Ministério não vê sentido e refuta revisão da meta fiscal

Fabio Graner e Estevão Taiar

26/07/2017

 

 

Não faz sentido falar de rever a meta fiscal no momento em que se acaba de anunciar um aumento de impostos e um aperto adicional no corte de gastos, segundo avaliações de fontes do governo feitas ao Valor. A hipótese não tem simpatia no Ministério da Fazenda e mesmo alguns assessores presidenciais demonstram resistência à tese. Ainda assim, a hipótese não pode ser completamente descartada, assim como a possibilidade de aumentar tributos não poderia.

Em entrevista coletiva, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que não sente pressão para que a meta de déficit primário de R$ 139 bilhões para o governo central neste ano seja alterada. Mas ele não descartou que essa meta seja revista no futuro, mostrando que, em caso de emergência, esse caminho pode ser acionado. A mensagem que tenta passar é que este é o último recurso.

Ele afirmou que "qualquer mudança" na meta caberá à Fazenda e ao Planejamento. Mas disse que "não há no momento essa decisão" a respeito da mudança e que considera o debate "prematuro". "Como temos dito em relação a várias outras coisas, inclusive aumento de impostos, faremos o que for necessário, o melhor para o país, dentro de uma perspectiva de realidade tributária. Acho prematuro [discutir isso], a arrecadação caiu muito, a queda da inflação fez cair muito a arrecadação", disse.

Meirelles esteve na segunda-feira com gestores do mercado financeiro, que, segundo ele, disseram que "vai ser inevitável em algum momento" a alteração do déficit. "Mas eles não são políticos", disse. Para ele, com o fim da queda da inflação no acumulado de 12 meses, que ele considera estar próximo, a retomada da atividade e o impacto do Refis, o governo espera "uma reação forte da arrecadação".

Segundo interlocutor presente ao evento, Meirelles reafirmou seu compromisso com a meta fiscal de 2017, de um déficit primário de R$ 139 bilhões. Mas os investidores disseram a ele que há ajustes que o mercado absorveria. Com o governo mostrando que está fazendo esforços para reduzir gastos obrigatórios, como o programa de demissão voluntária (PDV) para servidores federais anunciado ontem, se houver uma frustração de receita com uma concessão, por exemplo, haveria tolerância do mercado, acredita este interlocutor.

"A mudança da meta não deve ser colocada já, mas pode ser que ocorra depois de exauridas todas as possibilidades, e acho que o mercado teria maturidade para entender, porque vê o esforço sendo feito", diz a fonte do mercado.

Uma outra fonte da área reconhece que pressões por uma meta de déficit mais frouxa, como relatou reportagem de "O Globo", têm sido recorrentes. De fato, o assunto tem surgido pelo menos desde a definição da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018, que alguns integrantes da área política do governo defendiam um alvo menos ambicioso também para 2017. Mas a percepção na Fazenda é de que não cabe a discussão porque isso afetaria a credibilidade da gestão, que tem reiterado publicamente um forte comprometimento com o objetivo fiscal.

Nas semanas que precederam o relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas, a temperatura subiu no Ministério da Fazenda. A ideia inicial de liberar recursos orçamentários, admitida inclusive pelo ministro Henrique Meirelles (que não falou de números, mas disse que poderia haver algum desbloqueio), foi, diante das frustrações de receitas, substituída por uma combinação de alta de impostos e corte adicional de gastos.

A posição da secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, segundo fontes ouvidas pelo Valor, foi decisiva para a escolha desse caminho. Relatos apontam que ela teria sido incisiva na defesa junto ao ministro Meirelles de que não seria o momento de arriscar passar um sinal ao mercado de falta de comprometimento com o alvo deste ano. Na visão do Tesouro, qualquer liberação de recursos seria temerária dado o nível de incertezas que havia pelo lado das receitas e que o melhor a se fazer seria ser prudencial. A pressão funcionou e a visão mais conservadora prevaleceu, até com dose extra, já que houve aperto adicional nos gastos, que pode ser revisto caso as receitas de precatórios e outorgas se confirmem nos próximos dias.

Uma fonte palaciana destaca que se, já tivesse ocorrido a aprovação da reforma da Previdência, o que, entende, passaria um horizonte fiscal de longo prazo mais seguro aos investidores, a discussão da meta poderia até fazer algum sentido e ser menos problemática. Mas, sem isso, há um temor de como o mercado poderia reagir e, por isso, o debate é visto por essa fonte como "extemporâneo". De qualquer forma, o interlocutor garante que a reforma previdenciária será prioritária após a votação do pedido de abertura de inquérito contra o presidente Michel Temer, no início de agosto.

Fontes apontam também que o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, um dos principais auxiliares de Temer também não simpatizaria com a ideia de mudar a meta. (Colaboraram Andréa Jubé e Thais Carrança)

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4305, 26/07/2017. Brasil, p. A4.