O Estado de São Paulo, n. 45198, 17/07/2017. Política, p. A8.

 

Pressão de Doria acirra racha sobre futuro do PSDB

Pedro Venceslau

17/07/2017

 

 

Declarações do prefeito sobre saída definitiva de Aécio do comando do partido e mudanças na Executiva provocam reações de tucanos

 

 

A pressão desencadeada pelo prefeito João Doria pela saída definitiva e imediata do senador Aécio Neves (MG) da presidência do PSDB agravou ainda mais a crise no partido, que está dividido entre permanecer ou deixar o governo Michel Temer. Os tucanos enfrentam agora outro racha, desta vez envolvendo a realização de uma convenção nacional tucana e a mudança da configuração de sua Executiva.

Parte da cúpula partidária avalia que Doria se excedeu ao defender publicamente, anteontem, durante um evento na capital, a saída de Aécio “desde já” da presidência do PSDB. O prefeito também pediu mudanças na Executiva da legenda para acomodar um representante dos prefeitos eleitos em 2016 e indicou para a vaga o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando.

Até aliados de Aécio reconhecem que o senador deve renunciar à presidência da legenda, mas esperam uma “saída honrosa”. Por isso, dizem acreditar que as declarações do prefeito dificultam o diálogo interno.

“João Doria é um prefeito desfocado. A cidade está piorando, os buracos aumentando, os faróis estão quebrados, o capim aumentando e ele desconhece isso. Fica brigando com o Lula e nomeando gente na Executiva. Esse cara está delirando. Precisa focar na Prefeitura e mostrar resultado. Tem gente tão ou mais competente do que ele pensando no Brasil”, disse o exsenador José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela.

Aníbal é um dos mais próximos interlocutores de Aécio na cúpula tucana. O senador mineiro se licenciou da presidência do PSDB após a divulgação de um áudio no qual foi flagrado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da JBS, para pagar custos de sua defesa na Operação Lava Jato.

O conteúdo da gravação está nas delações do Grupo J&F, que controla a JBS. O senador também foi afastado, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, das funções parlamentares, retomadas após decisão do ministro Marco Aurélio Mello. Aécio manteve, entretanto, o cargo de “presidente licenciado”.

A resposta do prefeito a Aníbal veio por meio do secretário adjunto das Prefeituras Regionais, Fábio Lepique. “Nunca convivi com alguém tão focado na cidade como o João. Mas, como líder político que é, sei que pensa um partido acima de interesses menores ou pessoais. Para ele, o Brasil está acima das boquinhas, sejam de governo, sejam de partido”, afirmou.

 

Configuração. Idealizada pelo deputado Silvio Torres (SP), secretário-geral do PSDB e aliado do governador Geraldo Alckmin, a proposta de mudar a estrutura da Executiva em uma convenção nacional, marcada para agosto, tem o apoio de parte dos prefeitos tucanos, entre eles Nelson Marchezan, de Porto Alegre, e Morando.

O senador tucano Tasso Jereissati (CE), que simpatiza com a tese, tentou duas vezes convocar a Executiva do PSDB em Brasília para formatar a convenção, mas esbarrou na relutância de parte da legenda.

O grupo de Aécio resiste à ideia de uma mudança total do comando partidário, que viria acompanhada de uma “autocrítica” e “atualização do programa” da legenda. O meio-termo encontrado foi a realização, em agosto, de uma reunião ampliada com todos os membros do Diretório Nacional do PSDB. Nesse encontro, Tasso seria efetivado presidente do partido, e Aécio se afastaria.

Em seguida, o partido começaria um processo de convenções municipais e estaduais que elegeriam os delegados da reunião nacional. Só então, provavelmente entre outubro e novembro, é que haveria mudanças mais amplas no partido. “Não é o momento agora de se discutir espaços para cargos. Isso só vai acontecer após a posse do novo presidente do partido”, disse Torres.

O pano de fundo da disputa interna na legenda é a vaga de candidato do PSDB à Presidência da República em 2018. A atual Executiva do partido foi composta por Aécio em maio de 2013, quando ele foi eleito presidente do PSDB e já era précandidato ao Palácio do Planalto para a disputa de 2014.

Mesmo após a derrota para Dilma Rousseff no ano seguinte, o senador mineiro continuou comandando a máquina partidária. Em dezembro de 2016, renovou o próprio mandato e de toda a Executiva até maio de 2018, o que irritou aliados de Alckmin. Procurado por meio de sua assessoria, Aécio não quis se manifestar.

O acirramento da disputa interna ocorre no momento em que a maioria dos deputados tucanos e o próprio presidente Tasso Jereissati pressionam a sigla a entregar os cargos no governo Temer. “O PSDB está se suicidando, como o antigo PFL. Está entregando o futuro do País nas mãos da ProcuradoriaGeral da República”, avaliou o professor da USP José Augusto Guilhon-Albuquerque.

