O globo, n.30711 , 06/09/2017. País, p.4

Janot justifica atuação na PGR: ‘medo de errar e decepcionar’

 EDUARDO BRESCIANI

 

 

Procurador-geral diz à sucessora que está tentando ‘arrumar a casa’

A 12 dias de deixar o comando da ProcuradoriaGeral da República, Rodrigo Janot comparou ontem a reta final de seu mandato a uma montanha-russa “que só tem queda livre” e disse que suas atitudes foram tomadas por “medo de errar e decepcionar” o Ministério Público. Janot afirmou ainda que o procurador-geral é sempre o responsável pelos erros, enquanto os acertos devem ser divididos com a equipe.

As declarações foram dadas um dia depois de Janot anunciar que instaurou uma investigação interna para apurar irregularidades nos procedimentos que levaram ao acordo de colaboração de três delatores da JBS. O pronunciamento improvisado, feito durante a última sessão do Conselho Superior do Ministério Público Federal presidida por Janot, ocorreu no mesmo momento em que era divulgada a gravação que pode invalidar a delação da JBS.

Na sessão de ontem, Janot afirmou que suas atitude não foram tomadas por “coragem”, mas por “medo”. Ele disse ter chegado a tal conclusão na segunda-feira, quando decidiu pela abertura do procedimento para rever a delação da JBS.

— Ontem (segunda-feira) foi um dos dias mais tensos, um dos maiores desafios deste período. Ontem alguém disse para mim: “Você é um homem de muita coragem”. Eu pensei: “Será que sou?”. E eu pensei que não tenho coragem nenhuma. Eu tenho medo. O medo nos faz alerta. Tenho medo de quê? De errar muito e decepcionar a instituição. As questões que enfrentei, enfrentei por medo de errar, de me omitir e de decepcionar a instituição, mais do que por coragem de enfrentar os desafios — afirmou Janot.

O balanço de sua atuação ocorre no momento em que o procurador-geral prepara uma segunda ação penal contra o presidente Michel Temer. A denúncia será baseada em informações fornecidas pelos delatores da JBS. Anteontem, ao anunciar a investigação sobre o acordo de colaboração, o procurador-geral disse que as provas apresentadas na delação não serão invalidadas.

De acordo com Rodrigo Janot, os delatores podem perder o benefício, mas as provas permanecem válidas e podem ser utilizadas. Ele fez também uma defesa da delação premiada como mecanismo de investigação de atos de corrupção.

 

CONSELHO A RAQUEL DODGE

As considerações do procurador-geral ontem sobre o fim do mandato foram motivadas por discursos de colegas que elogiaram sua atuação à frente da PGR. Em seu pronunciamento, Janot destacou a intensidade dos últimos dias.

— É uma montanha-russa que só tem queda livre, que não dá um respiro de uma subida para preparar uma nova queda — disse.

Ao se dirigir à sua sucessora, Raquel Dodge, Janot disse que “está tentando deixar a casa arrumada” e deu um conselho para a procuradora:

— Quero desejar a você, Raquel, todo o sucesso. Estou tentando, na medida do possível, deixar a casa arrumada para que assuma e quero dizer também uma palavra de otimismo, de apoio. Nos momentos difíceis, não desanime, converse — concluiu Janot.

Mais cedo, Raquel tinha sido uma das conselheiras a elogiar Rodrigo Janot.

— O legado que deixa para nossa instituição e nosso país é certamente um legado que honra o trabalho do Ministério Público — afirmou Raquel.

O conselho tratou, na reunião de ontem, da promoção de integrantes do MPF a cargos de procurador regional. Janot permaneceu na sessão durante todo o tempo da votação, assim como Raquel Dodge.