O Estado de São Paulo, n.45194 , 13/07/2017. Economia, p.B3

 

Reforma só afetará novos contratos

Segundo o Ministério do Trabalho, novas regras, que devem ser sancionadas hoje por Temer, não valem para quem já tem emprego formal

Por: Murilo Rodrigues Alves / Fernando Nakagawa

 

Murilo Rodrigues Alves

Fernando Nakagawa/BRASÍLIA

 

As novas regras trabalhistas – como meia hora de almoço e o parcelamento das férias em três períodos – só poderão reger os novos contratos formais assinados depois de novembro. “Só serão atingidos pela lei novos contratos de trabalho”, informou ontem o Ministério do Trabalho, acrescentando que esse é um preceito constitucional. O presidente Michel Temer deve assinar hoje o projeto aprovado pelo Senado.

Dessa forma, não mudará nada para quem já tem emprego formal, mesmo depois de a lei entrar em vigor – 120 dias contados a partir da sanção. O texto aprovado na terça-feira pelos senadores prevê que acordos coletivos terão força de lei em temas que não restringem direitos constitucionais. Não será permitido alterar benefícios como FGTS, 13.º salário e salário mínimo.

Com esse entendimento, os atuais contratos de trabalho não poderão ter negociados temas que podem ser ajustados pela reforma, como parcelamento de férias, organização da jornada de trabalho, banco de horas, intervalo para almoço, plano de cargos e salários, teletrabalho, troca de dia de feriado e remuneração por produtividade, entre outros pontos que passarão a contar com o princípio de que o “acordado” se sobrepõe ao “legislado”.

Os atuais contratos também não poderão ser afetados pela nova regra que prevê acordo amigável para saída do emprego. Nessa nova modalidade criada pela reforma, empresa e trabalhador poderão negociar a rescisão do contrato que dará direito ao trabalhador à metade do aviso prévio e ao saque de 80% da conta do FGTS sem direito ao seguro-desemprego.

O mesmo se aplica aos novos acordos individuais entre patrão e empregado para os chamados trabalhadores hipersuficientes – aqueles com curso superior completo e salário duas vezes maior que o teto da Previdência, ou R$ 11.062. Sem que haja um novo contrato, esse trabalhador considerado mais qualificado não será obrigado a fazer acordo individual com o empregador para negociar temas como férias, banco de horas e remuneração por produtividade.

De acordo com Thiago Kunert Bonifácio, especialista em Direito Trabalhista, a empresa não poderá demitir os funcionários e recontratá-los para forçar a migração das regras atuais para as que ainda vão entrar em vigor. “Se ficar evidente que essa demissão foi apenas para beneficiar a empresa e retirar os direitos atuais dos empregados, o funcionário pode recorrer à Justiça e pedir indenização”, explicou.

Para ele, as empresas já conseguem lidar com diferenças no tratamento aos funcionários, de acordo com as modificações das leis trabalhistas ao longo do tempo, e conseguirão se adaptar à nova realidade, embora o prazo seja curto.

 

Imposto sindical. O Ministério do Trabalho também informou que o imposto sindical cobrado anualmente dos trabalhadores com carteira assinada não será descontado do salário em 2018 após a aprovação da reforma trabalhista. Segundo o ministério, os trabalhadores não serão cobrados em março do próximo ano porque o texto aprovado prevê o fim da contribuição obrigatória que descontava um dia de trabalho por ano de cada empregado.

Esse entendimento enterra a possibilidade mencionada por alguns sindicalistas de que poderia haver, em 2018, cobrança do imposto sindical proporcional aos meses em que vigorou a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) neste ano.

Entre alguns sindicalistas, inclusive, há análise jurídica sobre o tema, já que uma corrente dos sindicatos de trabalhadores e empregadores entende que parte do imposto relativa a este ano poderia ser cobrada em março de 2018, já que a reforma trabalhista só vigorará quatro meses após a sanção presidencial – que deve ocorrer ainda esta semana. Assim, a reforma passa a entrar em vigor apenas em novembro.

O governo Michel Temer negociou com algumas centrais sindicais que criará um novo tipo de contribuição aos sindicatos, mas não obrigatória, e relacionada ao acordo coletivo. O porcentual seria decidido por meio de assembleias e convenções coletivas e pago por filiados e não filiados às entidades.

Esse é um dos pontos que devem ser incluídos numa medida provisória (MP) prometida pelo governo aos senadores para que eles não mexessem no texto aprovado pela Câmara, o que atrasaria a tramitação do projeto.

 

Polêmica

“Se ficar evidente que essa demissão foi apenas para beneficiar a empresa e retirar os direitos atuais dos empregados, o funcionário pode recorrer à Justiça e pedir indenização.”

