Pacote de privatização cresce e inclui até a Casa da Moeda

Daniel Rittner e Rafael Bitencourt

24/08/2017

 

 

Em uma tentativa de obter receitas adicionais e conter o rombo fiscal de 2018, o governo deu sinal verde a um plano mais amplo de privatizações que vai muito além da Eletrobras. O pacote de vendas e concessões aprovado ontem pelo conselho de ministros do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), em reunião no Palácio do Planalto, inclui o aeroporto de Congonhas (SP) e a Casa da Moeda. Estão ainda na lista a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) e a Lotex, modalidade conhecida como "raspadinha", cujo leilão foi confirmado. Congonhas (SP), o terminal mais lucrativo de toda a rede da Infraero e responsável hoje por quase 20% de suas receitas, será leiloado à vista e com preço mínimo de R$ 5,6 bilhões. Além disso, o governo resolveu leiloar outros 13 terminais entre julho e setembro de 2018, às vésperas das eleições. Também vai colocar à venda a participação de 49% da Infraero em quatro aeroportos concedidos pela ex-presidente Dilma Rousseff: Guarulhos (SP), Brasília (DF), Galeão (RJ) e Confins (MG). O governo espera obter até R$ 8 bilhões com essa operação, mas promete destinar o dinheiro à estatal, que ficará sem seus principais ativos. O plano aprovado ontem em reunião do PPI no Palácio do Planalto, sob comando direto do presidente Michel Temer, abrange ainda a privatização da Casa da Moeda. O ministro da Secretaria-Geral, Moreira Franco, lembrou que o uso cada vez menor de papel-moeda como forma de pagamento tem levado a "sucessivos prejuízos" da estatal. Para ele, há o risco de ela tornar-se mais dependente do Tesouro Nacional. "A Fazenda entendeu corretamente que fará estudo sobre sua venda." Outro ativo incluído, que quebra um verdadeiro tabu no setor, é a privatização da Codesa. Só terminais portuários são atualmente operados pela iniciativa privada, mas não a administração do condomínio como um todo. Moreira negou que haja viés meramente arrecadatório no programa de concessões e ressaltou que investimentos de R$ 24 bilhões já foram destravadas com projetos repassados à iniciativa privada. "Isso é essencial para a geração de emprego e renda."

Com o apoio do ministro, a equipe econômica venceu um duelo de bastidores e conseguiu incluir Congonhas no pacote de concessões. A "joia da coroa" no sistema aeroportuário deverá atrair gigantes do setor e assegurar um ágio significativo na disputa, avalia o governo nos bastidores. O vencedor precisará investir R$ 1,8 bilhão em melhorias - como mais pontes de embarque e desembarque, modernização do sistema de bagagens - e pagar tudo de uma tacada só. Nas duas primeiras rodadas de concessões, a outorga era paga em parcelas anuais ao longo de toda a vigência do contrato. Isso tornava praticamente nulo o impacto fiscal dos leilões no curtíssimo prazo. Nos quatro aeroportos licitados em março deste ano, as regras mudaram: 25% do preço mínimo e todo o ágio oferecido nos lances vencedores tiveram que ser pagos à vista, no ato de assinatura do contrato. À exceção de Congonhas, que será leiloado individualmente, os demais aeroportos continuam com essa sistemática de pagamento. Serão três blocos diferentes. Um é constituído por Vitória (ES), onde a Infraero está na reta final de construção de um moderno terminal de passageiros, e por Macaé (RJ), importante entreposto para a indústria de petróleo e gás. O "circuito de turismo" do Nordeste é encabeçado por Recife (PE) e tem outros cinco ativos: Maceió (AL), João Pessoa (PB), Campina Grande (PB), Aracaju (SE) e Juazeiro do Norte (CE). Mais cinco aeroportos serão concedidos no Mato Grosso: Cuiabá, Sinop, Alta Floresta, Rondonópolis e Barra do Garças. Ao todo, o governo espera pelo menos R$ 6,39 bilhões em outorga em 2018 - sem considerar ainda a possibilidade de ágio. Todos os editais têm previsão de serem publicados no segundo trimestre do ano que vem. O leilão aconteceria no trimestre seguinte. Algumas autoridades colocam em dúvida a chance de cumprir fielmente o calendário. O ministro dos Transportes, Maurício Quintella, admitiu ter sido contra a inclusão de Congonhas no pacote, porque isso dificulta o processo de reestruturação da Infraero. Ele minimizou, porém, a importância das divergências. "Somos um governo só. A divergência é sadia e importante para o debate. Se todo mundo pensasse igual, não seria um governo democrático", afirmou. Para não deixar a Infraero em estado de agonia financeira, o governo destinará à estatal o dinheiro da venda de 49% da fatia que ela mantém nos aeroportos concedidos nas duas primeiras rodadas. A expectativa é receber de R$ 3 bilhões a R$ 5 bilhões pelas participações em Brasília, no Galeão e Confins. Em maior ou menor grau, os controladores privados dos aeroportos já demonstraram interesse em comprar essas ações. O valor do negócio poderia chegar a R$ 8 bilhões se a fatia de 49% em Guarulhos, maior aeroporto do país, também for vendida. O problema é que a Invepar, acionista majoritária do terminal, vive dificuldades financeiras.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4326, 24/08/2017. Brasil, p. A3.