Título: Uma geração que desconhece a Aids
Autor: Castro, Grasielle
Fonte: Correio Braziliense, 16/02/2012, Brasil, p. 8
Dúvidas sobre a doença representam 85% das perguntas enviadas a uma rede social gerenciada pelo governo e que tem os jovens como público-alvo
O aumento no índice de pessoas com idade entre 15 e 24 anos infectadas pelo vírus da Aids confrontado com o fato de as principais dúvidas registradas em rede social montada pelo governo estarem relacionadas ao tema mostra que a doença ainda é uma incógnita entre os jovens brasileiros. O perfil do Ministério da Saúde na internet dedicado a perguntas e respostas, o Formspring, é recheado de questionamentos com relações ao vírus, aos sintomas, ao diagnóstico e às formas de contágio. Um levantamento realizado pela pasta a pedido do Correio mostra que, de 1º de dezembro de 2011 a 15 de janeiro deste ano, 85% das 475 perguntas registradas na rede foram relacionadas à Aids e a outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). A maioria delas com relação ao resultado de exames e à janela imunológica.
A falta de informação não é novidade para a coordenadora do Instituto Vida Positiva, Vicky Tavares. Segundo ela, os números só mostram que os jovens não entendem a gravidade da doença. "Eles acham que nunca serão contaminados. Quem tem menos de 30 anos não viveu o horror da doença na década de 1980 e 1990", frisa. Vicky acredita que o fato de existir tratamento e de ter como controlar a doença faz com que os jovens assumam outras prioridades. "Eles têm mais medo da gravidez do que da Aids", destaca.
O último Boletim Epidemiológico (ano-base 2010) mostra que, enquanto o índice de pessoas infectadas em todo o país estabilizou, o número de casos entre jovens passou de 3.006 em 2005 para 3.238 em 2010. O Distrito Federal é um exemplo desse aumento. De modo geral, houve queda nos registros de casos da doença na capital do país, mas um avanço no número de mortes de jovens de 15 a 24 anos soropositivos — de dois casos em 2006 para sete em 2010. Em todas as faixas etárias, foram registrados 116 mortes, o mesmo índice de 2009.
Tabu Soropositivo, Roberto Pereira*, 15 anos, contraiu a doença no parto. Ele conta que seus amigos não têm ideia do que seja ter Aids nem acreditam estar sujeitos ao vírus. "Eles acham que só quem é magro tem HIV. Pensam que meninas bonitas nunca poderão contaminar alguém. Alguns ainda acham que é mentira, que a transmissão não é fácil", afirma o jovem alto e de porte atlético.
O psicólogo e coordenador do Polo de Prevenção à DST/Aids da Universidade de Brasília, Mário Ângelo Silva, explica que existe uma relação muito estreita entre o aumento no número de infectados e a falta de consciência do risco, considerando que os jovens estão em uma situação de maior vulnerabilidade por estarem iniciando a vida sexual.
A desinformação aliada ao preconceito, segundo ele, faz com que os jovens, quando têm dúvidas sobre a doença, procurem canais de comunicação que vão além da família, dos médicos e dos professores. "A dificuldade no acesso aos postos de saúde é grande, tanto para conseguir preservativo quanto para tirar dúvidas. Em alguns casos, é preciso marcar uma consulta. Isso faz com que os jovens apelem para esses canais, muitas vezes de forma anônima, para que possam mostrar quais preocupações e problemas estão enfrentando", destaca. "O assunto ainda é um tabu e também não faz parte do que é discutido na escola."
* Nome fictício