Já o cientista político Rafael Cortez, analista da Tendências Consultoria, disse que a saída seria inócua. “Sair neste momento não significa para o PSDB o descolamento da imagem de Temer. A associação com o governo já está consumada.”/ COLABOROU ALBERTO BOMBIG

 

Embates

“João Doria é um prefeito desfocado. A cidade está piorando, os buracos aumentando, os faróis estão quebrados, o capim aumentando e ele desconhece isso. Fica brigando com o Lula e nomeando gente na Executiva.”

José Aníbal

PRESIDENTE DO INSTITUTO TEOTÔNIO VILELA

 

“Nunca convivi com alguém tão focado na cidade como o João (Doria). Mas, como líder político que é, sei que pensa um partido acima de interesses menores ou pessoais. Para ele, o Brasil está acima das boquinhas, sejam de governo, sejam de partido.”

Fábio Lepique

SECRETARIO ADJUNTO DAS  PREFEITURAS REGIONAIS

 

“Não é o momento agora de discutir espaços para cargos. Isso só vai acontecer após a posse do novo presidente do partido.”

Silvio Torres

SECRETÁRIO-GERAL DO PSDB

 

“Defendo que o (senador) Tasso (Jereissati) seja o presidente efetivo, desde já. E que ele conduza uma convenção nacional em agosto, em Brasília.”

João Doria

PREFEITO DE SÃO PAULO, ANTEONTEM

 

PONTOS-CHAVE

Disputas internas na legenda

Licença

Em maio, o senador Aécio Neves se licenciou da presidência nacional do PSDB após a divulgação de trechos da delação premiada do empresário Joesley Batista.

 

Interino

Com Aécio licenciado, o senador tucano Tasso Jereissati (foto), do Ceará, assumiu o comando da legenda de forma interina, por indicação do mineiro.

 

Saída definitiva

Anteontem, os prefeitos de São Paulo, João Doria, e de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, pediram que Aécio deixe em definitivo a presidência da sigla.

 

Desembarque

A pressão de Doria agravou a crise interna na legenda, que também está dividida sobre o desembarque e a permanência no governo Michel Temer

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Condenado, Lula retoma o discurso ‘paz e amor’ em vídeo

 Francisco Carlos de Assis

17/07/2017

 

 

Após criticar ‘coxinhas’, petista defende ‘menos ódio e mais tolerância’ e diz que autoestima da população está baixa

 

 

Depois de ser condenado pelo juiz federal Sérgio Moro a 9 anos e 6 meses de prisão e após ter “rivalizado” com o prefeito João Doria (PSDB) na região do ABC paulista ao criticar os “coxinhas”, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomou o tom “paz e amor”. Em vídeo divulgado ontem no Facebook, ele afirmou que vai dedicar o tempo de vida que lhe resta para provar que o Brasil pode ser diferente e que a situação dos brasileiros pode mudar.

“O Brasil precisa de menos ódio e mais amor, de menos ódio e mais paz, de menos ódio e mais tolerância, de menos preconceito e mais compreensão”, afirmou o petista. Anteontem, no entanto, Lula questionou durante evento em Diadema: “Quero saber onde estão os coxinhas agora depois do (Michel) Temer governando este país. Cadê as panelas, hein?”

No vídeo Lula afirmou ainda que teve o “prazer de viver no País no momento de maior autoestima do povo”. “As pessoas acreditavam, sonhavam, tinham emprego e aumento de salário, queriam estudar. Tudo isso foi possível criar e agora nada parece ser possível. Nós precisamos voltar a ter autoestima, acreditar que é possível um Brasil ser diferente”, afirmou.

O petista disse ter a “consciência” de que o Brasil “pode melhorar” se for governado por alguém “que goste do povo, que conviva com o povo, que ouça o povo”. “Quero dedicar o resto de tempo que tenho na minha vida para provar que o Brasil poderá ser diferente.” Segundo o ex-presidente, é preciso que haja mais “tolerância”, já que, de acordo com ele, “hoje as pessoas estão muito preconceituosas”.

 

Desemprego. Lula também criticou o governo e o Congresso, que, segundo ele, está “desmontando as conquistas dos trabalhadores” no País. “As pessoas no Brasil hoje estão com a autoestima baixa porque a economia está muito ruim, há uma desagregação do ânimo da sociedade por conta do desemprego”, disse o ex-presidente. “Nós temos um governo que não representa nada. Temos um Congresso desacreditado, que está desmontando conquistas dos trabalhadores.”

 

Sentença. Na semana passada, Lula foi condenado por Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância, no caso do triplex do Guarujá (SP). Em pronunciamento após a sentença, o petista afirmou que pretende ser candidato à Presidência da República na eleição do ano que vem. “Se pensam que com essa sentença me tiraram do jogo, eu estou no jogo”, disse ele em entrevista. Se for condenado em segunda instância, pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), no entanto, ele ficará inelegível por causa da Lei da Ficha Limpa.

 

Cenário. ‘Brasil pode ser diferente’, disse Lula