Thiago Kurnet Bonifácio

ESPECIALISTA EM DIREITO  TRABALHISTA SOBRE DEMISSÃO  DE FUNCIONÁRIO E  SUBSEQUENTE RECONTRATAÇÃO  PELAS REGRAS  QUE VÃO ENTRAR EM VIGOR

 

O QUE PREVÊ A REFORMA

Para os contratos atuais:

» Nada muda

» Para se adequar à reforma, patrão e empregado precisarão assinar novo contrato

» Com contrato atual, não poderá haver flexibilização das condições, como parcelamento das férias e redução do horário de almoço

 

Para os contratos a partir de novembro, a negociação terá força de lei em itens como:

» Parcelamento das férias de 30 dias em até 3 vezes

» Redução do horário de almoço para até 30 minutos

» Extinção do intervalo antes da hora extra

» Organização da jornada de trabalho

» Banco de horas

» Teletrabalho

» Troca de dia de feriado » Remuneração por produtividade

 

PERGUNTAS & RESPOSTAS

1. As novas regras da reforma valem para todos os trabalhadores?

Não. Só para os contratos assinados a partir de novembro – após 120 dias da sanção. Empregados contratados atualmente terão direitos garantidos.

 

2. Por que contratos antigos não serão alterados?

Segundo o Ministério do Trabalho, a preservação de direito adquirido é um preceito constitucional

 

3. O imposto sindical será cobrado em março de 2018?

Ministério do Trabalho diz que, a princípio, não haverá cobrança

 

4. A reforma trabalhista terá de ser regulamentada?

Não há nada no texto aprovado que necessite de regulamentação

 

 

5. Para os novos contratos, quando poderá ser feita negociação entre patrão e empregado?

Valerá o princípio da livre negociação. Ou seja, acordos poderão ser fechados a qualquer momento.

 

 

 

 

 

Presidente do Conselho de Ética aceita denúncia contra senadoras

Segundo ele, há indícios de que houve quebra de decoro na ocupação da mesa diretora para evitar votação da reforma

 

Thiago Faria

Julia Lindner /BRASÍLIA

 

O presidente do Conselho de Ética do Senado, senador João Alberto Souza (PMDB-MA), aceitou ontem a abertura de processo disciplinar contra as seis senadoras da oposição que ocuparam a mesa do plenário em protesto contra votação da reforma trabalhista.

O pedido de abertura de denúncia agora deve ser analisado pelos demais membros do colegiado na próxima sessão do conselho, ainda sem data para ocorrer. Segundo o presidente do conselho, há indícios de quebra de decoro e o conselho deve analisar o caso.

A ocupação, que durou cerca de 8 horas, atrasou a análise da proposta e causou tumulto na Casa. As senadoras Gleisi Hofmann (PT-PR), Vanessa Grazziotin (PcdoB-AM), Fátima Bezerra (PT-RN), Regina Souza (PT-PI), Ângela Portela (PDTRR) e Lídice da Mata (PSD-BA) foram denunciadas pelo senador José Medeiros (PSD-MT). Outros 14 senadores assinam a representação.

O protesto das senadoras da oposição começou logo na abertura da sessão de ontem, quando, sem a presença do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), Gleisi ocupou sua cadeira. Quando Eunício chegou, a petista se recusou a levantar. Irritado, o peemedebista suspendeu a sessão e mandou apagar as luzes e cortar o som do plenário.

O protesto só foi encerrado pouco antes das 19 horas, quando Eunício conseguiu retomar seu lugar e colocou a reforma trabalhista em votação. A proposta foi aprovada por 50 votos a 19.

Como a peça apresentada contra as senadoras é uma denúncia, as penas cabíveis são advertência e censura (verbal ou escrita). Para que resulte na cassação do mandato, a peça deverá ser convertida em representação pela Mesa Diretora do Senado. Para isso, a maioria do conselho deve concordar que a acusação é fundamentada em indícios que, se comprovados, justificariam a perda temporária do exercício do mandato ou a perda do mandato.

A decisão de João Alberto difere da tomada por ele no caso relacionado ao senador Aécio Neves (PSDB-MG). Na ocasião, o peemedebista rejeitou a representação monocraticamente e só levou para análise do restante do colegiado após recurso. A maioria do conselho, porém, decidiu não dar andamento ao pedido de cassação do tucano.

 

Tratamento diferente

A decisão de João Alberto Souza difere da tomada por ele no caso relacionado ao senador Aécio Neves. Na ocasião, o peemedebista rejeitou a representação monocraticamente e só levou para análise do colegiado após recurso.