O globo, n.30719 , 14/09/2017. PAÍS, p.6

Temer é derrotado no STF, que mantém Janot

CAROLINA BRÍGIDO

ANDRÉ SOUZA

RENATA MARIZ

14/09/2017

 

 

Em decisão unânime, plenário da Corte rejeita pedido de presidente e mantém PGR à frente de investigações

  O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve ontem o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, à frente de investigações contra o presidente Michel Temer. Com isso, abriu caminho para ele apresentar nova denúncia contra o peemedebista ainda nesta semana, a última de Janot no cargo. O advogado de Temer, Antonio Mariz, alegou que o procurador-geral é parcial e cultiva inimizade em relação ao presidente. Por nove votos a zero, a Corte negou o pedido. A decisão foi uma espécie de aval do STF ao trabalho de Janot, que foi elogiado por alguns dos ministros da Suprema Corte.

— Não há demonstração de haver qualquer dúvida quanto à condução (dos trabalhos por Janot) neste caso específico — disse a presidente do STF, Cármen Lúcia.

Celso de Mello, o mais antigo integrante da corte, declarou que Janot agiu contra “delinquentes”:

— Não posso deixar de reconhecer a atuação responsável, legítima, independente de Rodrigo Janot, que tem exercido a chefia do Ministério Público da União com grande seriedade, atento aos gravíssimos encargos que incidem sobre o Ministério Público, notadamente em situações que envolvem implacável e necessária persecução estatal movida em face de delinquentes que em contexto de criminalidade organizada atentam contra o ordenamento positivo do Estado brasileiro — disse o decano.

— Entendo que sua excelência, em todo o curso do processo, agiu no estrito limite da sua representação institucional sem revelar desejo de vingança. O procurador agiu no legítimo interesse de sua instituição, com impessoalidade — concordou Luiz Fux.

Na segunda parte da sessão, o STF julgaria um pedido da defesa para que Janot só apresentasse eventual denúncia contra Temer depois que terminar a investigação sobre os novos áudios dos delatores da JBS. Segundo Mariz, as provas poderiam ser anuladas ao fim da apuração e, portanto, não poderiam embasar uma denúncia. Cármen Lúcia adiou o julgamento antes mesmo de começar a votação, quando os ministros ensaiavam uma discussão mais acalorada sobre o tema. A ministra alegou que já estava tarde para continuar com a sessão.

 

‘PRESIDENTE NÃO CONSEGUE TRABALHAR’

No início da sessão, Mariz disse que seu cliente quer trabalhar, mas Janot não deixava, pelo excesso de investigações que propõe contra o peemedebista. Mariz afirmou que, agindo dessa forma, Janot ameaça Temer e proporciona uma fase de insegurança e incerteza para as instituições e para a sociedade. Ele recomendou “comedimento” ao procurador-geral. Mariz também afirmou que os ataques de Janot causavam sofrimento a Temer, à mulher dele, aos filhos e ao irmão que está doente.

— O presidente da República quer trabalhar e não consegue, a todo momento vem uma nova denúncia. E quando não é denúncia, é ameaça. É preciso que haja comedimento por parte do Ministério Público, cautela, cuidado. Se está acusando um cidadão brasileiro que é o presidente da República. É o homem que responderá pela nação durante um ano e meio. Deixe-o em paz! — disse o advogado.

O relator das investigações abertas a partir da JBS, ministro Edson Fachin, disse que a defesa de Temer não comprovou a alegação de que Janot agiria por perseguição e inimizade. Para sustentar o pedido, a defesa fez várias alegações — entre elas, o fato de Janot ter apresentado um pedido de abertura de inquérito por obstrução de justiça sem supostamente informar o ato que caracterizaria o crime.

— O fato do procurador-geral da República supostamente não ter informado fatos que poderiam configurar obstrução de justiça não traduzem inimizade capital — afirmou Fachin.

A defesa também argumentou que, em um congresso de jornalistas, Janot teria deixado clara a perseguição a Temer quando declarou: “Enquanto houver bambu, lá vai flecha”. Para Fux, a frase foi apenas uma metáfora para dizer que enquanto houver indícios, ele apresentaria pedidos de investigação. Para o ministro, a frase não foi dita diretamente a Temer, como alega a defesa do presidente.

— Frases de efeito são ditas a todo momento, não foi dita diretamente à parte interessada — declarou Fux.

Os demais ministros presentes concordaram. Gilmar Mendes estava ausente na primeira parte da sessão. Luís Roberto Barroso estava em viagem agendada previamente aos Estados Unidos. Janot também estava ausente. Ele foi representado pelo subprocurador-geral da República Nicolao Dino. Como Janot era alvo do pedido de impedimento, coube a outro integrante da PGR falar no caso.

— Nada, absolutamente nada autoriza a extração da conclusão de que haveria uma inimizade capital por parte do procurador-geral da República em relação ao senhor presidente da República — afirmou Dino.

A presidente do Supremo aproveitou a sessão para defender as investigações, mesmo depois que Janot for substituído pela procuradora Raquel Dodge tomará posse na segunda-feira.

— Há instituições sólidas hoje no Brasil e o Ministério Público é uma delas. O STF não permitirá que a mudança de nome altere os rumos, porque as instituições são mais importantes do que as pessoas — disse a presidente do STF.

 

Frases

“Não posso deixar de reconhecer a atuação responsável, legítima, independente de Rodrigo Janot”

Celso de Mello

Ministro do STF

 

“Supostamente não ter informado fatos que poderiam configurar obstrução de justiça não traduzem inimizade capital”

Edson Fachin

Relator da Lava-Jato

 

“O presidente quer trabalhar e não consegue, a todo momento vem uma nova denúncia. E quando não é denúncia, é ameaça”

Antonio Mariz

Advogado de Michel Temer

 

“Não há demonstração de haver dúvida quanto à condução neste caso”

Cármen Lúcia

Presidente do STF