Para defesa de Temer, denúncia é "manca"

Paulo de Tarso Lyra

06/07/2017

 

 

Um documento de noventa e oito páginas e um vídeo de pouco mais de dois minutos resumem a esperança do presidente Michel Temer de conseguir ao menos 172 votos no plenário da Câmara. Esse é o número suficiente para sepultar a denúncia de corrupção passiva feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. “O presidente da República não cometeu crime de corrupção passiva. Não há nada que o vincule a qualquer tipo de ação criminosa. Ele não recebeu e não favoreceu ninguém”, disse o advogado de Temer, Antônio Cláudio Mariz Filho.

A peça de defesa foi entregue ao presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), um dia após a escolha do relator do processo, Sérgio Zveiter (PMDB-RJ). Mariz chegou ao Congresso escoltado por dois fiéis deputados da base de apoio ao presidente — Carlos Marun (PMDB-MS) e Darcísio Perondi (PMDB-RS) — e foi direto ao gabinete de Pacheco.

Depois, em entrevista no Salão Verde da Câmara, Mariz afirmou que tem um profundo respeito pelo procurador-geral da República, mas disse que Janot produziu uma peça de ficção, “baseada em hipóteses, suposições e criações mentais fruto da inteligência do procurador-geral”, protestou o advogado. Ele disse que a denúncia é “manca”, “chocha”, “capenga” e “anêmica”.

Mariz desafiou tanto o procurador-geral quanto o ministro Edson Fachin, relator do processo no Supremo Tribunal Federal. “Eu lanço um desafio, um respeitoso desafio, aos acusadores para que demonstrem, através de um único indício, mais frágil que seja, de que o presidente da República teria solicitado, recebido algo ou favorecido alguém”, declarou.

Na avaliação de Mariz, mesmo que Janot quisesse buscar, não encontraria nada acusatório contra Temer. “O presidente não prevaricou. O presidente encontrou Joesley Batista, como encontrou inúmeras pessoas, e é bom que se diga, fora da agenda, noturnamente, vários políticos, advogados, homens públicos, vários representantes de instituições de Estado. Não houve nada anômalo por parte do presidente”, destacou o advogado, reforçando a tese da normalidade do encontro.

E lembrou ainda que no encontro Joesley não precisou se identificar porque a reunião dele com o presidente foi marcada pelo ex-deputado Rodrigo Rocha Loures. “Restou claro que o presidente estava apenas ouvindo o falatório cansativo do empresário, e sem interferir na sua narrativa, que se mostrava sempre desconexa e confusa, limitando-se, mais uma vez, a responder com frases curtas e evasivas numa evidente demonstração de que a conversa lhe parecia despropositada”, justificou o advogado.

O defensor do presidente — que por duas vezes foi cotado para o Ministério da Justiça, mas acabou preterido por Alexandre de Moraes e Torquato Jardim, respectivamente — sinalizou que não veria problemas se fosse atendida uma das demandas da oposição: a convocação de Rodrigo Janot para explicar, na CCJ, as razões para a acusação de corrupção passiva contra Temer.

“Eu gostaria sim de estar vis-à-vis com os acusadores, inclusive, porque durante a produção de provas, a defesa não foi chamada. E houve depoimentos favoráveis ao presidente que não foram incluídos na denúncia. O que foi elaborado é uma peça unilateral e seletiva”, acusou o advogado.

Mariz, no entanto, reconheceu que esta não é uma prática regimental na CCJ e que a decisão caberá ao presidente Rodrigo Pacheco. Um dos autores do requerimento, o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) reconheceu que, embora importante, esta é uma possibilidade quase remota. “Até mesmo porque a CCJ não é CPI, não tem poder de convocação, seria apenas convite. Acredito, no entanto, que seria do interesse de Janot e dos peritos da Polícia Federal esclarecer os pontos da denúncia”, defendeu Molon.

O advogado também disse não ver necessidade de o próprio presidente aparecer no Congresso para fazer a defesa. “Ele é representado por mim e por Gustavo Guedes. Mas esta é uma questão que cabe a ele decidir.”

Questionado se o mandato do presidente Temer estaria na UTI, Mariz brincou: “Eu não sou médico, mas eu diria que está na lanchonete comemorando porque a denúncia não se sustenta. Aliás, isso é ruim para o país porque, enquanto o presidente gasta tempo se defendendo, ele deixa de se preocupar com outras coisas mais importantes para o Brasil”.

 

Tentativa de proteção

As alegações do advogado Antonio Cláudio Mariz para tentar salvar o mandato do presidente Temer

 

» A acusação, em face da carência de elementos probatórios, recorreu aos recursos intelectuais da suposição, da hipótese e das ilações que permitem afirmações de qualquer natureza no afã de emprestar falsa aparência de uma realidade que, na verdade, é uma mera ficção.

» Apresenta-se como prova nula, pois clandestina, desprovida de autorização judicial e utilizada para fins diversos daqueles permitidos por nossos tribunais. Note-se que, se a autorização fosse requerida, seria indeferida pelo Poder Judiciário.

» Mesmo considerando-se a gravação legítima e lícita, o seu conteúdo não traz nenhum, rigorosamente nenhum indício sério, robusto que, independente de criações mentais e interpretações ficcionais, possam comprometer o presidente da República e ligá-lo a alguma prática delitiva.

» A mácula da gravação, por outro lado, contaminou todos os elementos de prova que o sucederam tendo em vista a chamada Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, exposta na defesa.

» Depoimentos trazidos aos autos mostraram-se inaproveitáveis, pois contaminados pelos escusos objetivos e pelas absurdas e inaceitáveis recompensas fornecidas aos delatores, que receberam o prêmio máximo, a absoluta impunidade que afronta o senso comum de justiça do povo brasileiro.

» A denúncia omitiu depoimentos voltados para a inexistência de envolvimento do CADE, utilizada pela acusação como uma elementar do crime de corrupção.

» O cidadão Michel Temer, homem público probo e digno, com uma imagem imaculada de cinquenta anos, não cometeu, neste ano de gestão, nenhum deslize de natureza moral, ética ou penal.

 

 

Correio braziliense, n. 19763, 06/07/2017. Política, p. 2.