O globo, n.30718 , 13/09/2017. PAÍS, p. 9

Lula depõe a Moro após revelações de Palocci

CLEIDE CARVALHO

GUSTAVO SCHMITT

13/09/2017

 

 

Ex-presidente será ouvido no processo em que é acusado de receber vantagens indevidas da Odebrecht

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva depõe hoje na Justiça Federal de Curitiba numa situação bem menos confortável do que em maio passado, quando foi interrogado pela primeira vez pelo juiz Sergio Moro e falou durante cinco horas. Desde então, Lula foi condenado a nove anos e meio de prisão por Moro, na ação que envolveu o tríplex do Guarujá, e viu o juiz aceitar a terceira denúncia contra ele apresentada pela força-tarefa de Curitiba, que tem como foco o sítio de Atibaia. Há uma semana, ele também foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República e apontado como líder de organização criminosa que resultou no pagamento de R$ 1,4 bilhão ao PT.

No depoimento de hoje, Lula deve ser perguntado principalmente sobre benefícios pagos pela Odebrecht — um imóvel de R$ 12 milhões destinado ao Instituto Lula e uma cobertura vizinha à que mora em São Bernardo do Campo. Essa é a segunda das três ações contra o ex-presidente em Curitiba.

Na última quarta-feira, o ex-ministro Antonio Palocci confirmou a Moro que a Odebrecht manteve uma conta de valores ilícitos destinados ao PT e, que, depois que Lula deixou o governo, a empreiteira também colocou à disposição dele valores para gastos pessoais, de onde teria saído o dinheiro para a compra do prédio — que não foi usado pelo Instituto Lula — e para a cobertura.

Palocci disse que Lula, ainda em 2007, conversou com ele sobre as propinas repassadas aos partidos políticos pela diretoria da Petrobras e contou que, depois disso, o presidente chegou inclusive a recomendar que fizesse reservas partidárias. No primeiro depoimento a Moro, Lula disse que as indicações políticas existiam, mas que ele não sabia sobre o esquema de corrupção. O ex-ministro disse ainda que em 2010, numa reunião com Dilma Rousseff e José Sergio Gabrielli (ex-presidente da Petrobras), Lula chegou a pedir que os contratos das sondas do pré-sal financiassem a campanha presidencial.

Palocci afirmou ter ouvido do próprio Lula que Emílio Odebrecht lhe oferecera R$ 300 milhões para uso pessoal e do PT. Chegou a classificar o relacionamento entre Lula e o empresário de “pacto de sangue”.

Assim como Palocci, o empresário Marcelo Odebrecht, filho de Emílio, também disse que Lula sabia dos recursos destinados ao PT e que, em troca, os pleitos das empresas eram atendidos.

Antonio Palocci confirmou que o imóvel destinado ao Instituto Lula foi comprado pela Odebrecht a pedido do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, e do advogado Roberto Teixeira. Disse ter alertado sobre o risco do negócio, que classificou de “tabajara” e que, por isso, Lula, já após a compra, teria desistido do imóvel. Acrescentou que R$ 4 milhões doados ao instituto saíram de propina.

Em depoimento, Marcelo Odebrecht disse ainda que Branislav Kontic, ex-assessor de Palocci, retirou R$ 9 milhões em espécie para Lula. A situação da cobertura de São Bernardo também complica o ex-presidente. O imóvel está em nome de Glaucos Costamarques, primo de Bumlai, que afirmou em depoimento só ter recebido aluguel depois que Bumlai foi preso pela Lava-Jato, em 2015.