O Estado de São Paulo, n. 45199, 18/07/2017. Política, p. A6.

 

Janot diz que não têm pressa por nova denúncia

Juliana Ravelli

18/07/2017

 

 

Em palestra nos EUA, procurador-geral afirma que vai cumprir seu ofício até entregar o cargo, em setembro, e defende delações

 

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou ontem que “não tem pressa” em apresentar uma nova denúncia contra o presidente Michel Temer. A declaração foi dada em Washington, onde Janot participa, até amanhã, de eventos e encontros na capital americana.

“Se até o último dia do meu mandato houver provas não vou deixar de cumprir meu ofício e vou apresentar uma nova denúncia”, disse Janot, que, em junho, denunciou Temer pelo crime de corrupção passiva com base na delação premiada do Grupo J&F. É esta a denúncia que será analisada pela Câmara, no dia 2 de agosto, quando os deputados vão decidir se autorizam ou não a abertura de ação contra o presidente. Se o processo for autorizado, o caso vai para o Supremo Tribunal Federal e Temer pode ser afastado do cargo por até 180 dias.

Ontem, Janot foi um dos palestrantes em um painel sobre o papel dos acordos de colaboração no combate à corrupção. O evento foi promovido pelo Brazil Institute, que integra o Wilson Center e fomenta debates sobre temas que envolvam questões bilaterais entre Brasil e Estados Unidos.

Na palestra, o procurador-geral disse que o Ministério Público “não tem pressa nem retarda denúncia”, o que depende, segundo ele, é a investigação. Janot afirmou ainda que aceitaria com “naturalidade” uma rejeição da Câmara da primeira denúncia contra Temer.

“Como eu vou aceitar a decisão da Câmara? Com a maior naturalidade possível. Eu fiz o meu trabalho. Cada um faz o seu. O meu trabalho está feito. Eu não vou insistir nessa denúncia, porque eu não tenho como, tecnicamente, insistir nessa denúncia. A denúncia está oferecida, os fatos estão descritos. Tem uma narrativa lógica, os indícios de prova estão apontados. Entendo existir autoria e materialidade. Não autorizou o processamento, ela fica suspensa.”

Janot disse que vai continuar fazendo seu trabalho até 15 de setembro, seu último dia na Procuradoria antes de passar o comando do Ministério Público para sua sucessora, Raquel Dodge, já foi nomeada por Temer.

“Eu vou fazer o meu trabalho, como fiz até agora. Se alguma investigação chegar, estiver madura até 15 de setembro, ofereço a denúncia. Como se não estiver madura, porque não se obteve nada, peço arquivamento. Fico aguardando a troca de bastão na Procuradoria-Geral da República para o prosseguimento dela”, afirmou Janot.

 

Imunidade. O procurador-geral também falou sobre o que chamou de “a grande polêmica que se tem hoje no Brasil, a concessão de imunidade a pessoas ricas que moram aqui em Nova York”. Sem mencionar nomes, Janot afirmou que “ninguém se sente feliz concedendo imunidade a criminoso, ninguém gosta disso”, em referência ao acordo de delação premiada dos executivos do Grupo J&F, que controla a JBS, entre os quais os irmãos Joesley e Wesley Batista.

“Essas pessoas procuraram agentes do Ministério Público para oferecer a possibilidade de um acordo penal e envolviam altíssimas autoridades da República. A primeira reação nossa foi dizer que isso era mentira. Depois de três anos e meio de Lava Jato, é inacreditável que a prática continue de maneira aberta. Nos foram apresentados takes de gravações, de uma gravação bem maior em que realmente se comprovava o envolvimento desses altos dignatários da República em cometimento de crime”, disse Janot. “Sopesei o interesse público.”

Hoje, o procurador-geral terá reunião no Escritório de Assuntos Internacionais de Narcóticos e Aplicação da Lei e visitará a Suprema Corte dos Estados Unidos. / COLABORARAM JULIA AFFONSO, FAUSTO MACEDO e LUIZ VASSALLO

 

‘Ofício’

“Se até o último dia do meu mandato houver provas, não vou deixar de cumprir meu ofício e vou apresentar uma nova denúncia”

 

"Como eu vou aceitar a decisão da Câmara? (em relação a denúncia contra Temer) Com a maior naturalidade possível. O meu trabalho está feito."

 

“Essas pessoas (delatores)  procuraram agentes do Ministério Público para oferecer um acordo penal e envolviam altíssimas autoridades da República”

Rodrigo Janot

PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA

 

PONTOS-CHAVE

Depoimento de empresário baseia denúncia

 

Delação

A denúncia da PGR contra o presidente Michel Temer tem como base delação de acionistas e executivos da J&F, como o empresário Joesley Batista (foto).

 

Inquéritos

Formalmente, o presidente Michel Temer é alvo de inquérito pelos crimes de corrupção passiva, obstrução da Justiça e organização criminosa.

 

Prisão

O ex-deputado Rodrigo Rocha Loures foi preso em 3 de junho e solto no dia 1º. Segundo Joesley, ele foi indicado por Temer para intermediar interesses do grupo.

 

Obstrução da Justiça

De acordo com o procurador-geral Rodrigo Janot, investigação sobre eventual crime de obstrução da Justiça pode gerar nova denúncia contra Temer.

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Oposição pede para PGR investigar Temer por emendas

Daiene Cardoso/ Igor Gadelha 

18/07/2017

 

 

Rede e PSOL alegam que presidente liberou verbas a parlamentares para ‘comprar’ votos contra denúncia em comissão

 

 

Rede e PSOL protocolaram ontem duas representações na Procuradoria-Geral da República pedindo que o presidente Michel Temer seja investigado pela liberação de emendas parlamentares às vésperas da votação da denúncia contra ele na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

O senador Randolfe Rodrigues (AP) e os deputados Alessandro Molon (RJ) e Aliel Machado (PR), responsáveis pelo pedido da Rede, dizem que Temer aumentou em “quantidade desproporcional” a liberação de emendas em troca de apoio para barrar a denúncia na CCJ. Para eles, o presidente usa dinheiro público para comprar votos e obstruir a Justiça.

“Isso mostra que, de fato, Temer está tentando usar a máquina pública e o dinheiro público para obstruir a Justiça, contrariando o interesse da população, ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal e deixando de prestar serviços essenciais para a população”, afirmou Molon em entrevista após entregar a representação.

 

‘Balcão de negócios’. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) disse que a liberação de emendas se transformou em “balcão de negócios”. “Caracterizam evidente compra de votos, com consequências de obstrução da Justiça, no caso. É nosso dever submeter à consideração do fiscal da lei”, afirmou o deputado.

 

Repasses. De acordo com o levantamento do Estado publicado no domingo, dos 40 deputados que votaram pela rejeição do parecer que recomendava a abertura de investigação contra Temer na comissão, 39 tiveram R$ 266 milhões em emendas parlamentares empenhadas. O montante corresponde ao período entre junho e as duas primeiras semanas de julho, às vésperas da votação na CCJ da Câmara. Outro levantamento do Estado/Broadcast mostra que apenas nos 13 primeiros dias deste mês foram empenhados R$ 2 bilhões em emendas.