O falso debate da reforma da Previdência

Arnaldo Lima

09/07/2017

 

 

Há um falso debate sobre a reforma da Previdência, que ainda persiste, alimentado por entidades sindicais que resolveram adotar metodologias alternativas para dizer que não existe deficit no sistema previdenciário, criando falácias sobre a seguridade social. Sustentam esses argumentos à falta de provas para rebater a veracidade dos números que comprovam, inexoravelmente, que nosso regime previdenciário precisa urgentemente de reforma para não entrar em colapso, a exemplo da Grécia, Portugal, ou Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, para ficar em exemplos mais próximos.

No período de 12 meses findo em abril de 2017, as receitas e as despesas da seguridade social alcançaram R$ 617,5 bilhões e R$ 897 bilhões, respectivamente. Ou seja, o deficit da seguridade social foi de R$ 279,6 bilhões. A seguridade social é deficitária desde 2000 (R$ 9,3 bilhões).

A seguridade social é um conjunto de ações integradas destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social. A Constituição determina que referidas ações sejam financiadas por toda sociedade, mediante recursos orçamentários e contribuições sociais dos empregadores, trabalhadores, aposentados e governo.

O que fazem os que são contra a necessária reforma do sistema previdenciário, ignorando um resultado estruturalmente negativo? Simplesmente incluem no cálculo a Desvinculação das Receitas da União (DRU) nas receitas e excluem as despesas com servidores inativos da União. Trata-se de uma falácia destinada a esconder o tamanho real do problema.

A DRU é um instrumento constitucional de gerenciamento de receitas, cujo objetivo é reduzir a rigidez orçamentária, proporcionando uma ampliação de recursos para livre alocação. Contudo, a obrigatoriedade de pagamento das despesas com benefícios implica que, na prática, o orçamento fiscal acaba retornando à DRU (R$ 91,8 bilhões em 2016) e o montante necessário para fechar o deficit da seguridade social (R$ 166,9 bilhões em 2016). Ainda que seja necessário avaliar a efetividade da DRU, incluí-la como receita é desrespeitar os preceitos constitucionais.

O objetivo dessa contabilidade criativa é construir, ficcionalmente, um superavit para proteger os servidores públicos federais, que têm um regime previdenciário com deficit per capita maior do que o de trabalhadores do setor privado, os quais estão vinculados ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

Argumentar que o orçamento da seguridade social é superavitário implica em uma grave acusação de crime de responsabilidade contra os últimos quatro presidentes da República e ao Congresso Nacional, que tem a atribuição de aprovar as contas do Governo.

A Constituição determina que a Lei Orçamentária Anual (LOA) deve compreender os seguintes orçamentos: Investimento das Empresas Estatais, Fiscal e Seguridade Social. Por sua vez, o inciso VI do art. 85 estabelece que constituem crime de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Lei Orçamentária.

Não é razoável supor que, desde 2000, todos os presidentes cometeram crime de responsabilidade.

(...)

 

 

» ARNALDO LIMA

Economista, assessor especial do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Foi um dos integrantes do grupo técnico encarregado de elaborar a Reforma da Previdência

 

 

Correio braziliense, n. 19766, 09/07/2017. Opinião, p. 11.