Crise reduz matrículas no ensino superior, diz estudo

Ligia Guimarães

29/08/2017

 

 

A crise que começava a se aprofundar em 2015 - ano em que a economia encolheu 3,8% -, se refletiu também na queda das matrículas e no aumento da evasão de alunos no ensino superior, indicam dados divulgados ontem pelo Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp). A queda na entrada de novos estudantes ocorreu em todas as modalidades de ensino: público e privado, a distância e presencial. Dados do Mapa do Ensino Superior no Brasil 2017, calculado anualmente pelo sindicato, apontam que o número de alunos que iniciaram um curso presencial de formação superior nas redes pública e privada caiu 6,7% em 2015 sobre 2014, para 2,2 milhões. De acordo com a série histórica da pesquisa, é a primeira vez que esse número cai, pelo menos, desde 2009. No total, havia 8 milhões de alunos matriculados no ensino superior em 2015: 6,08 milhões na rede privada e 1,95 milhão em instituições públicas. "A queda no número de novos alunos é reflexo da crise", afirma Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp. Para ele, o medo do desemprego afasta os jovens da faculdade antes mesmo da demissão. "Ele adia o plano porque alguém ficou desempregado, ou porque tem medo, dado o ambiente que se vislumbra", diz. Na rede privada, a entrada de novos alunos caiu 8,4% (eram 1,9 milhão em 2014); na rede pública, o número caiu só 0,1%, para 504 mil. Houve queda expressiva até mesmo nas novas matrículas de cursos a distância, segmento de mensalidades bem mais baratas e que vinha acumulando crescimento significativo nas últimas décadas. Em 2015, o número de ingressantes nos cursos a distância caiu 4,6%. "É o primeiro ano de queda", destaca Capelato. Outro sinal de como a crise influenciou o comportamento dos alunos, na visão do executivo, é o aumento no número de jovens que se interessaram pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), mas não chegaram a realizar as provas. Em 2017, 7,6 milhões de alunos se inscreveram para o Enem, mas apenas 6,1 milhões pagaram a taxa e fizeram o exame. No ano anterior, houve 9,2 milhões inscritos, e 8,6 milhões fizeram o exame. "Historicamente, os percentuais sempre andam colados. Este ano a diferença foi maior", diz. O ano de 2015 é o primeiro em que a pesquisa do Semesp reflete as mudanças nas regras do Financiamento Estudantil do Governo Federal (Fies), que foi reformulado em 2014. De 2010 a 2014, o número de contratos firmados no programa cresceu 862%, para quase 733 mil em 2014. Após as mudanças houve queda de 61% nos contratos, chegando a 287 mil em 2015. Em 2017, a estimativa do Semesp é que haja 193 mil contratos do Fies. Apesar da queda na oferta, a proporção de beneficiários que tinham Fies, ou Programa Universidade para Todos (ProUni), continuou a crescer em 2015. Os beneficiados pelas duas políticas públicas representavam 37%, ou 1,7 milhão, do total de matrículas presenciais da rede privada em 2015. Em 2012, eram 19%, calcula o Semesp. "Naquele ano não havia ninguém se formando no Fies. Então, mesmo a oferta caindo muito, as redes só acumularam contratos até 2015", explica Capelato. O maior percentual de alunos do Fies matriculados no país em 2015 estava na região Nordeste (30,2%), seguida de Centro-Oeste (28,5%) e Sudeste (20,5%). A evasão escolar no ensino superior, calculada com base nos alunos desistentes em relação ao total de alunos matriculados, também cresceu em 2015. A taxa de alunos que desistiram do curso antes da formatura subiu para 28,6% na rede privada, ante 27,9% em 2014. Em 2010, era de 23,9%. Na rede pública, o índice de abandono teve leve alta, de 18,3% para 18,4%. A evasão aumentou também nos cursos a distância, para 34,2% na rede privada (ante 32,5% em 2014 e 29,2% em 2011) e 28,7% na pública (ante 26,8% em 2014 e 18,9% em 2011). O Semesp prevê que os números de acesso ao ensino superior continuarão a piorar nos próximos anos. Capelato destaca o aumento da inadimplência nas mensalidades: o indicador da inadimplência com mais de 90 dias de atraso, que era de 10% em 2009, caiu ano a ano até 7,8% em 2014, e deve chegar a 9,2% em 2017, prevê. Cláudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais (Ceipe), da Fundação Getulio Vargas (FGV), prevê que o agravamento da crise econômica afaste mais estudantes nos próximos anos. Ela diz que a evasão do ensino superior brasileiro é comparável à de outros países, mas deve aumentar com a crise. "Muitas pessoas planejaram o acesso ao curso em condições que não se mantiveram."

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4329, 29/08/2017. Brasil, p. A3.