Governo corta mais R$ 5,9 bi e sobe imposto

Claudia Safatle

21/07/2017

 

 

O governo anunciou o contingenciamento de mais R$ 5,9 bilhões do Orçamento este ano, aumentou a partir de hoje o PIS/Cofins sobre a gasolina, o diesel e o etanol e deixou claro que fará o que for necessário para encerrar o ano com a meta de déficit primário de R$ 139 bilhões cumprida. Ao reafirmar o compromisso com a meta fiscal, o presidente Michel Temer quis preservar o capital político que ainda tem com as forças do mercado que o sustentam, hoje, em meio à crise que envolve o seu governo.

O corte adicional que eleva o contingenciamento para R$ 44,8 bilhões - uma soma "insustentável", segundo uma autoridade disse ao Valor -foi decidido ontem como uma medida "temporária" até que se viabilize alguma das receitas extraordinárias com as quais a área econômica conta para fechar as despesas do ano. Dentre essas estão a venda da Caixa Seguradora e a concessão da Lotex (antiga raspadinha).
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Segundo a fonte, esse corte, se não for revertido nos próximos meses, vai comprometer o funcionamento mínimo da administração federal e causar prejuízos na prestação de serviços públicos básicos à população.

Apesar de ter uma meta de déficit primário aparentemente frouxa, a perda de receitas que foi de R$ 35 bilhões no ano, até agora, compromete o seu cumprimento. As receitas esperadas não se confirmaram seja porque a inflação caiu mais do que se previa, ou porque o Congresso não aprovou as medidas enviadas pelo Executivo. A reoneração da folha de salários das empresas, por exemplo, não foi sequer votada e pode caducar no próximo mês. A repatriação de recursos no exterior e o novo Refis não vão render o que se esperava.

O aumento de impostos sobre combustíveis, conforme decreto assinado por Temer, deve gerar cerca de R$ 10,42 bilhões aos cofres públicos este ano e algo próximo a R$ 26 bilhões em 2018.

Embora o governo tenha adiado até onde foi possível a elevação de impostos, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse ontem que a medida foi necessária por causa da queda da arrecadação e da recessão herdada dos últimos anos. "Os resultados principalmente das empresas e, também, do setor financeiro, refletiram os prejuízos acumulados nos ultimos dois anos que estão sendo amortizados este ano", disse o ministro. Para ele, o mais importante está sendo preservado: a responsabilidade fiscal.

A medida entra em vigor hoje e representará um aumento de preços, na bomba, de cerca de 8%, conforme previsão oficial. O PIS/Cofins sobre a gasolina mais do que dobrou, de R$ 0,3816 por litro para R$ 0,7925 por litro. Sobre o diesel o aumento foi de R$ 0,2480 para R$ 0,4615. No caso do etanol, a alta para o produtor foi mais suave, passando de R$ 0,12 para R$ 0,1309, mas para o distribuidor saiu de zero para R$ 0,1964.

No relatório bimestral de receitas e despesas da União, que será divulgado hoje, ficará evidente que o foco do déficit público está na Previdência Social, salientou a fonte. Enquanto o Tesouro deverá produzir um superávit este ano de R$ 45 bilhões, o INSS terá déficit de R$ 185 bilhões. Isso sem considerar o déficit da previdência do funcionalismo público.

Depois que Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou parecer contra a denúncia de Temer, a área econômica acredita que a situação está mais favorável para o governo retomar a tramitação da reforma da Previdência e começar a votar a proposta ainda em agosto.

O presidente retomou o controle do processo, na avaliação da autoridade, pois quem terá que garantir quórum de 342 deputados para votar contra o parecer favorável a Temer, no plenário, é a oposição. O cenário, portanto, começa a desanuviar e torna possível avançar na Previdência, acredita.

Melhor, nesse sentido, é sair do "impasse", ver o que o governo consegue aprovar da proposta original e que ações complementares serão necessárias para cobrir o que não passar no Congresso, indicou a fonte.

Enquanto administra a frustração da arrecadação de curto prazo, os técnicos do governo aprofundam os estudos sobre a mudança estrutural da tributação. Está mais do que claro para o Fisco que o sistema tributário nacional é mais centrado na indústria, enquanto os setores que crescem mais são os de serviços, exportações e agricultura.

A expectativa, na área econômica, é que a reforma tributária saia do discurso para a vida real e corrija essa deficiência, tributando mais a renda do que os bens produzidos por esses setores.

A carga tributária caiu dois pontos percentuais do PIB nos anos recentes. Começou a perder força a partir de 2010 e isso devido ao modelo em vigor e não por causa do ritmo de expansão da atividade.

Para o governo, não está claro que o aumento do imposto sobre combustíveis e o contingenciamento adicional esgotam as medidas de natureza fiscal para fechar as contas federais este ano. Isso só vai ficar resolvido quando se tiver mais certeza sobre o ingresso de receitas extraordinárias no caixa da União.

O Tesouro Nacional contava, por exemplo, com o ingresso de R$ 2,5 bilhões de reestruturação de dívida de outorga do aeroporto do Galeão que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) não fechou. "Agora temos que correr atrás dessas receitas que ainda não performaram" para liberar uma parte do contingenciamento, adiantou a fonte.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4302, 21/07/2017. Brasil, p. A5.