Correio braziliense, n. 19729, 02/06/2017. Economia, p. 6

 

PIB cresce 1% depois de oito trimestres de queda

Antonio Timoteo 

02/06/2017

 

 

CONJUNTURA » Alta em relação aos três meses imediatamente anteriores ainda não significa recuperação sustentável da atividade econômica. Para especialistas, o avanço das reformas é fundamental para uma retomada consistente

O Brasil voltou a crescer após dois anos de profunda recessão. O Produto Interno Bruto (PIB) do 1º trimestre de 2017 teve alta de 1% em relação ao período imediatamente anterior, superando a média de consultorias financeiras que estimavam alta de 0,9%. O resultado positivo é o primeiro após oito trimestres consecutivos de queda. Entretanto, ainda não é possível dizer se a recuperação da atividade econômica é sustentável. Para que o avanço da geração de riquezas no país se consolide, avaliam especialistas, é preciso que o Congresso Nacional aprove as reformas.

O desempenho do período foi comemorado pelo presidente Michel Temer e pelo ministro da Fazenda Henrique Meirelles. Em vídeo na internet, Temer ressaltou que a alta do PIB é resultado de um ano de trabalho de seu governo em sintonia com o Congresso. “O Brasil venceu a recessão, estamos crescendo e é uma taxa superior ao que boa parte dos analistas previam. Há pouco mais de um ano, quando eu assumi a Presidência da República, o Brasil estava mergulhado na mais profunda recessão de sua história. O número de hoje marca o renascimento da economia brasileira em bases sólidas e sustentáveis”, afirmou.

Já Meirelles, ressaltou a volta da economia a normalidade em “um tempo relativamente curto”. “Que diferença faz um ano! No ano passado, vivíamos a mais longa recessão desde a crise de 30. No entanto, o Brasil já cresceu no primeiro trimestre. Resultado da confiança e de uma maior previsibilidade da economia”. Segundo o ministro, a política econômica tornou o país mais resistente a inevitáveis choques. “O câmbio e os juros ficaram menos voláteis e a economia como um todo mais previsível.”

O otimismo do governo, esbarra, no entanto, no ceticismo do próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, responsável pelo cálculo e pela divulgação dos dados. A coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, explicou que é necessário cautela antes de afirmar que a crise ficou para trás. “Tivemos um crescimento no 1º trimestre, até expressivo, só que contra uma base reduzida. Tivemos oito trimestres seguidos de queda. Então, vamos ver o que virá pela frente.”

Ela ressaltou que o crescimento econômico do 1º trimestre não foi favorecido pelo aumento do consumo, e sim pelo acúmulo de estoques. Segundo Rebeca, parte significativa da produção, sobretudo de commodities, ainda não foi comercializada diante dos preços pouco atrativos e da baixa demanda. Apesar disso, ela avalia que a agropecuária, setor que cresceu 13,4%, continuará a favorecer a retomada da economia entre abril e junho. As produções de soja e milho devem registrar desempenho favorável no período, avaliou.

A indústria teve expansão de 0,9%, mas com retração de construção civil e de transformação, conforme o IBGE. O setor de serviços, o maior da economia brasileira, não registrou crescimento. A alta do desemprego e as restrições orçamentárias levaram os serviços financeiros, de previdência complementar e planos de saúde a encolherem. Um reflexo dessa situação é que o consumo das famílias caiu 0,1%, os gastos do governo tiveram retração de 0,6% e a formação bruta de capital fixo, que representa os investimentos, despencou 1,6%. Somente as exportações aumentaram 4,8% e as importações, 1,8%.

Mesmo com o resultado positivo de janeiro a março, o economista José Júlio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), avaliou que é cedo para afirmar que o país saiu da recessão. Para ele, a escalada da crise política prejudica a economia, e a demora para solução do impasse afeta as decisões de investimentos. Não à toa, o Ibre revisou as projeções para o 2º trimestre, que passaram de uma retração de 0,1% para uma contração de 0,4%. Além disso, a instituição estimou que a economia em 2017 terá tímida expansão de 0,2%. Anteriormente, a previsão era de alta de 0,4%.

Dúvidas

Apesar do crescimento no 1º trimestre, o país deve observar uma desaceleração desse processo nos próximos meses, com risco de retração, avalia o economista Artur Manoel Passos, do Itaú Unibanco. Ele explicou que isso pode ocorrer pela possível contribuição negativa da agropecuária entre abril e junho, além das perspectivas de encolhimento da indústria no período. Em março, a produção desabou e os indicadores antecedentes sugerem estagnação do ritmo de atividade em abril.

Mesmo com a melhora dos fundamentos econômicos, em especial a queda na taxa de juros, o avanço na agenda de reformas é fundamental para o país voltar a crescer, ressaltou Passos. “O recente aumento das incertezas pode afetar a atividade por dois canais. Primeiro, aumentando a cautela de empresas e famílias, o que enfraquece a demanda agregada e aumenta os riscos de uma rodada adicional de contração da atividade. Segundo, reduzindo o ritmo de flexibilização monetária”, alertou.

O avanço das reformas no Congresso, afirmou o economista Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, é fundamental para o país. Ele relatou que no pior cenário, com paralisia do Legislativo e dos investimentos em infraestrutura, o PIB poderia cair até 2%, levando o país a um terceiro ano consecutivo de recessão. Ele detalhou que, sem uma solução para a crise, a possível criação de 150 mil empregos no ano poderá se transformar em um fechamento de 760 mil postos de trabalho. “No pior cenário, o número de desempregados pode superar 16 milhões no fim do ano.”

Um cenário com mercado de trabalho fraco, com níveis ainda altos de endividamento das famílias e das empresas, além dos riscos de incertezas políticas permanecerem no radar, deverá limitar a força da recuperação, avaliou o economista-chefe do Goldman Sachs para América Latina, Alberto Ramos. “Mantemos nossa previsão de crescimento de 0,7% para 2017, mas a incerteza política levou a condições financeiras mais apertadas”, detalhou.