Scheinkman apoia TLP e critica uso do FAT em subsídio a empresas

Eduardo Campos

01/08/2017

 

 

Os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) baseados em Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) são subsidiados pelos contribuintes a fundos como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), ou diretamente pelo Tesouro. Para o economista e professor da Universidade de Columbia, José Alexandre Scheinkman, não há motivo para os trabalhadores que contribuem ao FAT subsidiarem empréstimos a empresas. "A única razão para que o Tesouro subsidie empréstimos é que o retorno social do projeto exceda o retorno ao investidor privado. É difícil imaginar que os empréstimos à Oi passariam neste teste", disse o professor ao Valor. Ele defende a adoção da Taxa de Longo Prazo (TLP) em substituição à TJLP. Para Scheinkman, nada impede que, no futuro, o governo decida criar programas de subsídios a determinados empréstimos que julgue de interesse social, mas isto será feito de maneira mais explícita e sujeito ao controle do Congresso. A adoção da TLP é discutida no Congresso onde tramita a MP 777. A TLP será formada pelo juro da NTN-B de cinco anos mais a inflação em substituição à TJLP, que é arbitrada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) levando em conta a meta de inflação mais um prêmio de risco. Segundo Scheinkman, a proposta da TLP tem algumas vantagens. O tomador paga um juro real fixo e o mercado da NTN-B de cinco anos é líquido e esse prazo reflete, aproximadamente, o prazo médio dos empréstimos hoje realizados com base na TJLP. Para o especialista, é possível que no futuro, quando os mercados de títulos do governo de longo prazo ficarem mais líquidos, a legislação autorize os bancos públicos a conceder empréstimos mais longos com base em instrumentos com prazos correspondentes.

Scheinkman diz concordar com a tese levantada pelo economista Marcos Lisboa sobre a "meia entrada" no mercado de crédito direcionado. Quem não tem acesso à crédito atrelado à TJLP, paga a entrada inteira e mais um pouco. Para ele, "meia entrada" só se justificaria para projetos com um retorno social que exceda o retorno privado. Ele considera que a TLP deve ampliar a potência da política monetária, argumento defendido pelo BC, que explica que como metade do crédito no país é com recursos direcionados, são necessários movimentos mais fortes da Selic para que se tenha impacto na inflação e na atividade. Segundo Scheinkman, levando-se em conta o prazo médio dos empréstimos, o fluxo dos próximos cinco anos totalizará 50% do estoque. O que desautoriza a crítica de que a TLP não aumentaria a força da política monetária por atuar apenas no fluxo de novos empréstimos e não sobre o estoque existente. Outra crítica à medida - essa de parte do setor produtivo -é que a TLP poderia "matar" a indústria nacional, pois deixaria a compra e a tomada de crédito externo mais atrativa. Para Scheinkman como o crédito financiado na base da TJLP é racionado, as empresas nacionais já se financiam em parte no sistema financeiro privado e, principalmente as exportadoras, em parte com créditos externos. "E isso não vai mudar, porque o crédito baseado na TLP vai continuar a ser o mais vantajoso, mas restrito a certas operações", explica Scheinkman. "Se o mercado julgar que o BNDES avalia bem os riscos de crédito de seus empréstimos, o BNDES poderá vender pools de empréstimos pagando um pequeno spread sobre os juros das NTN-B e utilizar a receita para aumentar o volume de empréstimos. Não ficaria surpreso se o consequente aumento da oferta de crédito do BNDES resultasse na diminuição da dependência de empresas no crédito externo."

Outro argumento contrário à medida, rebatido pelo economista, é que o BNDES perderia o principal instrumento de um banco de desenvolvimento -a capacidade de prover funding baixo, previsível e estável de longo prazo. Para Scheinkman a nova modalidade de empréstimo dará ao tomador funding de custo real previsível. "O custo real ao BNDES vai variar com o tempo, mas será idêntico ao que o governo paga para prazos semelhantes e muito abaixo do custo de funding para o setor privado. E se o BNDES usar a TLP como base para sua taxa de empréstimos, adicionando um spread à TLP, não correrá riscos de mercado", explica. Ainda de acordo com Scheinkman a mudança para a TLP vai na "boa direção", mas é preciso também aumentar o número de empresas que, pelo menos em princípio, teriam acesso a essas linhas. Ele cita o exemplo do agronegócio, explicando que esse é um dos raros setores em que a produtividade aumentou mais no Brasil. "O agronegócio certamente recebeu mais subsídios de crédito do que deveria, mas esses subsídios foram dados de forma relativamente horizontal, pelo menos até o episódio recente de escolha de "campeões nacionais''. Isto permitiu que os produtores mais eficientes ganhassem uma maior fatia do mercado, o que melhorou a produtividade média do setor", explica.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4309, 01/08/2017. Brasil, p. A5.