O Estado de São Paulo, n. 45214, 02/08/2017. Política, p.A11

 

Lula vira réu no caso do sítio de Atibaia

Sérgio Moro aceita terceira denúncia do Ministério Público contra ex-presidente na Lava Jato; juiz federal atribui propriedade a petista

Por: Julia Affonso / Ricardo Brandt / Fausto Macedo / Luiz Vassallo

 

 

 

 

 

 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva virou réu em mais uma ação penal na Lava Jato. O juiz federal Sérgio Moro aceitou ontem denúncia do Ministério Público Federal contra o petista por corrupção e lavagem de dinheiro nas obras do sítio Santa Bárbara, em Atibaia, interior de São Paulo. Esta é a terceira denúncia contra Lula que Moro recebe. Em uma delas, a do triplex do Guarujá (SP), ele já foi condenado. Ao todo, na Lava Jato e também nas Operações Zelotes e Janus, Lula é réu em seis ações penais.

Segundo a acusação relativa ao sítio, Odebrecht, OAS e Schahin gastaram R$ 1,02 milhão em obras de melhorias no sítio em troca de contratos com a Petrobrás. Esse valor teria sido propina referente a oito contratos assinados entre a estatal e as construtoras. A denúncia inclui 13 acusados, entre eles executivos das empreiteiras, empresários e o compadre do petista, o advogado Roberto Teixeira.

A Procuradoria da República no Paraná anexou 415 documentos à denúncia do sítio. Segundo a Procuradoria, a acusação formal foi elaborada com base em depoimentos, documentos, dados bancários e fiscais e outras informações colhidas ao longo da investigação. No material anexado pelo Ministério Público Federal há fotos de objetos e fotografias da família no sítio, escritura e registro do imóvel, notas fiscais e relatórios da Polícia Federal.

Na decisão de ontem, Moro citou notas fiscais, mensagens de celulares de investigados e o registro de “cerca de 270 viagens” de Lula ao sítio de Atibaia entre 2011 e 2016 como parte dos “elementos probatórios” que, para o magistrado, leva a entender, em primeiro momento, que há suspeitas de que o imóvel pode ser atribuído ao ex-presidente e que as reformas teriam sido feitas pelas construtoras a seu pedido.

 

‘Proprietário’. Segundo o juiz que conduz a Lava Jato na primeira instância da Justiça, os elementos coletados pela PF e pelo Ministério Público Federal, na denúncia, permitem, “em cognição sumária, a conclusão de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comportava-se como proprietário do sítio de Atibaia e que pessoas e empresas envolvidas em acertos de corrupção em contratos da Petrobrás, como Odebrecht e OAS, custearam reformas na propriedade, tendo por propósito beneficiar o ex-presidente”.

De acordo com Moro, relatos e documentos apontam que as reformas no sítio “começaram antes do final do mandato presidencial”. Lula deixou a presidência em dezembro de 2010. Emílio Odebrecht, patriarca da empreiteira, e o executivo Alexandrino Alencar, do mesmo grupo, ambos delatores da Operação Lava Jato, relataram um “compromisso” de realização das reformas assumido enquanto Lula era presidente.

Segundo o ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, os custos das reformas do sítio foram abatidos de “conta de propina” que tinha entre outras origens contratos da empresa com a Petrobrás, “estes celebrados ao tempo em que Lula da Silva exercia o mandato presidencial”.

 

Sentença. No mês passado, Moro condenou Lula a 9 anos e 6 meses de prisão no caso triplex. A sentença, a primeira do ex-presidente na Lava Jato, atribui ao petista corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Lula é réu em outro processo na operação que envolve supostos pagamentos da Odebrecht. / JULIA AFFONSO, RICARDO BRANDT, FAUSTO MACEDO e LUIZ VASSALLO

 

Curitiba. Apoiadores de Moro, que fez aniversário ontem, levaram um bolo com a foto do juiz ao prédio da Justiça Federal

 

AS ‘PROVAS’, SEGUNDO O MAGISTRADO

● Proprietários

A proximidade dos formais proprietários com o ex-presidente Lula e seus familiares;

 

● Visitas

A informação de que veículos do uso de Lula teriam ido 270 vezes no sítio entre 2011 a 2016;

 

● Câmera

A colocação de câmaras de segurança no sítio por agentes de segurança pessoal do petista;

 

● Mensagens

Mensagens eletrônicas trocadas entre o caseiro da propriedade e o Instituto Lula;

 

● Objetos pessoais

A localização, na busca e apreensão autorizada, de bens pessoais de Lula e familiares no sitio;

 

● Escritura

A apreensão na casa de Lula de minuta de escritura de compra e venda do imóvel.

