O globo, n.30719 , 14/09/2017. PAÍS, p.12

Justiça prende Garotinho pela segunda vez

MARCO GRILLO

14/09/2017

 

 

Reclusão é justificada por ameaça a testemunhas; ex-governador foi condenado por compra de votos

Condenado em primeira instância por compra de votos na eleição de 2016, o ex-governador Anthony Garotinho foi preso ontem pela PF. A medida cautelar foi determinada porque Garotinho é acusado de ameaçar testemunhas, destruir provas e de ter tentado subornar um juiz. Ele cumprirá prisão domiciliar e já está com tornozeleira eletrônica. O ex-governador do Rio Anthony Garotinho (PR) foi preso ontem pela Polícia Federal (PF) e condenado, em primeira instância, por compra de votos nas eleições de 2016, associação criminosa e supressão de documentos públicos. Ele vai cumprir a prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, aonde chegou ontem à tarde.

A sentença do juiz Ralph Manhães, da 100ª Zona Eleitoral de Campos, estabelece duas decisões. A primeira é a medida cautelar que determinou a prisão domiciliar imediata, pois Garotinho é acusado de ameaçar testemunhas, destruir provas e de ter tentado subornar o juiz Glaucenir Oliveira, que esteve à frente da Operação Chequinho durante um período — esse caso é apurado em outro processo. Há também a condenação a 9 anos, 11 meses e 10 dias de prisão em regime fechado, pelos crimes relacionados diretamente às fraudes no uso do programa Cheque Cidadão com o objetivo de angariar votos para candidatos a vereadores aliados. Essa medida, no entanto, precisa ser confirmada em segunda instância para que a punição passe a valer.

“Não houve um simples esquema de compra de votos, mas uma verdadeira avalanche de crimes com a sangria do dinheiro público para a eleição de um grupo político ligado ao ora réu (Garotinho)”, registrou o magistrado na decisão. “Não obstante tratar-se de crime eleitoral, o que à primeira vista poderia parecer um crime simples e de menor importância, estamos diante de crimes graves que envolvem ameaças às testemunhas e autoridades, supressão de documentos, destruição de provas e utilização de funcionários públicos para fins ilícitos”.

O juiz afirmou que o grupo do ex-governador ameaçou testemunhas “inclusive com emprego de arma de fogo”. Em maio, O GLOBO revelou que uma testemunha havia relatado à PF que fora intimidada por dois homens em uma moto.

O “esquema criminoso”, segundo a sentença, despejou R$ 11 milhões — há notas fiscais registrando as transações — dos cofres da prefeitura de Campos, então comandada por Rosinha Garotinho — o exgovernador ocupava a Secretaria de Governo — em um cadastro paralelo do Cheque Cidadão. Ao todo, 17.500 pessoas foram contempladas. De acordo com a Justiça, o mecanismo conseguiu eleger 11 dos 25 vereadores do município.

Garotinho foi apontado pela investigação, conduzida pela PF e pelo Ministério Público do Estado do Rio (MP-RJ), como o idealizador do esquema. Um formulário foi criado e, à noite, cabos eleitorais dos candidatos iam à prefeitura para recolher os papéis, que eram levados para as bases eleitorais de cada um. Após serem preenchidos pelos interessados, os formulários eram levados de volta para a sede da administração municipal.

 

GAROTINHO NEGA

Doze digitadores foram contratados especificamente para passarem ao computador os nomes dos beneficiários que iriam compor o cadastro irregular. Os nomes eram enviados por e-mail para a Trivale, empresa responsável por inserir os créditos nos cartões do Cheque Cidadão. Depois, os cartões eram entregues para os potenciais eleitores. O sistema todo operava em paralelo ao mecanismo formal do programa, que exige uma análise prévia para que assistentes sociais avaliem se os interessados preenchem os requisitos necessários, como a renda familiar. Não houve qualquer ato formal do governo autorizando a entrada dos novos nomes. No mesmo período, a entrada formal de novos beneficiários estava congelada.

A defesa de Garotinho chamou as alegações de compra de votos de “suspeitas infundadas”. O advogado do ex-governador afirmou que a prisão domiciliar “tem a intenção de privá-lo de seu trabalho na Rádio Tupi e em seus canais digitais e, com isso, evitar que ele continue denunciando políticos criminosos importantes”.