Título: Pressão para BC baixar juros
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 16/02/2012, Economia, p. 11

Com arrocho anunciado ontem, Palácio do Planalto agora cobrará taxa básica de 9% ao ano ainda neste primeiro semestre

A sinalização que o Banco Central aguardava dos demais integrantes da equipe econômica do governo para levar a cabo o desejo da presidente Dilma Rousseff de reduzir os juros básicos da economia (Selic) para 9% ao ano ainda neste primeiro semestre de 2012 foi confirmada ontem, com o bloqueio de R$ 55 bilhões do Orçamento da União. A mensagem passada por Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) ao anunciarem o arrocho é clara: o Palácio do Planalto ajudará o BC no controle da inflação. A contenção de despesas, ainda que seja somente uma promessa por enquanto, foi sancionada pelo presidente da autoridade monetária, Alexandre Tombini.

"Estamos fazendo uma consolidação fiscal que viabiliza o aumento do investimento e dos programas sociais. Mais importante do que isso, ela abre espaço para a redução da taxa de juros. À medida que o Estado poupa mais, com a inflação caindo, contenção de gastos e resultado primário, isso abre espaço para a redução de juros", declarou Mantega. O mercado, por sinal, está cada vez mais convencido de que os juros de 9% já estão sacramentos. Mas desconfia do compromisso do ministro da Fazenda de cumprir a meta cheia do superavit primário (economia para o pagamento de encargos da dívida) de 3,1% (R$ 139,8 bilhões) do Produto Interno Bruto (PIB).

Essa desconfiança é tanta que os analistas mantêm intacta a projeção de inflação para este ano em torno de 5,3%, acima do centro da meta, de 4,5%, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). A Fazenda e o BC projetam um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 4,7%. Segundo Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco WestLB, o contingenciamento de R$ 55 bilhões não será suficiente para compensar os cortes na Selic. "Não deve ser suficiente para que a inflação convirja para o centro da meta. Para isso, seria necessária uma maior desaceleração da economia, mas esse não é o objetivo do governo", ponderou.

Maquiagem Na avaliação de Georges Catalão, gestor da Lecca Investimentos, o corte de R$ 55 bilhões é promissor e talvez permita o cumprimento do superavit. Mas, para ele, não se encaixa o discurso do governo de cumprir a meta de superavit primário e, ao mesmo tempo, impulsionar o crescimento econômico. O economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank, Jankiel Santos, foi além e considerou modesto o arrocho anunciado pelo governo. "Veio abaixo do que o mercado estava esperando, que era algo em torno de R$ 60 bilhões", afirmou.

Para Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, o bloqueio de parte do Orçamento foi bom. Ele lembrou, porém, que, nos últimos quatro anos, o superavit primário só foi atingido com a arrecadação de receitas extraordinárias. "Caso ocorra qualquer desvio desfavorável na arrecadação de impostos, o governo acionará instrumentos contábeis no curto prazo. Para citar um exemplo, a receita de concessões dos aeroportos poderia ser antecipada", detalhou. Segundo Velho, a estratégia está clara: "Priorizar o cumprimento da meta de superavit de 3,1% do PIB sem comprometer o objetivo indireto de aumentar o investimento público, custe o que custar".

Os analistas ressaltaram que os mercados não darão trégua ao governo e vão cobrar coerência no discurso. Afinal, um país que comemora o fato de ser a sexta potência econômica do mundo não se pode dar o luxo de continuar maquiando números e forjando receitas.

Por enquanto, só a placa Embora o ministro Guido Mantega prossiga no Ministério da Fazenda por pressão da presidente Dilma Rousseff, mesmo em meio a denúncias de irregularidades na Casa da Moeda, uma situação o constrangeu ontem. Enquanto explicava os cortes no Orçamento deste ano, a placa com seu nome despencou da mesa de onde estava. Depois de um breve silêncio, Mantega interrompeu a apresentação para se explicar. "Sabia que você (dirigindo-se a um jornalista) pensaria nessa maldade, mas o que caiu foi só a placa."