Correio braziliense, n. 19742, 15/06/2017. Política, p. 2

 

Cunha nega ter vendido o silêncio

Luana Melody Brasil 

15/06/2017

 

 

REPÚBLICA EM TRANSE » Peemedebista afirma não ter sido procurado por emissários do presidente Michel Temer para negociar eventual delação nas investigações da Operação Lava-Jato via propina da JBS. Depoimento à PF contradiz a versão de Joesley Batista

O deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tirou uma pedra do caminho de Michel Temer. Durante depoimento na manhã de ontem à Polícia Federal, em Curitiba, o peemedebista negou ter sido procurado por emissários do presidente para negociar seu silêncio nas investigações da Operação Lava-Jato via propina da JBS.

Segundo a defesa de Cunha, o ex-parlamentar afirmou que seu silêncio “nunca esteve à venda”, contrariando a delação de Joesley Batista, um dos donos da JBS. O ex-presidente da Câmara esteve na Polícia Federal como testemunha no inquérito que investiga Temer por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da Justiça.

Cunha depôs por quase duas horas na sede da Polícia Federal, vindo do Complexo Médico Penal de Pinhais, onde está preso desde outubro do ano passado. As perguntas foram elaboradas pela PF de Brasília, onde corre o inquérito contra Temer, e divididas em duas partes. A primeira tratava das delações de empresários da JBS e do grupo J&F, onde o presidente da República é acusado de ter negociado o silêncio de Cunha com Joesley Batista. A outra, trouxe questões relativas à Operação Sépsis, para a qual executivos da Odebrecht alegam ter pago propina ao ex-deputado em troca de verbas do Fundo de Investimento do FGTS.

A defesa de Cunha havia pedido para que o depoimento fosse adiado por não ter conhecimento prévio das perguntas e da totalidade das provas que constam no inquérito contra Temer. O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator da Lava-Jato, negou o pedido, decisão que foi proferida depois que Cunha já estava depondo.

De acordo com o advogado do ex-deputado, Rodrigo Sánchez Rios, do total de 47 perguntas, foram respondidas 25 “de maneira geral”. As outras foram refutadas porque não tinham relação com a JBS, segundo a defesa. Cunha justificou que responderá somente no âmbito do processo às perguntas referentes à Odebrecht. Rios afirmou ainda que Cunha chegou confiante e sereno para prestar esclarecimentos.

Memória

Eduardo Cunha foi condenado a 15 anos e quatro meses de reclusão pelo juiz federal Sérgio Moro em março deste ano. O ex-parlamentar já estava preso desde outubro do ano passado, quando recebeu a condenação. Ele é investigado em duas ações penais: uma tramita na 10ª Vara Criminal Federal de Brasília, referente à Operação Sépsis; e a outra investiga se Cunha recebeu propina de US$ 5 milhões em contratos de construção de navios-sonda da Petrobrás.

Executivos do Grupo J&F disseram em delação premiada ter pago propina ao doleiro Lucio Funaro, que atuava em nome do ex-presidente da Câmara, em troca da liberação de verbas do FI-FGTS para grandes empresas do grupo. De acordo com a defesa do ex-parlamentar, ele “não entraria em uma atividade ilícita deste formato, de maneira tão sorrateira”.

Em outra denúncia que atinge diretamente o peemedebista, o empresário Joesley Batista, dono da JBS e acionista da J&F, disse em delação à PGR que pagava uma mesada a Cunha e ao operador Lúcio Funaro para manter o silêncio dos dois. Joesley afirmou também que Temer sabia do pagamento. Em gravação escondida de conversa entre Joesley e Temer no Palácio do Jaburu, feita em março deste ano, o empresário teria dito “eu tô bem com o Eduardo”, ao que o presidente respondeu “tem que manter isso, viu”.

Na Operação Lava-Jato, o nome do deputado cassado aparece também no inquérito da Operação Manus, que prendeu o também ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves. Grampos autorizados pela PF mostraram que Cunha e Alves fizeram intervenções em favor da empreiteira OAS no Superior Tribunal de Justiça, na PGR, no Tribunal Superior do Trabalho e no Tribunal Regional da 5ª Região.

O MPF acusou Cunha de receber propina da Petrobras para a exploração de petróleo no Benin. O processo estava no STF e foi encaminhado ao juiz Sérgio Moro, no Paraná, quando o ex-parlamentar foi cassado.