Correio braziliense, n. 19743, 16/06/2017. Política, p. 2

 

A conta da sobrevivência 

Paulo de Tarso Lyra, Rodolfo Costa, Luana Melody e Juliana Cipriani 

16/06/2017

 

 

REPÚBLICA EM TRANSE » Presidente da Câmara estuda a possibilidade de suspender o recesso parlamentar para acelerar e barrar pedido de investigação feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Previdência ainda é o maior problema da Casa

Vencida a etapa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sem a necessidade de um pedido de vista, o governo de Michel Temer agora quer acelerar o desfecho de outra crise que considera ter condições de vencer com facilidade: barrar um pedido de investigação feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Por isso, após reunião no Palácio do Jaburu, ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), admitiu que, caso o pedido chegue ainda neste semestre à Casa, existe a possibilidade de suspensão do recesso parlamentar de julho.

“É meio óbvio. Se tem uma denúncia contra o presidente precisa ser votada. Aí, de repente, tem o recesso e para a eventual votação por 15 dias. Vamos voltar a tratar disso depois de 15 dias? Parar no meio não tem condição. Tem que começar uma eventual discussão sobre esse assunto, tendo início meio e fim”, disse o presidente da Câmara, depois do encontro de Temer. Eles acreditam ter margem de votos para derrubar a provável denúncia de Janot.

Maia fez questão de dizer que essa decisão não cabe apenas a ele, mas ao plenário da Câmara. “Estamos ainda na fase das hipóteses. Quando acontecer, tratamos do resto”, explicou. Assim que for apresentada pela PGR, a denúncia deve ser enviada à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Segundo o regimento da Casa, o colegiado terá 15 sessões para analisar o caso, sendo 10 para a apresentação da defesa do presidente e, após isso, mais cinco para o relator apresentar o parecer. Após ser votada no colegiado, a denúncia tem de ser apreciada no plenário.

Todos esses procedimentos levariam, em condições normais, ao menos um mês e meio. A recomendação do Palácio do Planalto, porém, é não usar todo o período permitido para a defesa. Maia negou que pretenda fazer qualquer tipo de alteração na tramitação do pedido. “Minha opinião é que, se a denúncia chegar, vai tramitar na base regimental, não vamos suprimir nada, até porque não pode: 10 sessões para a defesa do presidente e cinco sessões para o relator. Vota na comissão e depois de duas sessões pode votar em Plenário”, afirmou.

“A denúncia, quando chegar, será recusada por mais de 300 votos. Mas acho que, até por uma questão de respeito, temos que tratar dela a partir do momento em que ela chegar”, defendeu o vice-líder do PMDB na Câmara, Carlos Marun (MS). O peemedebista disse que torce para não ser necessário chegar a esse ponto. “Acredito que, de forma responsável, a Procuradoria-Geral da República (PGR) vai analisar provas que eventualmente tiver. Não é possível, que, em um momento como esse, que o país tenta se reerguer economicamente, que se faça uma denúncia frágil simplesmente para fazer com que o país continue em clima de instabilidade”, prosseguiu.

Votos

Um dos vice-líderes do governo na Câmara, Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) afirmou que a crise gerada pela delação da JBS fez com que alguns votos certos para aprovação da reforma da Previdência na Casa refluíram. Em entrevista ao Correio, Marun havia dito que o Planalto já contabilizava 278 votos — 40 a menos que o mínimo necessário para aprovação da emenda constitucional. Para Lúcio, o número mínimo de 308 já tinha sido atingido. “Vamos ter que recomeçar esse processo de negociação. Essa crise está sendo usada por muitos deputados, incomodados com as reformas, mas sem coragem de romper com o governo, como um escudo para ficar bem perante a opinião pública”, criticou Lúcio.

Nesse contexto ainda há a instabilidade provocado pelo PSDB (leia mais na página 3). O partido deve votar a favor das reformas — tanto a trabalhista, mais adiantada no Senado, quanto a previdenciária — mas vai liberar a bancada de deputados a votar como quiser no caso de um pedido de abertura de investigação contra Temer.

Na perspectiva do analista político Antonio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), uma ruptura do PSDB, acrescida da cobrança da opinião pública, pode provocar “comportamento de manada” de desembarque dos demais partidos da base aliada. “Seria uma reação em cadeia a médio prazo, não vejo um movimento imediato. Sem o PSDB, o governo perde muito em credibilidade”, apostou.

A pressa de Temer em se livrar da denúncia pode esbarrar em outro obstáculo. Os prazos para enviar o pedido de processo podem chegar a até 30 dias. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), avisou que não vai aceitar a interferência do governo para agilizar a votação. E o Supremo Tribunal Federal (STF) tem um entendimento de que pode pedir manifestação das partes para embasar a acusação, em vez de enviá-la de imediato à Câmara. A expectativa, por enquanto, é que ela chegue à Casa até o dia 23 de junho.

Frases

"É meio óbvio. Se tem uma denúncia contra o presidente que precisa ser votada. Aí, de repente, tem o recesso e para a eventual votação por 15 dias. Vamos voltar a tratar disso depois de 15 dias?”

"Parar no meio do recesso, é claro que não tem condição. Tem que começar uma eventual discussão sobre esse assunto, tendo início, meio e fim. Para o Brasil, isso é fundamental”

Rodrigo Maia, presidente da Câmara