Título: R$ 394 milhões para três meses de trabalho
Autor: Correia, Karla
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2012, Política, p. 2/3

Em ano eleitoral, que costuma ser marcado pela redução na produtividade, deputados e senadores aparecerão no parlamento em 90 dias no máximo, mas os salários e benefícios permanecerão intactosNotíciaGráfico

Em 2012, o contribuinte irá pagar, por baixo, R$ 394,2 milhões em salários e benefícios para deputados federais e senadores. Os parlamentares, por sua vez, comparecerão ao Congresso em sessões deliberativas e não deliberativas em apenas 90 dias durante todo o ano — isso, se decidirem fazer do carnaval um evento isolado, quando emendaram a folga por 10 dias, e não enforcarem mais nenhum feriado durante o ano. As eleições municipais irão esvaziar o parlamento entre julho, quando se inicia o recesso previsto na Constituição, e o primeiro domingo de outubro — a data do primeiro turno. No período informalmente batizado de "recesso branco", não são realizadas votações em plenário nem nas comissões da Câmara e do Senado. Os vencimentos dos congressistas, contudo, continuarão a ser pagos rigorosamente em dia.

O "fenômeno" se repete a cada dois anos, sempre em ano eleitoral. O pleito municipal, encarado pelos partidos como uma preparação para a campanha presidencial de 2014, pela sua importância na formação de bases eleitorais e no crescimento das legendas, não será diferente. Parlamentares deslocarão suas agendas para seus estados, alguns como candidatos na disputa pelas prefeituras, outros buscando votos para aliados. "A preocupação com a questão eleitoral faz parte do cotidiano do parlamentar. O comprometimento da vida legislativa é inevitável, mas não significa que o Congresso deixará de votar projetos", defende o senador José Agripino Maia (DEM-RN). Um levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) aponta na direção contrária à avaliação do senador.

Segundo o estudo, no ano passado o Congresso enviou para sanção presidencial 208 leis ordinárias. Em 2010, ano de eleições gerais, esse montante ficou 21% abaixo: 164 leis. Em 2009, foram 255. "Normalmente, as votações de projetos importantes não são afetadas, mas a queda no desempenho do parlamento é gritante", avalia Antônio Augusto de Queiroz, assessor parlamentar do Diap.

"Não há dúvida que as campanhas causam problemas para as votações, mas é nosso papel buscar meios para reduzir o dano", admite o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO). Na tentativa de contornar o apagão de votações em plenário, Câmara e Senado costumam articular a realização de semanas de "esforço concentrado" para votar propostas de aprovação mais urgente. A definição dessa agenda intensa de votação depende de decisão do conjunto de líderes partidários e de convocação pelos presidentes das duas Casas. "Geralmente o que ocorre todos os anos é a compressão do calendário de votações e a adoção desse tipo de recurso, com a presença maciça dos congressistas", diz José Agripino.

Rendimento Para o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, o esvaziamento do Congresso em anos eleitorais e a consequente queda no rendimento do Legislativo nesses períodos de recesso branco são ainda mais graves quando se leva em consideração o custo do parlamento para o contribuinte. Somados, os orçamentos das duas Casas chegam a R$ 7,58 bilhões em 2012. Estão incluídos o pagamento de previdência de inativos e pensionistas, a atuação legislativa de deputados e senadores, o custo operacional do Legislativo e a participação de congressistas em organismos internacionais. A sustentação financeira dessa estrutura representa, para cada brasileiro, o desembolso de R$ 132 anuais, de acordo com a ONG. Seguindo essa lógica, cada senador representará, por ano, um peso de R$ 41,4 milhões aos cofres públicos. Cada deputado, por sua vez, custará R$ 8,2 milhões em 2012.

"A produção do Legislativo federal não justifica esse custo gigantesco. Temos um dos parlamentos mais caros do planeta, onde os congressistas se dão o luxo de parar sua atividade legislativa, continuar recebendo seus salários enquanto trabalham em interesse próprio, para se eleger ou eleger companheiros de legenda", critica Abramo.

Na avaliação do diretor executivo da Transparência Brasil, o encarecimento do Legislativo federal vem acompanhado do enfraquecimento político de seus integrantes. "O político de qualidade mais baixa tende a trabalhar mais por si próprio, o que é caro e pouco eficaz, do ponto de vista da produção legislativa", acredita Abramo. "Certamente, uma parcela significativa do custo elevado do nosso parlamento pode ser atribuída à concupiscência dos congressistas."