Risco às delações

Luana Melody Brasil

06/07/2017

 

 

 

Deputados da Comissão Especial do Código de Processo Penal estão preparando contra-ataque no embate contra o Ministério Público, que tem como pano de fundo interferir no avanço dos acordos de delação premiada e nas conduções coercitivas. O grupo propõe retirar do MP a tarefa de negociar benefícios com colaboradores, passando esse poder para o Judiciário, e mudar a regulação da condução coercitiva de acusados. As mudanças entrariam no projeto de lei 8.045 de 2010, de autoria do senador José Sarney, que tramita na Câmara.

No caso da delação premiada, a proposta atinge diretamente a forma como os procuradores conduzem a negociação. Isso porque, hoje, eles são responsáveis por acertar todos os termos dos acordos com o investigado. Ao Judiciário cabe homologar ou não a negociação.

Se a mudança sugerida já estivesse em vigor, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não teria o poder de realizar acordo com os empresários Joesley e Wesley Batista, donos da JBS, mas sim um juiz. Esse foi o episódio que agravou o conflito entre parlamentares e o Ministério Público Federal, e a iniciativa do grupo de deputados pode impactar os rumos da Operação Lava-Jato.

Além da delação premiada, o grupo também tem como estratégia modificar as atuais regras de condução coercitiva dos acusados, uma ação que tem sido criticada e classificada como um abuso do Judiciário. Na avaliação de José Robalinho, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), essas propostas são equivocadas e inconstitucionais. Sobre a delação, segundo Robalinho, a Constituição determina que não cabe ao juiz produzir provas e fazer investigação. “Essa não é a primeira proposta que entende de forma equivocada o que é a delação premiada. Temos de nos manter vigilantes com os ataques aos pilares de importantes investigações em curso no país”, disse.

 

Equívoco

Quanto à condução coercitiva, Robalinho percebe outro equívoco. “A condução coercitiva existe para substituir a prisão preventiva, favorecendo o acusado. Ela dá a oportunidade de fala e permite que sejam recolhidas provas sem a interferência do acusado.”

O relator do projeto de lei que altera o Código Penal, deputado João Campos (PRB-GO), afirmou que não foi consultado nem chegou a ele a informação sobre as mudanças propostas pelos parlamentares. A ideia do grupo, no entanto, é que elas sejam inseridas no relatório de Campos. “É possível que deputados queiram discutir isso. Eu mesmo sou contra a condução coercitiva de acusado quando não foi feita intimação prévia”, afirmou. “Essa condução só pode ocorrer se houver recusa recorrente do acusado, a forma como é feita hoje é um excesso, o Judiciário não tem observado a lei”, justifica.

 

 

Correio braziliense, n. 19763, 06/07/2017. Política, p. 5.