O Estado de São Paulo, n. 45223, 12/08/2017. Política, p.A4

 

 

Para governo, emendas devem bancar novo fundo

Reforma política. Líder do Planalto no Senado propõe que recursos, em sua maioria, saiam dos repasses para as bancadas estaduais; deputados querem verbas do Tesouro

Por: Felipe Frazão

 

Felipe Frazão

Líderes da base aliada do governo no Congresso pressionam para que o fundo público de R$ 3,6 bilhões para bancar campanhas eleitorais seja abastecido com recursos já existentes no Orçamento, como emendas parlamentares e verbas controladas pelos partidos. Se prevalecer a forma como a comissão da Câmara aprovou a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia (FDD), o governo vai ter de lidar com uma nova despesa no ano que vem, em meio aos problemas de receita e discussão da revisão da meta fiscal.

A proposta de utilizar as emendas como fonte de financiamento do fundo é capitaneada pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), e pelo presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE).

A ideia, contudo, encontra forte resistência entre os deputados – parte da Câmara defende que o dinheiro do fundo eleitoral saia do Tesouro e as emendas sejam preservadas.

Líderes do governo sugerem descontar dinheiro de três fontes para repassar ao fundo eleitoral: das emendas impositivas de bancadas estaduais, da propaganda partidária e das fundações e institutos custeados com o Fundo Partidário. Isso reduziria recursos nas mãos dos parlamentares e dos dirigentes.

“A proposta que eu fiz não tira dinheiro da Educação, da Saúde, de lugar nenhum. Eu defendo uma parte da desoneração da TV, com propaganda partidária, e outra parte das emendas. Não é para ter gasto”, disse Jucá.

Eunício batizou a proposta de “cesta de recursos” e disse que ela pode evitar “uma nova crise econômica”.

Os deputados, no entanto, deixaram a “cesta” fora do texto que seguirá para votação em plenário. O relatório aprovado na comissão especial da Câmara indica que o FDD será composto por recursos equivalentes a 0,5% da receita corrente líquida – um gasto extra em anos eleitorais.

O fundo eleitoral é a alternativa que parlamentares encontraram para financiar as eleições depois que o Supremo Tribunal Federal proibiu em 2015 a doação de empresas para as campanhas. Para ter validade já em 2018, o FDD precisa ser aprovado na Câmara e no Senado até o fim de setembro, um ano antes das eleições.

O relator da reforma política, Vicente Cândido (PT-SP), disse que os deputados não aceitaram abrir mão das emendas coletivas e que a aprovação do fundo eleitoral ficaria ameaçada caso essa previsão entrasse em seu parecer final. “Os parlamentares calculam que um dos instrumentos para alavancar o mandato e trabalhar pela reeleição é ter emendas”, disse.

LDO. Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018 está previsto que as emendas coletivas serão a principal fonte para o fundo eleitoral.

As outras duas fontes seriam: 10% do Fundo Partidário – R$ 81,9 milhões, obtidos pelo corte pela metade da fatia destinada às fundações partidárias –e a extinção da propaganda partidária no rádio e na TV exibida anualmente fora do período eleitoral. Este ano o governo previu deixar de arrecadar R$ 320 milhões das emissoras como renúncia fiscal para garantir a exibição desses programas e inserções das legendas.

Contingenciamento. As emendas coletivas impositivas – aquelas que o governo é obrigado a pagar para projetos de bancadas parlamentares – estavam previstas em R$ 6 bilhões neste ano, mas caíram para R$ 3,072 bilhões com as revisões e contingenciamentos.

Há ainda as emendas individuais, que os parlamentares podem apresentar projetos separadamente, que não serão mexidas nem entram nessa conta.

A avaliação da área econômica do governo é de que a vinculação do fundo à receita corrente líquida é um problema significativo do ponto de vista fiscal. Em meio ao crescimento de outras despesas obrigatórias, como benefícios da Previdência Social, o Executivo terá de garantir recursos para o fundo em um Orçamento cada vez mais apertado. Além disso, os valores podem ficar ainda maiores à medida que houver recuperação da economia e da arrecadação. / COLABOROU IDIANA TOMAZELLI

 

- Gastos

“A proposta não tira dinheiro da Educação, da Saúde. Defendo uma parte da desoneração da TV, com propaganda partidária, e outra parte das emendas. Não é para ter gasto.”

Romero Jucá (PMDB-RR)

LÍDER DO GOVERNO NO SENADO

 

“Um dos instrumentos para alavancar o mandato e trabalhar pela reeleição é ter emendas.”

Vicente Cândido (PT-SP)

RELATOR DA REFORMA POLÍTICA

 

 

 

 

Valor supera ou iguala orçamento de 7 ministérios

Levantamento mostra que montante de R$ 3,6 bi previsto no fundo para as eleições está acima do destinado a pastas
Por: Isadora Peron

 

Isadora Peron / BRASÍLIA

Os R$ 3,6 bilhões que devem ser destinados ao fundo público eleitoral se a reforma política for aprovada pelo Congresso superam o orçamento anual de um quarto dos ministérios do governo. Levantamento feito pelo Estado mostra que pelo menos sete pastas têm um valor menor ou igual ao fundo.

O valor deverá ser destinado aos partidos políticos para as eleições de 2018. O Ministério do Meio Ambiente conta com um orçamento apenas ligeiramente maior: R$ 3,8 bilhões.

O Ministério do Turismo, por exemplo, possui R$ 343 milhões para custear despesas e realizar investimentos no setor. Já o orçamento do Esporte é de R$ 960 milhões e do Ministério da Transparência, de R$ 986 milhões. Cultura (R$ 2,5 bilhões), Indústria e Comércio Exterior (2,6 bilhões), Advocacia-Geral da União (R$ 3,5 bilhões) e Relações Exteriores (R$ 3,6 bilhões) completam a lista.

Esses valores correspondem ao orçamento das pastas antes do corte adicional de R$ 5,9 bilhões anunciado pelo governo no fim do mês passado.

A proposta de criar o fundo consta no relatório aprovado na quarta-feira passada pela comissão especial que debate a reforma política na Câmara. O texto, que também aprovou a mudança do sistema eleitoral para o chamado “distritão”, ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado. Para valer para 2018, as medidas têm de ser aprovadas nas duas Casas até final de setembro. Por se tratar de uma emenda à Constituição, a proposta precisa do apoio de 308 deputados e de 49 senadores.

Apesar de polêmico, a criação do fundo é praticamente consenso entre os parlamentares, já que a classe política busca uma maneira de abastecer os caixas das campanhas após a proibição das doações empresariais e as investigações da Operação Lava Jato.

“A questão toda é como você financia a eleição? Infelizmente, a gente não tem alternativa a não ser buscar recursos públicos”, disse o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ).