Municípios mostram situação fiscal crítica

15/08/2017

 

 

Pesquisa divulgada pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) colocou números no quadro com que todo cidadão se depara ao sair de casa, mesmo nas grandes cidades: as ruas estão esburacadas, os semáforos não funcionam, faltam remédios nas unidades de saúde, uniformes e material escolar para os estudantes. Com raras exceções, os municípios estão em situação financeira precária, assim como os Estados e a União.

Baseada em dados recolhidos pelo Tesouro, a pesquisa feita pela Firjan revelou que 18,4% dos 5.568 municípios do país, ou 1.024, nem chegaram a prestar as informações financeiras legalmente exigidas no prazo certo ou apresentaram dados inconsistentes em 2016, demonstrando o desprezo de vários prefeitos em fins de mandato pelas regras fiscais. Desse grupo, pode-se esperar o pior, portanto. Dos que entregaram os dados, a imensa maioria, ou 85,9%, está claramente em situação fiscal difícil ou crítica, pintando um quadro negativo para os prefeitos que assumiram neste ano, que o economista-chefe da Firjan, Guilherme Mercês, chama de "faroeste federativo".

A pesquisa constatou que 2.019 municípios, ou 37,5%, descumpriram pelo menos uma das obrigações fixadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Um dos problemas apontados é o elevado volume de restos a pagar sem cobertura de caixa deixado para este ano em 715 cidades - o que é estritamente proibido no último exercício de um governo. Esse verdadeiro estelionato somou R$ 6,3 bilhões, e teria sido maior não fosse o reforço de caixa de R$ 8,9 bilhões propiciado pela receita extraordinária obtida pelo programa de legalização de recursos de brasileiros no exterior.

Um problema recorrente que agrava a situação fiscal também dos Estados e da União é o gasto elevado com pessoal. Das prefeituras que enviaram as informações exigidas, 12,7% estouraram o teto estabelecido pela LRF de gastar no máximo 60% da receita corrente líquida (RCL) com pessoal; e outras 9% atingiram o limite prudencial de 57% da receita comprometidos com essa despesa. Poucos municípios - dez dos que enviaram dados ao Tesouro - estouraram o limite de 13% da receita líquida real para pagamento de juros e amortizações.

A baixa capacidade de geração própria de receitas e alta dependência das transferências de Estados e da União foi outra deficiência encontrada. Nada menos do que 81,7% dos 4544 municípios examinados, foram considerados em situação crítica desse ponto de vista porque geram menos de 20% de suas receitas. O percentual chega a 93,2% nas cidades do Nordeste. Apenas 3%, ou um punhado de 136 deles, arrecadaram mais do de 40% de suas receitas. Dado que 70% a 75% têm menos de 20 mil habitantes e muitos são rurais, os especialistas consideram até normal a baixa capacidade de geração de receita. Resta questionar a proliferação de cidades com essas características, em sua maioria criadas com objetivos puramente políticos e contando de antemão com o amparo do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Os poucos que escapam dessa sina são geralmente polos turísticos, com arrecadação elevada de ISS.

Para complicar a situação, houve uma forte diminuição nas transferências voluntárias da União, ela própria às voltas com seus problemas fiscais. Essas transferências feitas a Estados e municípios por meio de convênios ou emendas parlamentares, caíram 27% no primeiro quadrimestre, de acordo com os últimos dados disponíveis. As transferências podem ter aumentado mais recentemente, quando as liberações das emendas ganharam ímpeto antes da votação da denúncia contra o presidente Temer no plenário da Câmara.

Muitos dos problemas apontados pela pesquisa da Firjan são estruturais e não apenas causados por questões conjunturais, nascidas após quase três anos de recessão que o país atravessa. É o caso das despesas com pessoal, cuja solução não é simples nem rápida, além de significar dificuldades a perder de vista. Se, no presente, a folha de pagamento está muito além da disponibilidade de recursos da prefeitura, no futuro, vai resultar em compromissos elevados com os inativos.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4319, 15/08/2017. Opinião, p. A12.