O Estado de São Paulo, n. 45219, 07/08/2017. Política, p.A4

 

Maia pede que presidente não ceda na Previdência

Reformas. Em reunião no Planalto, presidente da Câmara sugere que Temer mantenha negociação da PEC no Congresso; ele defende modelo de transição e campanha publicitária

Por: Vera Rosa / Felipe Frazão

 

Vera Rosa

Felipe Frazão / BRASÍLIA

 

Após a denúncia por corrupção passiva ser rejeitada por 263 deputados na semana passada, o presidente Michel Temer fez ontem um afago ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e aceitou suas sugestões para não ceder antes da hora na negociação da reforma da Previdência.

Em reunião no Palácio do Planalto, da qual também participaram ministros, Temer concordou com as observações de Maia e deu sinais de que vai transformá-lo numa espécie de articulador da reforma, curando feridas deixadas no relacionamento dos dois no processo de votação da denúncia.

O presidente disse em entrevista ao Estado, publicada no sábado, que as mudanças na Previdência poderiam se resumir à fixação da idade mínima para aposentadoria (65 anos para homens e 62 para mulheres) e ao corte dos privilégios do funcionalismo. Na reunião de ontem, porém, ouviu de Maia que é preciso discutir também um modelo de transição para os que ingressaram no serviço público antes de 2003. O deputado defendeu uma campanha publicitária para mostrar, em termos didáticos, que os aposentados podem ficar sem receber, como no Rio, se nada for feito agora.

“Queremos uma reforma, não uma meia-sola”, afirmou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, que também participou da reunião. “O presidente pediu trabalho e empenho para que possamos cumprir a agenda econômica. São medidas que podem dar tranquilidade fiscal, como a Previdência, a simplificação tributária e o Refis.” Além do Programa de Recuperação Fiscal, há mais de 20 Medidas Provisórias na pauta do Congresso.

Convocada de última hora por Temer, a reunião ocorreu no Planalto, o que não é usual no fim de semana, e durou quatro horas. Além de Maia e Moreira, contou com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e dos ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Antônio Imbassahy (Governo).

 

Gravação. Antes de o plenário da Câmara derrubar a denúncia contra Temer, na quarta-feira, Maia chegou a ser olhado com desconfiança por auxiliares do presidente. Primeiro nome na linha sucessória da Presidência da República, o deputado foi acusado de se movimentar para ocupar a cadeira do peemedebista e não escondeu a mágoa.

O encontro de ontem serviu para serenar os ânimos. A convite de Temer, Maia também gravou um vídeo no Planalto, que foi divulgado na rede social do governo. Falou sobre a segunda fase das ações do Executivo no Rio, seu reduto eleitoral, no combate ao crime organizado.

A portas fechadas, Meirelles disse que o mercado estava “ansioso” por um prazo para a reforma da Previdência. A ideia do Planalto é aprová-la na Câmara até setembro, mas Eunício afirmou que o Congresso não pode fixar um prazo definitivo. “Eu tenho que pensar no consumidor, e não no mercado”, reagiu o presidente do Senado. “Se aprovar a idade mínima, 50% está resolvido. Já é metade da reforma”, completou.

Por se tratar de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o governo precisa de 308 votos na Câmara e 49 no Senado, em duas votações, para mudar as regras da aposentadoria. A base aliada está dividida e Temer quer uma radiografia dos partidos para saber com quem pode contar nos próximos embates. A maior divisão ocorre no PSDB, que constantemente ameaça abandonar o governo.

O discurso oficial é o de que não haverá retaliação aos infiéis, mas Temer disse ao Estado que quem estiver “sentindose mal” no governo deve deixar a equipe. Na votação da denúncia, 22 deputados tucanos se posicionaram a favor do presidente, 21 contra e 4 se abstiveram. “Estamos entrosados, motivados e temos o compromisso de fazer o máximo para que a pauta de modernização do País avance”, amenizou Imbassahy, um dos quatro ministros do PSDB.

