CVM aponta indícios contra irmãos Batista

André Guilherme Vieira

10/08/2017

 

 

A procuradoria especializada da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) afirmou em parecer sigiloso, que motivou inquérito conduzido pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF), que existem indícios de que os controladores da JBS teriam usado informações privilegiadas no mercado de ações e de dólar futuro.

De acordo com o documento, obtido pelo Valor, "restam caracterizados, ao menos no campo indiciário, todos os elementos do tipo penal" sobre as suspeitas de uso de informações privilegiadas (insider) por Joesley e Wesley Batista, controladores da JBS, para minimizar perdas financeiras e obter vantagens no mercado de dólar futuro com a divulgação de seus acordos de delação premiada.

O documento, datado de 19 de maio, dois dias depois de a delação premiada dos irmãos ter sido tornada pública, é assinado pelo então procurador-chefe em exercício da CVM, Celso Serra Filho.

Ouvidos ontem na sede da PF de São Paulo pelo delegado Edson Garutti Moreira e por técnicos da CVM, os irmãos Batista negaram ter cometido irregularidades. Em mais de duas horas de depoimento, Joesley defendeu a licitude das operações de venda de ações e afirmou que não tinha como saber qual seria a data de divulgação de seu acordo de delação premiada. Ele disse também que não tinha como dimensionar a extensão do impacto que a delação premiada causaria no preço das ações da JBS.

Já Wesley Batista deu explicações sobre as operações de recompra de ações e de hedge cambial, apontando quais foram os critérios técnicos e econômicos adotados. Segundo o empresário, a JBS tem atuado de forma padronizada há mais de cinco anos, sem que tenha havido qualquer alteração nessa conduta.

Os irmãos Batista poderão ser responsabilizados criminalmente por terem evitado perda de R$ 138 milhões com vendas de ações da empresa e lucrado no mercado de dólar futuro poucos dias antes de assinarem acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR), firmado em 3 de maio.

Entre 24 e 27 de abril, a JBS adquiriu 12,5 milhões de ações tendo como contraparte o mercado (investidores sem ligação com a companhia), e 7,2 milhões de ações que foram vendidas pela FB Participações - empresa que reúne os negócios da família Batista.

O parecer da CVM aponta "circunstâncias suspeitas" envolvendo as operações no mercado de dólar futuro. "O comportamento da companhia em questão foge ao usualmente praticado nos últimos meses (janeiro a abril de 2017), quando a JBS S.A, a despeito de possuir uma participação relativamente ativa nesses mercados de dólar futuro, não assumiu posições líquidas compradoras dessa magnitude".

O documento também destaca que a posição compradora da JBS "se deu nos momentos finais do pregão, majoritariamente a partir das 16h, situação que contrasta fortemente com o observado nos pregões de 8 a 16 de maio, quando a posição líquida final era próxima de zero".

Segundo o parecer, a JBS foi a segunda maior compradora líquida de contratos de dólar futuro em 17 de maio, com posição totalizada em 7630 contratos.

O procurador-chefe da CVM destaca que "informações relacionadas a um acordo de colaboração dessa natureza interferem não só na percepção sobre os negócios da companhia, mas na percepção dos investidores sobre a própria estabilidade institucional do país".

O parecer aponta também que é "desnecessário dizer que a informação vazada na noite de 17 de maio de 2017 era potencialmente capaz de gerar vantagem em negociação no mercado de capitais, tanto ações de emissão da JBS S.A, como contratos de dólar futuro".

Procurado, o advogado dos irmãos Batista, criminalista Pierpaolo Cruz Bottini, afirmou que o parecer da CVM foi elaborado antes da tomada de depoimento de Joesley e Wesley pela PF, e que o documento não levou em consideração as explicações apresentadas pelos dois sócios da JBS.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4316, 10/08/2017. Política, p. A8.