Emprego surpreende e deve dar mais fôlego ao consumo

Bruno Villas Bôas, Thais Carrança, Ana Conceição e Denise Neumann

01/09/2017

 

 

A taxa de desemprego surpreendeu novamente em julho, ao recuar para 12,8%, ante 13% no trimestre encerrado em junho. A melhora do mercado de trabalho foi mais uma vez impulsionada pelo avanço das ocupações precárias. No entanto, o incremento da renda e da massa de rendimentos promete dar fôlego ao consumo, o que deve se converter na volta dos empregos formais mais à frente, segundo economistas.

O número de pessoas desempregadas - agora em 13,3 milhões - caiu 5,1% ante o trimestre anterior, uma aceleração em relação à taxa de 4,9% registrada em junho, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. A população ocupada ganhou 1,4 milhão de pessoas, número também maior que o 1,3 milhão empregado até junho.

 

 

Por outro lado, a desocupação continua a cair devido ao avanço da informalidade. Do 1,4 milhão de vagas criadas, 819 mil (57%) foram preenchidas por empregos sem carteira assinada e trabalho por conta própria, categorias que, além da ausência de proteção social têm renda menor. Segundo a Pnad, o trabalhador sem carteira recebeu em julho R$ 1.197, o equivalente a 59% do que tem carteira, cujo salário médio é de R$ 2.025. Aquele que está por conta própria recebe um pouco mais, R$ 1.542, 76% da média recebida por quem está no mercado formal.

 

"Todo processo de recuperação do crescimento da população ocupada é algo favorável, mas esse dado preocupa porque ocorre em cima de uma plataforma informal", disse Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). "Se essa dinâmica perdurar, é algo que preocupa, porque temos empregos de baixa qualidade. O emprego sem registro não tem garantias trabalhistas."

Apesar da baixa qualidade dos empregos criados, a massa de rendimentos do trimestre de maio a julho foi 3,1% superior à de igual período do ano passado. Ainda que o IBGE considere a variação como estabilidade, por motivos estatísticos, isso representa o equivalente a R$ 5,5 bilhões a mais na média mensal e uma aceleração em relação ao ritmo de crescimento registrado no trimestre anterior (abril a junho), de 2,3% em relação a 2016.

Além de maior, há outra diferença que favorece a recuperação da economia nesse aumento da massa salarial: ela foi positiva na renda e na ocupação. O total de pessoas ocupadas no trimestre maio-julho deste ano foi 0,2% superior ao do mesmo período do ano passado - apesar de praticamente estável, trata-se do primeiro percentual positivo na comparação anual em 23 meses - e o rendimento médio real subiu 3% na mesma comparação.

"A economia mostra uma recuperação bastante demorada e por isso as pessoas que não conseguem empregos formais acabam buscando outras alternativas. Isso, é claro, impulsiona a demanda, porque essas pessoas, de outra forma, não estariam consumindo", observa Rafael Leão, economista da Parallaxis, destacando o papel da queda da inflação e do saque das contas inativas do FGTS no avanço da renda.

Para o segundo semestre, Leão espera relativa estabilidade no mercado de trabalho, com taxas de desemprego variando entre 12,7% e 13%. "Porém, para o ano que vem, as coisas podem tomar uma figura muito diferente já a partir do segundo trimestre", afirma. O efeito positivo sobre o consumo gerado pela estabilização do mercado de trabalho deve estimular os empresários a ocupar capacidade e, posteriormente, investir. "Esse investimento traz um novo ciclo de contratação, que tende a gerar um crescimento mais sustentável", avalia.

O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, em entrevista recente ao jornal "Folha de S. Paulo" chamou atenção para o mix diferente do esperado na recuperação paulatina do PIB. O investimento não veio, as exportações ainda patinam, mas a inflação baixa ajudou na recomposição do poder de compra das famílias. O dinheiro "poupado" na compra de alimentos liberou renda para a aquisição de outros bens, situação que foi potencializada com os recursos liberados das contas inativas do FGTS.

Cosmo Donato, economista da LCA, acredita que o mercado de trabalho deve começar a gerar saldo líquido de empregos formais, pelos dados dessazonalizados, no final de setembro deste ano. Esses empregos formais criados não devem, contudo, acelerar a queda da taxa de desemprego, porque a tendência é absorver parte dos trabalhadores que estão atualmente na informalidade.

"Estamos projetando uma taxa de desemprego média de 13% em 2017 e em 2018. A taxa não vai ceder, mas teremos no ano que vem uma dinâmica mais favorável, com maior participação do emprego formal na composição da população ocupada", diz o economista, que prevê ainda crescimento médio real de 1,7% na massa de salários em 2017 e de 1,2% e 2018.

Apesar de ter sido surpreendido pela queda da desocupação, assim como a média do mercado, o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) acredita que a taxa de desemprego do país deverá permanecer na casa de dois dígitos até, pelo menos, 2020. O instituto projetou a taxa média de desemprego para os anos de 2017 (13%), 2018 (12,6%), 2019 (12,2%) e 2020 (11,8%).

Segundo Bruno Ottoni, economista do Ibre-FGV, o resultado mostra como a recuperação também será lenta e gradual no emprego. Para ele, a taxa de desocupação deve continuar cedendo nos próximos meses, com o aumento da informalidade e a sazonalidade favorável do segundo semestre. Na segunda metade do ano, o comércio começa a demandar mais da indústria para as vendas de fim de ano.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4332, 01/09/2017. Brasil, p. A4.