Ao Estado, Temer elogiou a atuação de Maia nos últimos dias. “O presidente Rodrigo Maia se comporta como estadista porque cumpre rigorosamente o regimento interno da Câmara e a Constituição. O exemplo dele deve servir para vários outros militantes da área jurídica, que muitas vezes ultrapassam os limites da lei”, argumentou o presidente em um recado indireto ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Pela contabilidade do Planalto, muitos dos aliados que votaram contra Temer na quarta vão aprovar a reforma da Previdência. Questionado se confiava no apoio do PSDB, o presidente respondeu: “Não acredito que eles votem contra o Brasil”.

 

No Planalto. Temer em reunião com Moreira Franco, Henrique Meirelles, Antonio Imbassahy, Eunício Oliveira e Maia

 

PARA ENTENDER

Reformas são prioridade

Após rejeitar o prosseguimento de denúncia contra o presidente Michel Temer, a base aliada na Câmara passou a tratar como prioridade a aprovação da reforma política nas próximas semanas. As propostas precisam ser aprovadas na Câmara e no Senado em 60 dias para que tenham validade já nas eleições de 2018. Para o governo, porém, a prioridade é aprovar a reforma da Previdência até outubro, cuja alteração precisa passar por dois turnos de votação em cada uma das Casas e ter, no mínimo, 308 votos a favor na Câmara. Na votação da denúncia, o governo obteve 263 votos.

 

 

 

 

 

 

Eunício propõe que fundo eleitoral tenha recursos do Orçamento

Proposta do presidente do Senado prevê que recursos que já são destinados aos partidos sejam remanejados
Por: Felipe Frazão / Vera Rosa

 

BRASÍLIA

 

O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), propôs ontem em reunião no Palácio do Planalto o remanejamento de recursos já existentes no Orçamento do governo federal para bancar o Fundo Especial de Financiamento da Democracia (FDD). O fundo, em discussão na reforma política, vai custear as eleições com verbas públicas. Pressionados pela proximidade do calendário eleitoral, os parlamentares querem aprovar mudanças na legislação ainda neste mês para ter validade já em 2018.

As propostas tramitam na Câmara, e o relator de duas comissões, deputado Vicente Cândido (PT-SP), estima que o fundo eleitoral custe ao Tesouro R$ 3,5 bilhões em 2018. Na quarta-feira, os deputados retomam a discussão e votação do relatório de Cândido na comissão especial.

A ideia do peemedebista é criar uma espécie de “cesta eleitoral” a partir, principalmente, de verbas destinadas a partidos políticos. Com isso, a distribuição de dinheiro do Fundo Partidário – orçado em R$ 819 milhões neste ano – seria alterada. As fundações e institutos partidários passariam a receber 10% do valor global em vez dos atuais 20%. Os outros 10% seriam endereçados ao fundo eleitoral.

Eunício também pretende rever gastos com a propaganda partidária gratuita, reduzindo despesas com as inserções em rádio e TV ao longo do ano, fora do período eleitoral. Ele quer ainda destinar ao financiamento das eleições parte das emendas parlamentares impositivas: seriam cortadas as emendas coletivas de bancada, sem mexer nas individuais. “Faríamos uma cesta com esses recursos que já existem para não criar uma crise econômica com um novo fundo, num momento de dificuldade de arrecadação”, disse Eunício ao Estado. “Precisamos de financiamento. O caminho é fazer uma cesta de recursos existentes para criar o fundo.”

A proposta da “cesta eleitoral” deve ser um dos temas de uma reunião marcada para amanhã. Eunício convidou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para um jantar na residência oficial do Senado, acompanhado de alguns líderes parlamentares. Segundo ele, o presidente Michel Temer e Maia indicaram na reunião de ontem no Planalto estar de acordo com a proposta. “Todo mundo concordou. Já conversei com alguns partidos, e acho que tem aceitação, sim”, disse.

O senador vinculou a criação do FDD a mudanças mais profundas no sistema eleitoral, como cláusula de barreira, fim das coligações proporcionais e voto distrital misto./F.F. e V.R.