Reforma política pode se resumir à criação de fundo

Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro

11/08/2017

 

 

Sob protestos, a comissão especial da Câmara dos Deputados que avalia mudanças constitucionais na reforma política confirmou a aprovação do distritão para a eleição de deputados e vereadores em 2018 e 2020, o sistema distrital misto a partir de 2022 e a criação de um fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões pagos com dinheiro público.

Com quórum baixo, porém, o colegiado encerrou os trabalhos no meio da tarde de ontem sem concluir a votação. O grupo voltará a discutir três pontos do texto na terça-feira antes de mandar o texto para o plenário. O placar apertado para a mudança de modelo, tanto para a próxima eleição como para as disputas seguintes, aumentou ainda a incerteza sobre se haverá alteração na forma de escolha do Legislativo. A reforma pode ficar limitada ao bilionário gasto com campanhas.

O relator do projeto, deputado Vicente Cândido (PT-SP), protestou antes e depois da votação contra as mudanças feitas em seu parecer para excluir, por exemplo, os artigos que determinavam o fim dos vices e dos suplentes no Senado. "Temo que o final desse trabalho seja apenas para constituir um fundo. Não é nenhuma glória, nenhum troféu para nós, criar um fundo eleitoral qualquer que seja o valor. Temos que ter responsabilidade", cobrou.

O distritão, modelo favorito de PMDB, PP, PTB, parte do DEM e do chamado baixo clero, determina que serão eleitos os mais votados para deputados e vereadores. Num acordo com o PSDB, esse sistema serviria como transição para implantar o distrital misto a partir de 2022, em que o eleitor vota duas vezes: no candidato de sua região e num partido. Metade do Legislativo seria escolhido pela maioria do distrito e a outra parte por uma lista partidária.

Embora o distritão conte com apoio da maioria da Câmara, por se tratar de uma mudança na Constituição Federal, é necessário mais: três quintos dos deputados ou 308 de 513. Na comissão, esse sistema passou por 17 a 15, com duas abstenções, de deputados do PSDB que afirmaram que ainda precisarão avaliar o impacto desse modelo, apesar do acordo da cúpula de seu partido.

Deputados de ambas as correntes avaliaram que o placar magro na comissão não traduz necessariamente falta de apoio em plenário porque, no colegiado, estão deputados que representam seus partidos. No plenário o "baixo clero" dará o tom da votação. Mas acendeu um sinal de alerta para os defensores. A Câmara já rejeitou esse modelo há dois anos por 210 a 267.

Além da oposição ao governo, PT, PCdoB e Psol, partidos da base como PR e PRB também se manifestaram contra. Ambos foram beneficiados pelo atual modelo, o voto proporcional em lista aberta, ao contarem com puxadores de votos - Celso Russomanno (PRB-SP) e Tiririca (PR-SP) - para aumentarem suas bancadas. No PSD, o ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, não concorda com o distritão, mas a bancada votou a favor.

Parte dos parlamentares avalia que esse modelo, junto com o fundo eleitoral, privilegiará os atuais deputados, aumentando as chances de reeleição. A discussão também não está totalmente ligada aos partidos porque cada congressista analisa qual o melhor formato para se reeleger.

Mais difícil ainda está avaliar o apoio ao distrital misto. Esse sistema seria adotado em 2022 por não haver tempo hábil para implantá-lo agora - é preciso dividir os Estados em distritos. PMDB e PP orientaram voto contra na comissão, mas recuaram ao serem lembrados do acordo com o PSDB. Nesse assunto, porém, nem sempre as bases acompanham as cúpulas partidárias.

O distrital misto foi mantido n comissão numa votação simbólica e com o plenário esvaziado. A maioria do partidos nem sequer manifestou sua opinião. PT, PHS e outros protestaram pela falta que quórum, que acabou encerrando à sessão pouco depois.

Já o fundo eleitoral teve apoio amplo. Destaque do Psol para exclui-lo foi rejeitado por 20 a 4. Apenas PHS e Rede acompanharam. "Com esse recurso seria possível a construção de mais de mil escolas de até 12 salas e 24 mil UTIs móveis", criticou o líder do PHS, deputado Diego Garcia (PR). O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG) defendeu que, com a Lava-Jato, essa é a única alternativa porque até o "caixa um foi criminalizado".

Paralelamente, a deputada Shéridan (PSDB-RR) apresentou o parecer da PEC que acaba com as coligações para o Legislativo e estabelece número de votos mínimo para os partidos receberem dinheiro do fundo partidário e propaganda eleitoral na TV. A proposta será votada em outra comissão na terça-feira.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4317, 11/08/2017. Política, p. A5.