Governo avalia novas medidas de ajuste para cumprir metas

Fabio Graner, Andréa Jubé e Edna Simão

27/07/2017

 

 

A área econômica do governo intensificou a busca de alternativas para tentar garantir o cumprimento das metas fiscais deste e do próximo ano. Os riscos de novas frustrações de receitas e o nível alto de corte das despesas públicas estão gerando apreensão em relação aos objetivos fiscais. O caminho de uma revisão das metas para patamares mais confortáveis está no radar, mas é visto como uma opção a ser acionada em caso de impossibilidade, seja de natureza técnica ou política, de outras ações em estudo, como ataques à despesa, principalmente no gasto com funcionalismo, e alta de tributos.

Os técnicos do governo têm nas últimas semanas monitorado e avaliado com maior grau de atenção os riscos de realização das receitas, que têm sido o grande problema das contas públicas. Como antecipou ontem o Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, já circulam propostas como a suspensão ou adiamento dos reajustes anunciados a várias categorias de servidores e até uma possível elevação da contribuição previdenciária dos funcionários da administração federal, de 11% para 14%, como o governo já exige dos Estados. Essas medidas, se adotadas, teriam impacto em 2018.

Para 2017, o governo tem mapeado mais possibilidades de elevação de tributos. Alternativas de medidas tributárias a serem feitas por decreto já são conhecidas, como IPI e IOF. Um dos problemas desse caminho é a rejeição de parte da sociedade, que ficou ainda mais clara após a alta do PIS/Cofins da gasolina. A medida foi até contestada na Justiça, cuja decisão contrária foi revertida na noite de ontem atendendo recurso apresentado pelo governo.

A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, admitiu ontem à tarde, em entrevista coletiva, a possibilidade de suspensão de reajustes já acordados com os servidores para reduzir despesas obrigatórias. "O que está se discutindo é a postergação de reajuste já aprovado. Prorrogação alguns meses, por um período", afirmou. "Não tem decisão especifica", acrescentou a secretária, que foi taxativa em relação ao compromisso de se cumprir a meta fiscal estabelecida em lei. O impacto de reajuste salarial acima da inflação para servidores públicos em 2018 é de R$ 7,1 bilhões.

O problema é que o governo tem sofrido pressão política para rever as metas fiscais. Lideranças do Congresso Nacional levaram ao Palácio do Planalto pedidos nesse sentido como alternativa a eventual novo aumento de impostos. Essa solução tem sido rechaçada por auxiliares do presidente Michel Temer, com a análise de que a flexibilização de metas será analisada só em caso de emergência. E, segundo uma fonte, há um acerto de que qualquer eventual movimento nessa direção será conduzido apenas pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

No Planalto, avaliações apontam que a revisão da meta deste ano daria um aceno negativo ao mercado num momento de crise política aguda, em que o governo esforça-se para manter e demonstrar o compromisso com a estabilidade fiscal. Em contrapartida, chegam do Congresso pressões para que a revisão da meta seja considerada, diante do temor de que os parlamentares sejam obrigados a votar alguma lei de aumento de tributos, impondo a eles o ônus de medida impopular em um período próximo das eleições.

O recente aumento nos combustíveis poupou os parlamentares porque dependeu apenas de decreto presidencial. No Congresso, a maioria dos deputados já está disposta a arcar com um peso: votar pelo arquivamento da denúncia pelo crime de corrupção passiva contra Temer, avalizando sua permanência no cargo. Um aumento de impostos seria um adicional que essa fatura não comportaria, segundo parlamentares.

O governo está também bastante preocupado em recuperar rapidamente algumas receitas que o permitam desbloquear os R$ 5,9 bilhões de corte adicional no Orçamento anunciado na semana passada. Os técnicos estavam até ontem de manhã otimistas com a realização de alguns recursos que faltavam para isso, mas já no início da noite apontavam dificuldades para viabilizar a reversão a tempo da publicação do decreto de programação orçamentária e financeira.

Se realmente não puder liberar nada, terá que haver algum remanejamento de limites entre os ministérios para garantir o funcionamento mínimo de alguns órgãos. Há um esforço para não deixar que, diante da maior restrição de gastos, em agosto algumas áreas tenham paralisação e causem comoção popular, como ocorreu no episódio dos passaportes. "Estamos fazendo trabalho em parceria com órgãos para preservar o fiscal e o atendimento direto ao público", disse Ana Paula.

A impressão de diferentes integrantes da equipe econômica é que as medidas da semana passada ainda permitem apostar no cumprimento da meta deste ano, a despeito dos riscos. O problema são as incertezas do final do ano, quando algumas receitas podem não se efetivar, seja por atraso de calendário ou por outro motivo. Por exemplo, os recursos decorrentes dos leilões de hidrelétricas da Cemig estão previstos para entrar em dezembro. "Mas se houver um atraso de 15 dias, você tem um problema de R$ 11 bilhões para resolver e pouco tempo e espaço para reagir com corte de despesa e alta de tributo", explicou uma fonte.

Em meio a essas avaliações, o governo também trabalha o projeto de lei orçamentária de 2018, que tem que ser enviado até o fim de agosto. Alguns veem um cenário até mais complicado do que o deste ano para a meta. Por isso, iniciativas que viabilizem um quadro melhor para a política fiscal de 2018 já estão em gestação.

E nesse contexto é que reflexões sobre o custo do funcionalismo público, uma despesa elevada e rígida do governo, se acentuam. Não é à toa que o ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira, anunciou um programa de demissão voluntária (PDV), embora os impactos em 2018 sejam menores. A iniciativa causou desconforto na Fazenda, segundo fontes, por supostamente ter pego de surpresa o ministro Meirelles, que tratou o tema como "preliminar", embora a medida já estivesse pronta.

O ministro da Fazenda, aliás, recentemente foi alvo de alguns ataques, mas ontem recebeu uma manifestação de apoio do seu colega Eliseu Padilha, da Casa Civil. Ele negou rumores sobre um suposto processo de fritura de Meirelles. E também disse que há unidade na equipe. "A área econômica está unida e integrada como esteve em todo o governo", disse Padilha. "Não há discordância entre uma pasta e outra, aumento de tributos e outras medidas para garantir o equilíbrio fiscal estão sendo construídas conjuntamente."

Padilha reforçou que todas as medidas para compensar a queda na arrecadação e garantir o cumprimento da meta estão sendo discutidas em sintonia pela área econômica e com o aval de Temer.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4306, 27/07/2017. Brasil, p. A3.