ENTREVISTA - Gilmar Mendes

Gláucia Guimarães, Denise Rothenburg e Leonardo Cavalcanti

03/08/2017

 

 

Vinte e quatro horas depois de fazer duras críticas ao trabalho da gestão atual da Procuradoria-Geral da República (PGR), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, voltou a reprovar o procurador Rodrigo Janot. Em entrevista ao programa CB.Poder — uma parceria da TV Brasília com o Correio Braziliense — o magistrado disse que Raquel Dodge, que assume a PGR em 17 de setembro, trará de volta decência à chefia do Ministério Público. “Eu não tenho nenhuma dúvida de que estamos fazendo a reconstitucionalização da Procuradoria-Geral da República (PGR). Vai vir um equilíbrio maior nas decisões, volta um quadro de normalidade e decência na procuradoria-geral”, revela.

Com a substituição do procurador da PGR prevista para o dia 17 de setembro, o momento é de transição. “A procuradoria, há um tempo, vem sofrendo reveses específicos”, afirmou o ministro. A delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, é um dos motivos para esse revés. A delegada da Polícia Federal Graziela Machado da Costa e Silva concluiu que a delação premiada de Machado não foi eficaz e decidiu pedir o cancelamento dos benefícios dados. Segundo Gilmar Mendes, a questão envolvendo Sérgio Machado pode interferir no caso Joesley Batista, podendo levar à reversão do perdão concedido ao empresário. “O caso Sérgio Machado foi aquele que chamou atenção para os desmandos e desvios que estavam ocorrendo.”

Gilmar Mendes disse que houve uma precipitação por parte do Ministério Público (MP). “Eles perderam a mão, perderam a noção de limites”, falou Mendes a respeito da postura do MP. “O MP tem uma função que é complexa, ele tem de fazer a investigação criminal, mas também é fiscal da legalidade, ele não pode cometer crime para combater crime, ele não pode cometer delito para combater delito”, disse o ministro.

O ministro respondeu à acusação do PT de que ele teria um lado político. “O meu lado é a defesa do estado de Direito, a defesa das instituições, tenho esse compromisso com a constituição de 1988”, assumiu. “Se o PT encontrou segurança em determinado momento, foi graças aos meus olhos”, concluiu Mendes.

A votação para autorizar ou não do prosseguimento da denúncia por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer, pode, segundo Gilmar Mendes, amenizar a crise política no país, caso a mesma não seja aceita. “Essa é a denúncia que, de fato, pode ter a maior consistência. Sendo um leitor da realidade política, talvez haja uma atenuação da situação política se o prosseguimento não for dado”, afirmou.


A partir de agora, com a recusa da denúncia contra Temer, a crise política pode acalmar?
Tenho impressão de que sim. Essa é a denúncia que, de fato, pode ter a maior consistência. Sendo um leitor da realidade política, talvez haja uma atenuação da situação política.


Existe a possibilidade de o MP recuar?
Na verdade, estamos vivendo um momento de transição, a Procuradoria-geral terá uma substituição em 17 de setembro. A Procuradoria, há um tempo, vem sofrendo reveses específicos. A delação do Sérgio Machado acaba de ser avaliada pela PF e a delegada disse que não houve obstrução, mas pediu o cancelamento do benefício concedido ao Sérgio Machado, dizendo que o que ele tinha trazido era imprestável. Agora, vem notícias sobre abusos na delação da Odebrecht.

Raquel Dodge ou Rodrigo Janot?
Eu não tenho nenhuma dúvida de que não estamos fazendo agora a reconstitucionalização dessa relação com a Procuradoria-Geral da República. Vai vir um equilíbrio maior nas decisões, volta um quadro de normalidade e decência. A Procuradoria há um tempo vem sofrendo reveses, como é o caso da delação de Sérgio Machado. A delegada concluiu que a delação premiada dele não foi eficaz e decidiu pedir o cancelamento dos benefícios concedidos.

Então o Ministério Público se precipitou?
Eles perderam a mão, perderam a noção de limites. O MP tem uma função que é complexa, ele tem de fazer a investigação criminal, mas também é fiscal da legalidade, ele não pode cometer crime para combater crime, ele não pode cometer delito para combater delito.

O PT diz que o senhor tem lado político. O que tem a dizer sobre isso?
O meu lado é a defesa do estado de Direito, a defesa das instituições, tenho esse compromisso com a constituição de 1988, é para isso que eu direciono meu trabalho. Eu não tenho lado político. Tanto é que eu tenho amizade nos mais diversos segmentos da vida partidária. Se o PT encontrou segurança em determinado momento, foi graças aos meus olhos. Eu fui relator no caso Palocci, no não indiciamento do Mercadante e, recentemente, no caso José Dirceu. Veja meu voto nesse caso.

 

 

Correio braziliense, n. 19791, 03/08/2017. Política, p. 9.