Trava à reeleição de Maia e Eunício dificulta volta de doação empresarial

Vandson Lima e Raphael Di Cunto

18/08/2017

 

 

Um artigo que impediria os presidentes do Senado Federal, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de tentarem se reeleger em 2019 para o comando das respectivas Casas está entre os motivos que travam o andamento de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que permitiria a volta do financiamento privado nas eleições. Estimulada pela dificuldade em aprovar o fundo público, a possibilidade de retomada do financiamento empresarial para as campanhas vem ganhando rapidamente adeptos no Legislativo. O presidente em exercício do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), e o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) estão entre os entusiastas da ideia. A proposta também tem defensores entre deputados de PMDB, PP, PR, PSD, PRB e DEM preocupados com a repercussão de destinar R$ 3,6 bilhões de dinheiro público para as próprias campanhas. A resistência ao fundo cresceu tanto que a Câmara decidiu até adiar a discussão: aprovará o fundo agora, mas deixará a definição do valor para dezembro, no Orçamento. A PEC que permite a volta das doações de empresas tratava de diversas alterações no sistema político - inclusive o fim da reeleição - e foi desmembrada quarta-feira no plenário do Senado. Voltará a tramitar na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Casa, presidida por Edison Lobão (PMDB-MA) - um insuspeito aliado de Renan -, que designará novo relator.

O escolhido, contudo, terá esta pendência em relação aos chefes do Legislativo para resolver: a proposição altera o artigo 57 da Constituição para impedir a recondução dos presidentes da Câmara e do Senado na eleição imediatamente subsequente, independentemente da legislatura. Hoje, a recondução é proibida, mas uma brecha autoriza caso ocorra em um novo mandato. Esse dispositivo foi incluído por articulação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje preso em Curitiba. O pemedebista planejava, caso não tivesse força suficiente para mudar a Constituição e se reeleger dentro do atual mandato, enfraquecer o sucessor e retomar o posto em 2019. Esse artigo, afirma um parlamentar, tem feito Eunício evitar a discussão da PEC. O presidente do Senado nega. A volta do financiamento privado, proibido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015, ainda enfrenta outras resistências. Um senador do PSDB afirma que é "preciso fazer uma ponte com a Corte para efetuar essa mudança, mas já se percebe uma inflexão". O ministro Luiz Fux disse anteontem que é possível "repensar" o custeio das campanhas, sugerindo que as empresas possam contribuir com candidatos com os quais tenham afinidades ideológicas. Fux coordenará, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os estudos sobre as regras eleitorais de 2018. O ministro Luís Roberto Barroso, que já defendeu que o Congresso poderia aprovar a volta das contribuições, criticou esta semana o fundo com recursos públicos. Ambos votaram pela proibição no julgamento anterior.

Os motivos que levam deputados e senadores a se moverem contra ou a favor de cada modelo de financiamento variam conforme a própria realidade eleitoral. Renan, por exemplo, é contra o fundo público porque a distribuição caberia aos partidos. Às turras com o presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), e rompido com o presidente Michel Temer, Renan prevê que a sigla fechará as torneiras para sua reeleição e a de seu filho, o governador de Alagoas. Já Eunício é contra a volta do financiamento empresarial. Ao mesmo tempo, diz que só colocará o fundo público em votação se o sistema eleitoral mudar. Um dos parlamentares mais ricos do país, ele é um dos poucos que teria condições de arcar com os custos da própria campanha com as regras atuais - ou seja, apenas doações de pessoas físicas. O autofinanciamento mostrou-se bem sucedido nas eleições do ano passado, com os prefeitos de São Paulo (João Doria) e Belo Horizonte (Alexandre Kalil) pagando as próprias campanhas. Na reforma discutida na Câmara, há dispositivos para impedir que isso se repita em 2018.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4322, 18/08/2017. Política, p. A9.