas duas horas extras diárias com valor 50% maior, mas não é permitido para contrato de tempo parcial. A reforma não muda o limite e o valor, mas permite também para contrato de tempo parcial.

6. Como ficam os contratos por jornada parcial?

Atualmente, só é permitida jornada de até 25 horas semanais, sem hora extra. A reforma ampliou para 30 horas semanais sem hora extra ou até 26 horas com acréscimo de seis horas extras.

7. Como funciona o novo contrato de trabalho intermitente?

A reforma prevê contrato de trabalhador por período não contínuo. Empresa deverá convocar funcionário com três dias de antecedência e o pagamento pela hora de trabalho não poderá ser inferior à hora equivalente do salário mínimo ou valor pago aos demais empregados na mesma função. Nessa categoria, o trabalhador poderá receber menos que um salário mínimo, porque a renda depende das horas trabalhadas.

8. Quais as mudanças da reforma em relação aos trabalhadores terceirizados?

Como salvaguarda aos trabalhadores, a reforma estende aos terceirizados os mesmos serviços de alimentação, transporte, segurança e atendimento médico prestados aos empregados da empresa-mãe. Ainda proíbe a recontratação de funcionário como terceirizado por um ano e meio depois da demissão.

9. Como será a nova rescisão dos contratos de trabalho?

A reforma acaba com a obrigatoriedade de que a rescisão seja homologada no Ministério do Trabalho ou sindicato.

10. O que é a nova rescisão de contrato de trabalho por acordo?

Caso patrão e empregado cheguem a acordo para a saída sem justa causa, será pago metade do aviso prévio e da multa sobre o FGTS. Nesse caso, o trabalhador só poderá sacar 80% do Fundo de Garantia e não terá acesso ao seguro-desemprego. Continuam valendo os outros motivos de rescisão: sem justa causa por iniciativa da empresa, com justa causa do trabalhador, com justa causa da empresa ou por pedido de demissão.

11. Como ficará a responsabilização por custos nos processos trabalhistas?

Gastos de sucumbência – os honorários pagos pela parte que perde a ação – terão divisão com pagamento na proporção do que foi deferido ou não. Processos trabalhistas geralmente questionam vários assuntos, como hora extra, intervalo, insalubridade e diferença salarial. O custo do processo será calculado conforme decisão para cada tema. Se o trabalhador questionar cinco temas e perder em dois, pagará custos das ações derrotadas. Empresa continuará pagando custos das ações vencidas pelo ex-empregado.

12. A reforma acaba com o imposto sindical?

Sim. A partir de 2018 não será mais descontado compulsoriamente dos salários um dia de trabalho uma vez por ano.

13. Quais pontos ainda podem ser modificados por Medida Provisória?

Entre as mudanças propostas está a regulamentação da jornada de 12h x 36h, que deve ser prevista em acordo coletivo, e a regulamentação da jornada intermitente (quando o trabalhador é contratado sob demanda), além da volta da proibição de grávidas trabalharem em locais insalubres.