Correio braziliense, n. 19757, 30/06/2017. Economia, p. 8

 

Meta de inflação tem 1º redução em 14 anos

Rodolfo Costa e Rosana Hessel 

30/06/2017

 

 

CONJUNTURA » BC passará a perseguir IPCA de 4,25% em 2019 e de 4% em 2020. Ideia é alinhar gradualmente o custo de vida a padrões internacionais. Segundo a equipe econômica, fixação dos objetivos com até três anos de antecedência favorece redução dos juros

O governo surpreendeu o mercado, ontem, ao definir as metas de inflação para os próximos anos. Além de confirmar a redução do objetivo para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que passará de 4,5% em 2018 para para 4,25% em 2019, medida que já era esperada pelos agentes econômicos, o Conselho Monetário Nacional (CMN) divulgou uma meta de 4% para 2020. Foi a primeira queda das metas inflacionárias em 14 anos. A banda de tolerância foi mantida em 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.

Com a decisão, o CMN passa, a partir de agora, a estabelecer as metas para três anos à frente, em vez de dois, como vinha fazendo. A intenção, segundo o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, é iniciar um processo gradual de convergência do custo de vida para padrões internacionais, que “tendem a ter horizontes relevantes mais longos do que o adotado pela política monetária até agora no Brasil”.

“A ideia é que esses horizontes, agora, se ampliem para três anos, dentro de uma trajetória gradual de maior ancoragem das expectativas de inflação e de uma otimização da convergência da meta para padrões internacionais”, disse Meirelles, que preside o CMN, colegiado formado também pelo ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, e pelo presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn.

A decisão foi tomada de maneira unânime pelos conselheiros. De acordo com Dyogo Oliveira, com maior previsibilidade e controle da variação dos preços, o governo espera favorecer o crescimento econômico. “Queremos garantir para o Brasil a retomada do crescimento em nível sustentável a longo prazo e possibilitar geração de emprego e renda e a melhoria da qualidade de vida da população brasileira”, afirmou.

Analistas do mercado financeiro consideraram a novidade positiva, mas fizeram ressalvas. O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, lembrou que os resultados da política de redução do deficit público ainda são incertos, sobretudo após o aprofundamento de a crise política colocar em xeque a aprovação da reforma da Previdência. Diante disso, o estabelecimento de metas de inflação em períodos de três anos traz obrigações maiores para a próxima equipe econômica.

Vale considera que uma reforma mais ampla da Previdência só ocorrerá se um candidato com visão reformista ganhar as eleições presidenciais em 2018, algo que está longe de ser previsível. “Esse risco tende a colocar alguma pressão na taxa de câmbio, lembrando um pouco o cenário de 2002”, destacou. Naquele ano, a incerteza trazida pela primeira eleição de Luís Inácio Lula da Silva fez o dólar e a a inflação dispararem.

Apesar das dúvidas, Vale ponderou que a decisão do CMN foi melhor do que o esperado. O anúncio das metas, segundo ele, sinaliza o comprometimento da atual equipe econômica com a busca de soluções para o problema fiscal. “Esperar que a parte maior da reforma previdenciária fique para 2019 não inviabiliza que a queda da meta já comece agora. Se a mudança nas regras de aposentadorias tivesse sido aprovada e não houvesse crise política, talvez uma meta de 4% para 2019 fizesse mais sentido. A suavização da queda assim é bem-vinda”, afirmou.

Benefício

O presidente do BC, Ilan Goldfajn, destacou que, ao melhorar a capacidade de planejamento das famílias, das empresas e do governo, o alongamento do horizonte de metas pode resultar na diminuição das taxas de juros. “Há um claro benefício para a sociedade. Com expectativas mais longas, em patamares mais baixos, a economia pode almejar ter, de forma sustentável, juros de longo prazo mais baixos, desde que as metas sejam ancoradas”, afirmou.

Perseguir a trajetória descendente de metas será fundamental para equiparar a métrica da política monetária a ser perseguida pelo BC com a de outros países, destaca o economista Alberto Ramos, do Goldman Sachs. No Chile, na Colômbia e no México, por exemplo, a meta de inflação é de 3%, com uma margem de tolerância de um ponto percentual para cima ou para baixo. Já no Peru, o objetivo para o custo de vida é de apenas 2%, com um ponto percentual de banda para o teto e para o piso da meta.

“Acreditamos firmemente que entregar uma inflação baixa e estável é a melhor contribuição que o BC pode dar para criar condições para um crescimento e desenvolvimento sólido, sustentável e socialmente empoderador”, analisou Ramos. Ele demonstrou, no entanto, preocupação com a situação das contas públicas. “Para os novos objetivos serem bem-sucedidos, é fundamental que o esforço monetário seja complementado com progressos tangíveis na área fiscal e a adoção de micro e macro reformas de longo alcance que tornem a economia mais flexível e produtiva”, disse.