Título: Quando o abusador é criança
Autor: Maia, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 21/02/2012, Cidades, p. 17

Erotização precoce e falta de orientação sexual nos ambientes familiar e escolar fazem surgir casos de abuso onde tanto vítima como algoz são menores de idade. Somente nos últimos quatro meses foram registrados 20 casos no Distrito FederalNotíciaGráfico

A dificuldade dos pais em lidar com a educação sexual dos filhos tem levado ao surgimento de uma realidade preocupante: casos de crianças abusando de crianças, fruto da erotização precoce de crianças e adolescentes. Somente na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) II, 20 casos de abuso entre menores estão sendo investigados desde novembro do ano passado, média de cinco casos por mês. E, assim como nos abusos cometidos por adultos, a violência sexual dessa natureza também ocorre principalmente dentro de casa, entre parentes.

"Os pais saem para trabalhar e deixam os filhos mais velhos cuidando dos mais novos. É durante essa ausência adulta que a violência geralmente ocorre", explica o delegado-adjunto Marinho José Barreto, da DPCA II. Apesar de os abusos ocorrerem na maioria das vezes dentro de casa, também existem registros em instituições de adoção e em centros de cumprimento de medidas socioeducativas.

Assim como o abuso sexual cometido por adultos, a dominação do mais novo pelo mais velho é o sentimento que permeia a violência. A baixa autoestima do adolescente ofensor sexual, agressões físicas e o ambiente familiar conturbado são as principais causas apontadas pelos especialistas para a incidência do abuso entre menores.

"O mais velhos ganham a responsabilidade da família de cuidar, de vestir e de alimentar as outras crianças. De noite, quando os pais chegam, eles voltam a ser crianças e perderam a posição de mandante da casa. Sem uma educação sexual bem trabalhada, o abuso pode acabar acontecendo", explica Fernanda Falcomer, do Programa de Prevenção e Atendimento aos Acidentes e Violência do Centro de Orientação Médica Psicopedagógica (Compp) da Secretaria de Saúde do DF.

Sexualidade De acordo com a psicóloga, a reação da maioria dos pais quando descobrem a violência dentro de casa é de estranheza e espanto. Por isso, uma das etapas do tratamento tem a participação de toda a família. A especialista Adriana Costa de Miranda lembra que as famílias acabam esquecendo que os adolescentes são pessoas descobrindo a sexualidade e que, se não forem bem orientados, podem descobrir o sexo de uma maneira não saudável. "A gente ouve muito adolescente dizer "na hora me deu aquele negócio". Eles precisam entender já no começo da atividade sexual que existem os jogos sexuais, mas que eles devem ser realizados com respeito", afirma.

Todo ano, o Compp abre um tratamento psicológico com um grupo de 12 adolescentes. Devido à grande procura, em 2011 o tratamento foi realizado com 20 adolescentes. "Assim como no abuso com os adultos, os adolescentes ofensores sexuais também têm aparecido mais. Temos que educá-los para que eles tenham uma vida sexual saudável no futuro", aposta a psicóloga Fernanda Falcomer.