Congresso já busca taxação adicional sobre mineradoras

Daniel Rittner

08/08/2017

 

 

Congresso Nacional já pressiona por mudanças relevantes nas medidas provisórias que aumentam os royalties da mineração e alteram o marco regulatório do setor. Deputados e senadores apresentaram quase 350 emendas - número alto para os padrões legislativos - aos textos enviados originalmente pelo governo. Muitas buscam elevar a fatura imposta às mineradoras, com aumentos ainda maiores das alíquotas e cobrança de participações especiais sobre jazidas de alta produtividade, como já ocorre na indústria de petróleo e gás. A pressão por mais receitas é encabeçada pela bancada paraense. O senador Flexa Ribeiro (PSDB) e o deputado Arnaldo Jordy (PPS), ambos da base aliada, resgataram a ideia de uma tributação adicional sobre projetos de minério de ferro com "grande rentabilidade" para reforçar os cofres públicos. Flexa sugere uma taxa extra de até 2,6% do faturamento bruto para jazidas com produção a partir de 6 milhões de toneladas por trimestre, como aquelas localizadas na Serra dos Carajás (PA) e no Quadrilátero Ferrífero (MG), dependendo do volume extraído e do teor médio de ferro. Em outra emenda, Jordy propõe mais uma alíquota de pelo menos 5% sobre minas que tenham "lucros extraordinários". A cobrança de participações especiais era um desejo da ex-presidente Dilma Rousseff ao elaborar sua proposta de reforma do código de mineração. Ela foi dissuadida do mecanismo na reta final de discussões pelo então presidente da Vale, Murilo Ferreira, e retirou essa previsão do projeto de lei encaminhado à Câmara dos Deputados em 2013. A Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig) defende uma alíquota fixa de 4% como royalties sobre o minério de ferro e também se diz a favor das participações especiais. Lembra que outro grande produtor global, a Austrália, tem royalties de 5% a 7,5%. Hoje o Brasil cobra 2%. "Não somos loucos de matar a galinha dos ovos de ouro. Só estamos falando em dar tratamento mais justo a negócios que são absolutamente extraordinários", argumenta Waldir Salvador, consultor da Amig, em referência à proposta de participações especiais. Ele acredita, porém, que a ideia tem pouca chance de prosperar. "O lobby contrário das empresas é pesadíssimo."

O senador Flexa Ribeiro também propõe uma tabela de royalties com alíquotas progressivas, de 3% a 6%, variando conforme a oscilação de preços no mercado internacional. Trata-se do mesmo sistema desenhado pelo governo, mas com uma diferença essencial: o Palácio do Planalto sugere uma faixa entre 2% e 4% para a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem). Na tabela elaborada pelo Ministério de Minas e Energia, os royalties são mais baixos quando a cotação do minério estiver em menos de US$ 60 por tonelada e mais altos quando ultrapassar a casa de US$ 100. Existem ainda três alíquotas intermediárias. Em outra emenda, o deputado José Priante (PMDB-PA) sugere a manutenção do sistema de royalties variáveis, mas diminui o valor de entrada em cada faixa. Ele quer 2% de tributação com o minério abaixo de US$ 50, 3% de US$ 50 a US$ 80, 4% acima de US$ 100. Na prática, essa mudança resultaria em taxação extra das empresas. "As empresas não suportam mais o aumento da carga tributária no Brasil", lamenta o presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Walter Alvarenga. Para ele, comparar apenas os royalties cobrados no Brasil e em outros países gera distorções. De acordo com o executivo, só a carga tributária atinge entre 35% e 40% das receitas, mas outras despesas - como taxas estaduais de licenciamento, taxas municipais de uso da água, custos logísticos e trabalhistas - têm que ser considerados em uma conta perversa: a perda de competitividade do Brasil na comparação com outros fornecedores. Diante desse quadro, é preciso discutir com prudência o aumento dos royalties: "Vemos isso com grande preocupação". O prazo para a apresentação de emendas terminou às 18h de ontem e 344 propostas de mudanças eram contabilizadas até esse horário no sistema de acompanhamento do Senado. Agora serão montadas as comissões especiais das três medidas provisórias enviadas pelo governo e designados os relatores.

Uma MP trata especificamente dos royalties, outra modifica 23 pontos do código de mineração em vigência desde 1967 e a terceira cria uma agência reguladora para o setor - em substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral. No ano passado, a arrecadação com royalties alcançou R$ 1,8 bilhão. O governo espera um aumento de 80% nas receitas anuais com a Cfem. Isso significa, se forem mantidas as atuais cotações, um acréscimo em torno de R$ 1,5 bilhão por ano. A divisão das receitas é feita da seguinte forma: 65% para municípios onde estão as jazidas, 23% para os Estados produtores e 12% para a União. Várias emendas de parlamentares de grupos políticos diferentes - como Soraya Santos (PMDB-RJ), Luiz Sérgio (PT-RJ) e Cleber Verde (PRB-MA) - defendem uma parcela minoritária das receitas para municípios "indiretamente" afetados pelas atividades minerais. São principalmente cidades com infraestrutura ferroviária ou portuária, com embarque e desembarque de minérios, e impactos como partículas atmosféricas e poluição sonora. Algumas propostas de mudança estão em linha com os interesses das mineradoras. Uma delas, da deputada Gorete Pereira (PR-CE), prevê o uso dos direitos minerários sobre as jazidas como garantia real das empresas na obtenção de financiamento. Outra sugestão importante, apresentada por Aelton Freitas (PR-MG), deduz gastos com transporte e seguro do cálculo de receita bruta das mineradoras. O tema é delicado porque, além de mexer nas alíquotas, o governo resolveu mudar a cobrança de faturamento líquido para total. Isso inclui, por exemplo, as despesas com frete para o escoamento da produção. "Conforme a redação vigente, há um tratamento igual para situações absolutamente desiguais, pois as minas que estiverem mais próximas do local de embarque ou do ponto de beneficiamento pagarão aos cofres federais valor diferente pelo mesmo bem minera", diz Aelton Freitas em sua justificativa. Além das participações especiais, outro mecanismo usado na indústria de petróleo pode ser replicado na mineração: a política de conteúdo nacional. O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) pretende incorporar ao texto de uma das medidas provisórias a exigência de um índice "não inferior" a 60% para a nacionalização de equipamentos utilizados "nas instalações de voltadas às atividades de lavra, beneficiamento e transporte de minério".

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4314, 08/08/2017. Brasil, p. A5.