O globo, n.30721 , 16/09/2017. PAÍS p.6

Odebrecht e Bertin também sustentam denúncia da PGR

GABRIEL CARIELLO

16/09/2017

 

 

Janot reúne delações e extratos para relacionar Temer à propina

Questionadas pela defesa de Michel Temer no Supremo Tribunal Federal (STF), as provas fornecidas pelos delatores da JBS não são as únicas utilizadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para embasar a segunda denúncia contra o presidente. A peça acusatória reúne depoimentos de diversos delatores da Operação LavaJato, extratos bancários de contas no exterior, registros de pagamentos de propina feitos por empresas e até anotações na agenda de um empresário.

Na denúncia, Temer é acusado de chefiar uma organização criminosa composta por integrantes ligados ao PMDB da Câmara — dois ministros, dois ex-ministros e dois ex-deputados. O grupo teria recebido R$ 587 milhões em propinas em dez anos. Janot também acusa Temer do crime de obstrução de Justiça. Anteontem, Temer disse que a denúncia é baseada em delações “fragilizadas por graves suspeitas”.

As provas da JBS sustentam a acusação contra Temer de obstruir os trabalhos da Justiça, em especial a conversa gravada pelo empresário Joesley Batista no Palácio do Jaburu. Joesley e o executivo Ricardo Saud também foram denunciados por Janot, que pediu a rescisão de seus acordos de colaboração por terem omitido informações. A decisão sobre a revisão do acordo e a validade das provas será dada pelo STF. Até lá, a denúncia contra Temer deverá permanecer na Corte, antes de ser enviada à Câmara dos Deputados, como prevê a Constituição.

O texto que os deputados analisarão descreve crimes que teriam sido cometidos pelos integrantes do PMDB a partir de 2006. Ao narrar pedidos de propina feitos pelos denunciados, Janot diz que Temer tinha a função de dar “estabilidade e segurança ao aparato criminoso”. Na maior parte das vezes, diz o procurador, a atuação de Temer era indireta.

Janot, porém, afirma que Temer atuou diretamente em episódios nos quais foi negociada propina. Segundo a denúncia, em 15 de julho de 2010, executivos da Odebrecht acertaram pagamento de US$ 32 milhões ao grupo em uma reunião no escritório político de Temer em São Paulo. Além do presidente, estariam presentes o ex-ministro Henrique Alves e o ex-deputado Eduardo Cunha, ambos presos. O primeiro pagamento, de US$ 256 mil, teria ocorrido seis dias após a reunião, por meio de uma conta no Credicorp Bank S.A, no Panamá.

UM MILHÃO DE DOCUMENTOS

Janot cita depoimentos de delatores da Odebrecht e troca de e-mails entre executivos da empresa para confirmar a reunião no escritório de Temer. E apresenta extratos bancários de contas no exterior em nome de offshores usadas pela empreiteira e registros do sistema Drousys, no qual era feita a contabilidade do Setor de Operações Estruturadas, chamado de “departamento de propina”.

Segundo Janot, a PGR analisou mais de um milhão de documentos do servidor que hospedava o Drousys em Estocolmo. Foram identificados 60 contas e quatro fundos de investimentos usados para pagar propina.

Depoimentos de executivos da Odebrecht e do doleiro Lúcio Funaro também são usados para relacionar Temer ao episódio de entrega de dinheiro da empreiteira no escritório do advogado José Yunes em São Paulo. O pagamento teria sido combinado no Palácio do Jaburu. Amigo de Temer, Yunes deixou o cargo de assessor da Presidência após a divulgação do episódio e procurou a PGR para dar sua versão da história. Seu depoimento também está na denúncia.

A delação de Funaro, recém-homologada pelo STF, embasa o argumento do procurador-geral de que Temer está ligado a supostos pagamentos intermediados por Cunha e o ex-ministro Geddel Vieira Lima. A dupla cobrava propina de interessados em financiamentos do fundo de investimento da Caixa Econômica Federal, segundo Janot. O grupo J&F, de Joesley Batista, teria pago R$ 90 milhões.

Já o frigorífico Bertin teria repassado R$ 12 milhões. Janot utiliza a agenda do empresário Natalino Bertin, condenado na Lava-Jato, para relacionar Temer ao dono do frigorífico. O nome do presidente aparece junto a três pagamentos de R$ 500 mil em 2010. Na época em que a agenda foi apreendida, Temer confirmou que recebeu doação da empresa para campanha do PMDB e declarou à Justiça Eleitoral.

A atuação do presidente em campanhas eleitorais do PMDB é mencionada por Janot. Temer teria solicitado doações para a candidatura de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo em 2012. Segundo Funaro, Temer ligou para Henrique Constantino, dono da Gol. Notas fiscais frias de uma gráfica foram apresentadas pelo procurador-geral. Já Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, disse que recebeu pedido de Temer para negociar com a Queiroz Galvão doação de R$ 1,5 milhão.