 

 

 

 

 

 

‘Atentado ao Estado de Direito’, afirma defesa

Por: Marcelo Osakabe / Luiz Vassalo

 

A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a decisão do juiz federal Sérgio Moro de aceitar a denúncia do Ministério Público no processo que envolve o sítio de Atibaia (SP). Para o advogado Cristiano Zanin Martins, a nova decisão do magistrado é um “atentado ao Estado de Direito praticado por esse agente público”.

Segundo o advogado do petista, assim como na condenação do ex-presidente no caso do triplex no mês passado, Moro usou o conceito de “propriedade do fato” ao aceitar a denúncia do sítio. “Mais uma vez (Moro) trabalha com conceito de ‘propriedade de fato’, embora o sítio referido na denúncia tenha proprietários conhecidos, que constam na matrícula do imóvel e que provaram a utilização de recursos próprios e lícitos para a compra do bem, e, ainda, que suportam despesas de sua manutenção”, disse o defensor de Lula em nota.

 

‘Cabo eleitoral’. Antes da decisão de Moro de ontem, Lula afirmou que seria um “bom cabo eleitoral” caso sua candidatura à Presidência seja inviabilizada por uma eventual condenação na Justiça. “Eu posso ser um bom candidato a presidente da República se for candidato, posso ser um grande cabo eleitoral se não me deixarem ser candidato. E se morrer, como mártir, serei um grande cabo eleitoral.”

O petista reiterou que não vai desistir de provar sua inocência e que lutará para defender sua biografia e o PT. “Tenho 50 anos de vida política e não posso permitir que uma pessoa que tem como experiência de vida um concurso tente jogar toda uma vida no limbo com mentiras”, disse, repetindo críticas veladas ao Ministério Público e ao juiz da Lava Jato.

Procuradas, a Odebrecht e a OAS não se pronunciado até a conclusão desta edição. As defesas de Roberto Teixeira e de Léo Pinheiro também não responderam aos contatos do Estado. / MARCELO OSAKABE e L.V.

 

 

 

 

 

 

 

Motorista cita ‘sacola de dinheiro’ de Bendine

Por: Fausto Macedo

 

O motorista Sebastião Ferreira da Silva, o “Ferreirinha”, que relatou ter sido ameaçado e processado por Aldemir Bendine por prestar depoimento ao Ministério Público Federal, disse ter transportado o ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobrás para pagamentos em espécie com sacolas com notas de R$ 100 à época em que trabalhou na instituição financeira.

Bendine está preso no âmbito da Cobra, 42.ª fase da Lava Jato, sob a acusação de ter pedido e recebido da Odebrecht propinas de R$ 3 milhões. Segundo o Ministério Público Federal, o valor foi repassado em três entregas em espécie, de R$ 1 milhão cada, em São Paulo.

Esses pagamentos foram realizados em 2015, nas datas de 17 de junho, 24 de junho e 1.º de julho, pelo Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, responsável, segundo investigações, pelo pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos e políticos.

A força-tarefa suspeita que o pedido inicial do executivo tenha sido de R$ 17 milhões, quando ele era presidente do Banco do Brasil. Já em 2015, quando estava na Petrobrás, Bendine teria feito novas cobranças para “evitar que a Odebrecht fosse prejudicada” na estatal em decorrência da Lava Jato, que já estava em curso. Os delatores disseram que, desta vez, decidiram enviar o dinheiro.

Em 2014, o executivo já era investigado por enriquecimento ilícito e o então motorista do Banco do Brasil Sebastião “Ferreirinha” alegou, ao Ministério Público Federal, enquanto testemunha de acusação, que Bendine o utilizou “para fazer pagamentos em espécie, e que, além disso, certa vez, viu” o então presidente da instituição financeira com “uma sacola de dinheiro em espécie com notas de cem”.

O Estado não localizou a defesa de Bendine para comentar as declarações do motorista./F.M.

 

 

 

 

 

 

Conselho prorroga força-tarefa no PR

O Conselho Superior do Ministério Público Federal prorrogou por mais um ano a força-tarefa que atua na Operação Lava Jato em Curitiba (PR) e é coordenada pelo procurador Deltan Dallagnol. A decisão foi proferida ontem pelo conselho em Brasília.