Uma legenda que quer ser grande

Natália Lambert

20/07/2017

 

 

De repente, em uma mistura de sorte e oportunidade, o Democratas, o antigo Partido da Frente Liberal (PFL), vive um momento de ascensão e se permite sonhar com voos mais altos. Após anos praticamente isolado na oposição radical aos governos petistas e ver a representatividade nacional minguar, chegou a ser fadado à extinção. Agora, com a possibilidade de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se sentar na principal cadeira do Palácio do Planalto, a legenda voltou aos holofotes, virou um “partidão” e tem recebido assédios e paparicos de diversas frentes, até mesmo disputando parlamentares do PSB com o PMDB. “O DEM pode e deve pensar em uma campanha presidencial”, afirma o líder do partido na Câmara, Efraim Filho (PB).

“Ninguém investe politicamente em um partido que não tenha um projeto de poder. E, agora, está acontecendo uma possibilidade de ter um presidente a curto prazo. Político pende para onde o poder está”, comenta o doutor em ciência política José Matias-Pereira. Para o professor da Universidade de Brasília (UnB), o crescimento do DEM também se deve ao desencantamento com a classe política pela população, que demonstra cada vez mais repúdio à polarização PT-PSDB, e passa por uma onda mais conservadora. “Os outros partidos estão indo para o fundo do poço e aqueles que ficam menos afetados nos escândalos acabam se destacando e se saindo melhor”, comenta Matias-Pereira.

O deputado Efraim Filho acredita que a legenda colhe agora os frutos da coerência plantada durante os governos petistas de nunca ter ficado em cima do muro. O líder da bancada na Câmara lembra que a criação do PSD — pelo hoje ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab — levou boa parte dos demistas por causa da firmeza ideológica da legenda. “Houve um racha no DEM com aqueles que queriam ser governistas. Foi um dos momentos de maior dificuldade, mas importante, porque se criou um filtro na linha ideológica partidária e respondeu às críticas de que o PFL era um partido fisiologista. Hoje há uma unidade.”

Questionado se o plano de chegar à Presidência da República por meio de eleições diretas é muito ambicioso para um partido considerado pequeno, Filho diz que isso é análise da velha política. “Não me alinho a essa ideia tradicional de que a eleição de 2018 será baseada nas bases. Olha o exemplo do presidente da França, o Emmanuel Macron. Emergiu com conceitos e ideias e um discurso de centro, que é o que o Brasil precisa. A sociedade não aguenta mais polarizações, há um espaço a ser preenchido e o DEM tem condições para isso”, comenta. E já antecipa possíveis nomes: Rodrigo Maia, o senador Ronaldo Caiado (GO) e o prefeito de Salvador, ACM Neto.

 

Atração

Um dos citados por Efraim Filho, Caiado também afirma que o DEM chega hoje ao ápice em relação à postura e coerência e isso atrai o eleitor que não quer mais políticos sem autenticidade. “Sempre mantivemos a capacidade combativa e nunca nos curvamos. Fomos os únicos que sobrevivemos dentro de um estado boliviariano mesmo com toda a perseguição. O partido foi assaltado e agora consegue se recuperar, porque é o caminho que a sociedade exige”, acredita. Caiado, porém, é mais cauteloso sobre a disputa para a Presidência, que dependerá da reforma política que o Congresso aprovar. “Dentro das regras, vamos saber se teremos competitividade para uma candidatura.”

Especialistas acreditam que é muito cedo para afirmar que há um crescimento do DEM. O professor de ciência política do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) Geraldo Tadeu Monteiro ressalta que a ascensão da legenda é visível dentro do Congresso, mas não dá para estender isso nível nacional. Nas eleições municipais de 2016, inclusive, o DEM perdeu prefeituras, caindo de 276 para 267 — ainda assim ficou à frente do PT, que reduziu de 630 para 256 o número de prefeitos. “O ambiente político está muito instável. E, por razões conjunturais, com a queda do Eduardo Cunha e a articulação de Rodrigo Maia para assumir a Câmara, o partido está em alta, mas não significa ascensão nacional. É um jogo muito mais complexo que isso”, comenta Monteiro.

 

 

Correio braziliense, n. 19777, 20/07/2017. Política, p. 2.