O Estado de São Paulo, n. 45235, 23/08/2017. Economia, p.B7

 

Oposição barra votação da nova TLP

Por: Idiana Tomazelli / Adriana Fernandes / Thiago Faria

 

Idiana Tomazelli

Adriana Fernandes

Thiago Faria / BRASÍLIA

 

Em uma sessão marcada por confusão e bate-boca, a oposição e o senador José Serra (PSDB-SP) impuseram uma derrota ao governo e conseguiram adiar ainda mais a votação da medida que cria a nova taxa de juros que balizará empréstimos do BNDES, uma das mais importantes e sensíveis para a política econômica.

A votação é vista como um termômetro da força do governo para aprovar propostas de seu interesse no Congresso Nacional, e o mau sinal ampliou as desconfianças sobre a capacidade de articulação do governo do presidente Michel Temer. A percepção dos analistas é que, diante das dificuldades na aprovação da chamada Taxa de Longo Prazo (TLP), o cenário pode ficar ainda pior em votações estratégicas que estão por vir, como a mudança nas metas fiscais de 2017 e 2018, o pacote de redução de despesas com servidores públicos e a própria reforma da Previdência.

A confusão começou quando o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), presidente da comissão mista que analisa a TLP, decidiu acatar a questão de ordem de Serra que acusava o governo de infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e o teto de gastos, ao não apresentar estimativas de impacto da medida no Orçamento. O relator, deputado Betinho Gomes (PSDBPE), favorável à proposta, tentou argumentar que a nova taxa de juros, por ser mais alinhada ao custo de captação do Tesouro Nacional no mercado, elimina os subsídios e não gera novas despesas. Mas o senador petista deu uma semana para a apresentação dos cálculos e encerrou a sessão.

A decisão incendiou o bateboca entre oposição e base aliada, que já vinha em clima de ebulição desde o início da sessão. A reação tem motivo: o governo corre contra o tempo para aprovar a TLP, uma vez que a MP precisa ser votada até 6 de setembro para que não caduque.

Ciente do risco, o mercado financeiro acusou o golpe, levando o dólar e os juros futuros às máximas do dia. O temor só arrefeceu quando a base aliada tentou outra manobra, a de eleger um vice-presidente da comissão mista para retomar os trabalhos ainda ontem. O presidente do Congresso Nacional, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), precisou intervir e pressionou para que houvesse acordo. O resultado foi a remarcação da nova sessão para esta quarta-feira às 9 horas.

O líder do governo no Congresso, André Moura (PSCSE), afirmou que a votação deve ocorrer pela manhã e que o plenário da Câmara dos Deputados pode apreciar o texto também na quarta-feira. Apesar do otimismo, essa negociação ainda não foi costurada diretamente com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), segundo apurou o Estadão/Broadcast,

o que pode abrir caminho para novas surpresas, principalmente porque o foco dos parlamentares agora está na reforma política, que mexe diretamente com suas pretensões eleitorais.

 

Atenção. Integrantes da equipe econômica acompanharam de perto o vaivém na comissão da TLP, entre eles o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Fabio Kanczuk, o chefe da assessoria especial de Reformas Microeconômicas, João Manoel Pinho de Mello, e o diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Tiago Berriel. Nenhum deles quis comentar o adiamento da votação.

Nos bastidores, a equipe econômica continua otimista em relação à aprovação. A avaliação é de que, assim como na reforma trabalhista, o governo conseguirá a vitória mesmo depois de a oposição ter articulado o adiamento da votação.

Além disso, a área econômica prepara uma série de argumentos para mostrar que a TLP não tem custo fiscal. A principal linha de defesa da medida é a de que ela reduzirá os subsídios bancados pelo Tesouro Nacional. / COLABORARAM DENISE ABARCA E NIVIANE MAGALHÃES

 

Argumento contrário

“Não há números. Há impacto no Orçamento, na despesa. O Tesouro Nacional terá que aumentar sua contribuição para equalização da taxa de juros da agricultura, e isso não está contemplado”

José Serra

SENADOR (PSDB-SP)

 

 

 

Governo prepara mudança em fundos constitucionais

Medida para reduzir juros de financiamentos é uma tentativa de vencer a resistência do Congresso à criação da TLP
Por: Idiana Tomazelli / Adriana Fernandes

 

BRASÍLIA

 

Para tentar vencer a resistência de parlamentares à criação da nova taxa de juros que balizará empréstimos do BNDES, a equipe econômica prepara uma proposta que vai permitir juros menores em financiamentos com recursos dos fundos constitucionais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. As linhas gerais da medida já foram discutidas com alguns parlamentares, que, em troca, devem garantir voto favorável à Taxa de Longo Prazo (TLP), uma das mais importantes e sensíveis iniciativas da equipe econômica.

O senador Fernando Bezerra (PSB-PE), que tem sido um dos principais interlocutores do Congresso nessa negociação, deu provas ontem do que o governo pode obter em troca do aceno. Em meio às tentativas da oposição de obstruir a votação da TLP na comissão mista, Bezerra defendeu a medida aos gritos. Depois pediu desculpas pelo “excesso e veemência”.

O temor dos parlamentares é que a TLP encareça o crédito para os tomadores de financiamento nesses fundos. Para driblar o problema, o eixo da proposta é a aplicação de um redutor sobre o juro real, ou seja, a parcela da TLP que supera a inflação.

Hoje, os empréstimos com recursos dos fundos constitucionais cobram Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), em 7% ao ano. A TLP seguirá os juros das NTN-Bs de cinco anos, títulos públicos atrelados à inflação que refletem mais de perto o custo de captação do Tesouro. Economistas projetam que a nova taxa deva ficar acima da TJLP, daí o temor dos parlamentares.

“Pedimos que haja a aplicação do dispositivo constitucional de que os juros dos fundos constitucionais têm que ser diferenciados. Nossa proposta é que fosse aplicado o coeficiente de desenvolvimento regional, que é a renda per capita das regiões comparada com a média nacional”, disse Bezerra ao Estadão/Broadcast.

Por essa regra, os financiamentos do fundo constitucional do Nordeste teriam o juro real 40% menor, explicou o senador. Segundo Bezerra, a renda per capita dos nordestinos corresponde a 60% da média nacional. A mudança pode ser feita por medida provisória. “O coeficiente seria aplicado em cima da taxa de juros real. A outra parte da taxa (de juros) é inflação, que é comum para todo o Brasil”, detalhou o senador.

Segundo Bezerra, os termos foram negociados com o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia, e com o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. O senador admitiu que a proposta servirá para destravar a tramitação da TLP, que ontem sofreu um revés na comissão mista que votaria a medida. /I.T e A.F.

 

Proposta

“Pedimos que haja a aplicação do dispositivo constitucional de que os juros dos fundos constitucionais têm que ser diferenciados.”

Fernando Bezerra

SENADOR (PSB-PE)