Lei é sancionada com promessa de mudanças

Alessandra Azevedo e Rosana Hessel

14/07/2017

 

 

Cercado de empresários, parlamentares e ministros, o presidente Michel Temer sancionou, na tarde de ontem, a reforma trabalhista. O texto, que muda vários pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foi aprovado pelo Senado Federal na última terça-feira, após ter passado com êxito pela Câmara dos Deputados, em abril. As novas regras começam a valer daqui a 120 dias e têm como mote a prevalência do “acordado sobre o legislado”. A negociação entre empresas e trabalhadores passará a valer mais que a lei em assuntos como parcelamento de férias, flexibilização da jornada de trabalho, participação nos lucros e resultados, intervalo de almoço e banco de horas.

Para Temer, aprovar a legislação foi uma prova de “coragem”. “Essa era uma das demandas que muitos falavam, mas ninguém teve a ousadia de realizá-la”, declarou ontem. O presidente comemorou a “vitória expressiva” no Palácio do Planalto.

Apesar de o texto já ter passado por todas as etapas necessárias para se tornar lei, a reforma não está completa. A legislação ainda será mudada por medida provisória, para cumprir a promessa feita aos senadores em troca da aprovação. A MP que tratará dos assuntos pendentes está em discussão, mas o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), garante que incluirá as questões mais polêmicas, como a jornada intermitente, que permite a prestação de serviços de forma descontínua, e a possibilidade de grávidas e lactantes trabalharem em ambientes insalubres.

O governo pretende estabelecer um prazo de 18 meses para que um trabalhador efetivo passe a ser intermitente, por exemplo. A minuta mais recente da MP continua sem especificar quais setores se enquadram no trabalho intermitente, de maneira que, até o momento, o posicionamento oficial é que todos os trabalhadores poderão contar com essa flexibilização na CLT. “Esse tipo de contrato vai ser usado de acordo com a demanda, e a mais comum hoje está na informalidade. Essas pessoas serão absorvidas por esse modelo, que é mais seguro. Não faz diferença separar por categoria”, acredita o especialista em relações de trabalho Emerson Casali.

Do ponto de vista econômico, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, considera que a nova lei está “revolucionando a economia brasileira”. Mais que positiva, a reforma é, segundo ele, necessária, especialmente por conta do avanço tecnológico que criou modalidades de contrato, como o trabalho intermitente e o teletrabalho.

Também há benefícios do ponto de vista Judiciário, ressaltou o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho. Ele acredita que as novas regras ajudarão a reduzir os conflitos e os processos trabalhistas. “Estou convencido de que a melhor forma de proteger o trabalhador seja exatamente esse caminho trilhado pela reforma. Todos querem proteção e a retomada dos investimentos para o país voltar a crescer”, afirmou.

 

Sem acordo

Alguns pontos foram deixados de lado na minuta, como a sugestão do relator das comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Assuntos Econômicos (CAE) no Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), de manter o intervalo de 15 minutos para que as mulheres comecem a hora extra, como é feito atualmente. A principal demanda das centrais sindicais também foi ignorada. Até o momento, a contribuição sindical continua sem ser obrigatória, como propôs o relator na Câmara, Rogério Marinho (PSDB-RN).

O deputado não foi confrontado sobre esse assunto pelo Senado ou pelo Executivo, mas o tema continua gerando discussão. De um lado, os sindicatos querem manter tudo como está; de outro, os parlamentares, em especial os deputados, fazem questão que a obrigatoriedade do imposto seja retirada. “Não há nenhum acordo para colocar de volta. O Senado se manifestou para não incluir isso na MP”, disse Jucá.

Essas e outras questões, no entanto, ainda podem mudar mais para a frente, já que a MP não está consolidada. “Eventualmente, pode até aparecer alguma outra alteração. O texto pode ser publicado hoje, na semana que vem ou só daqui a 120 dias”, ponderou Casali. Até lá, os senadores e deputados trabalharão em um texto consensual, que atenda às demandas das duas Casas. O governo entende que é preciso ouvir as demandas dos deputados, já que o acordo foi firmado apenas com os senadores durante a tramitação. Para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), “não podemos, depois de ter tido uma grande vitória, ter nenhum tipo de retrocesso”.

Durante a tramitação no Senado, o texto recebeu 864 emendas, o que mostra a existência de muitos pontos de discordância em relação ao texto sancionado ontem, inclusive por parte da base aliada. Dezenas dessas sugestões de mudança foram feitas por senadores do PMDB, partido do presidente.

 

 

Correio braziliense, n. 19771, 14/07/2017. Economia, p. 7.