Validade de acordos de delação com PF deve ir a julgamento no Supremo

Maíra Magro

27/07/2017

 

 

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin e Marco Aurélio Mello pretendem levar a julgamento o mais brevemente possível, no plenário da Corte, uma das principais discussões jurídicas atuais envolvendo a Operação Lava-Jato: a possibilidade de a Polícia Federal fechar sozinha acordos de delação premiada, sem a participação do Ministério Público. O assunto voltou à tona nos últimos dias com a delação do publicitário Marcos Valério, fechada exclusivamente com a PF. O caso difere da grande maioria das delações da Lava-Jato, firmadas unicamente pelo Ministério Público. Relator da Lava-Jato no Supremo, Fachin tem nas mãos o primeiro caso em que uma delação feita com a PF foi remetida à corte para homologação - o acordo feito entre policiais federais e o marqueteiro Duda Mendonça. Antes de decidir se homologa o documento, dando a ele validade jurídica, Fachin prefere aguardar o posicionamento do plenário do STF sobre a possibilidade de a PF negociar e firmar delações sozinha. O ministro passou o recesso do Judiciário analisando o assunto, para chegar a uma conclusão até o fim deste mês. O tema pode chegar ao plenário no segundo semestre por duas vias: eventual questão de ordem proposta pelo próprio Fachin ou uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) apresentada no ano passado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Outra possibilidade é uma análise conjunta da Adin e do pedido de homologação da delação de Duda.

A Adin tem como relator o ministro Marco Aurélio Mello, que quer levar o caso a julgamento com urgência. "Pretendo dar preferência a esse processo porque urge uma definição sobre essa situação", disse o ministro ao Valor. Após receber o processo, Marco Aurélio abriu prazo para manifestação da Advocacia-Geral da União (AGU) e agora aguarda um parecer final da PGR. Na ação, Janot pediu uma liminar para suspender a validade de artigos da Lei das Organizações Criminosas (12.850/2013) que autorizam delegados a negociar acordos de delação sem a participação de procuradores. Para Janot, os artigos contrariam a Constituição. Como só o Ministério Público pode pedir a abertura de ação penal contra um investigado, a instituição seria a única capaz de oferecer benefícios em troca de informações dos delatores. Já a PF defende que a delação é um meio de obtenção de prova e que o benefício ao colaborador só pode ser definido ao fim do processo pelo juiz, e não por procuradores. Marco Aurélio não chegou a analisar o pedido de liminar (decisão provisória) por entender que o assunto demanda um julgamento definitivo do plenário. O ministro também encaminhou ofícios ao Executivo e ao Legislativo pedindo informações para embasar o julgamento.

Em manifestação encaminhada ao STF, o Senado defendeu a validade da lei e a rejeição da ação movida pelo procurador-geral: "Pelo arcabouço normativo constitucional e infraconstitucional, nada obsta que [a delação] seja obtida pelo delegado de polícia, afinal a redução da pena ou perdão somente poderão ocorrer judicialmente, pela decretação do perdão ou fixação minorada da pena em sede de sentença condenatória". A AGU também defendeu a validade da lei. "A colaboração premiada constitui-se em um meio de obtenção de prova no sistema de investigação criminal, tal como captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, a interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas ou o afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal. E, como qualquer meio de obtenção de prova, pode ser obtido pela autoridade policial", diz documento do órgão enviado ao ministro relator. As delações de Duda Mendonça e Marcos Valério foram inicialmente rejeitadas pelo Ministério Público, o que levou ambos a procurarem a PF. Policiais também fecharam delações com a dona da agência Pepper, Danielle Fonteles, e com a doleira Nelma Kodama. Outros acordos estão em fase de negociação.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4306, 27/07/2017. Brasil, p. A8.