O globo, n.30735 , 30/09/2017. ARTIGOS, p.19

O dever de aplicar a lei

OTAVIO AMARAL CALVET

30/09/2017

 

 

Muito tem sido falado sobre a reforma trabalhista. Alguns a consideram um avanço para as relações trabalhistas. Outros, verdadeiro retrocesso. Já existe até apelido para os que se posicionam frontalmente contrários: “deforma trabalhista”.

Até aí, tudo bem. Integram o jogo as diferenças de entendimento, as posições ideológicas como cidadão, os múltiplos interesses, tudo típico de uma sociedade plural.

O problema começa quando a sociedade questiona a atuação dos juízes do Trabalho, se eles vão ou não aplicar a nova lei. Será que a Justiça do Trabalho vai impedir a reforma trabalhista?

Ao contrário de demonizar a sociedade, como se nós, juízes, estivéssemos em patamar superior de entendimento acerca do melhor caminho para o futuro, cabe-nos refletir e reconhecer que, diante de várias manifestações pautadas por ideologia (de todos os matizes), nosso papel é simplesmente nos voltar para nosso mister: aplicar a lei.

Juiz não defende esta ou aquela mudança na lei, juiz não aplica a lei conforme preferências pessoais, juiz não submete a lei a um programa ideológico, juiz não é tendencioso na interpretação para afastar a lei com a qual não concorda, juiz não possui atuação político-partidária, juiz não se imiscui no Poder Legislativo. Juiz atua como juiz.

E o que isso significa? Que o juiz, o juiz do Trabalho, honra seu juramento de posse: respeitar, cumprir e aplicar as leis e a Constituição da República Federativa do Brasil.

Existem pontos duvidosos na reforma trabalhista? Claro, como em todas as novas leis. E cada juiz do Trabalho vai, com imparcialidade e independência, analisar tais pontos a partir da Constituição Federal. Mas isso não significa, nem de longe, que a reforma trabalhista não será aplicada.

Nós, juízes do Trabalho, temos a consciência do nosso papel, da importância da atuação imparcial, sem pauta ideológica, sem qualquer tipo de manipulação política, pois a atuação independente do Poder Judiciário constitui garantia de todos os cidadãos.

E cada decisão do juiz, cada sentença, cada acórdão podem facilmente ser controlados pelo jurisdicionado, pois nenhum membro do Poder Judiciário tem a faculdade de julgar sem fundamentar corretamente seus atos decisórios.

Que venham as mudanças, pois os magistrados trabalhistas estão prontos para, com responsabilidade, cumprir seu papel constitucional, cabendo à sociedade zelar sempre por um Poder Judiciário forte e independente, como garantia do próprio estado democrático de direito.

 

Otavio Amaral Calvet é presidente da Associação dos Juízes do Trabalho