O Estado de São Paulo, n. 45237, 25/08/2017. Política, p.A6

 

 

Supremo tem de ‘conter’ Gilmar, diz associação

Em carta, procuradores criticam atuação do ministro; Rio tem ato ‘pró-Bretas’

Por: Julia Affonso / Constança Rezende / Beatriz Bulla / Fausto Macedo / Luiz Vassallo

 

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) divulgou ontem uma carta aberta ao Supremo Tribunal Federal (STF) com críticas ao ministro Gilmar Mendes e um pedido de que a Corte tome uma atitude em prol da “credibilidade de todo o sistema judiciário”. Os procuradores apontam as críticas feitas por Gilmar ao Ministério Público e sua atuação em casos em que foi apontado como suspeito.

“Senhores ministros, apenas o Supremo pode corrigir o Supremo, e apenas a Corte pode – e deve, permita-nos dizer – conter ação e comportamento de ministro seu que põe em risco a imparcialidade. Um caso que seja em que a Justiça não restaure sua inteira imparcialidade põe em risco a credibilidade de todo Poder Judiciário”, escreve a associação. Os procuradores destacam que “não é a primeira vez” em que a suspeição de Gilmar é apontada, em uma situação “evidente a todos”.

A ANPR, que representa mais de 1,3 mil procuradores da República, afirma que juízes e membros do Ministério Público já tiveram de responder para suas corregedorias por “declarações não raro bem menos assertivas” do que as de Gilmar. “Não existem corregedores para os membros do Supremo”, destaca a associação.

Até a conclusão desta edição, Gilmar não havia se manifestado sobre a carta da associação. O embate entre o ministro e o Ministério Público ganhou dimensões elevadas quando o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a suspeição do ministro no caso do empresário Eike Batista.

Em abril, Gilmar concedeu habeas corpus pedido pela defesa de Eike para suspender os efeitos da prisão preventiva e soltá-lo. Após a decisão do ministro, Janot requereu ao STF que o ministro fosse declarado impedido de atuar no habeas.

Segundo o procurador-geral, logo depois da decisão de Gilmar, surgiram questionamentos sobre a “isenção do ministro” para atuar no caso, já que sua mulher, Guiomar Mendes, integraria o Escritório de Advocacia Sérgio Bermudes, “que prestaria serviços ao paciente Eike Fuhrken Batista, beneficiado pela decisão do magistrado.”

Em agosto, Janot pediu novamente a suspeição de Gilmar. Desta vez, no caso do “rei do ônibus”. O ministro concedeu dois habeas corpus em 24 horas ao empresário Jacob Barata Filho. Gilmar colocou em liberdade outros oito investigados da Operação Ponto Final.

Após soltar o empresário Jacob Barata Filho, o “rei do ônibus”, reformando decisão do juiz Marcelo Bretas, Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal do

Rio, o ministro reagiu enfaticamente às críticas da Procuradoria da República que pediu sua suspeição e impedimento.

 

Ato. Procuradores da Lava Jato no Rio, juízes federais, políticos e artistas – entre eles Caetano Veloso, Cristiane Torloni e Marcelo Serrado – participam, ontem, do início de manifestação em apoio a Bretas.

O juiz não discursou nem quis dar entrevistas. Caetano disse que os artistas são “parte da sociedade e uma parte visível da sociedade”. “Faz anos escrevi um texto que dizia que a independência do Ministério Público talvez fosse o ponto mais importante da Constituinte de 88”, afirmou. / JULIA AFFONSO, CONSTANÇA REZENDE, BEATRIZ BULLA, FAUSTO MACEDO e LUIZ VASSALLO

 

Manifestação. Ato em defesa do juiz Marcelo Bretas, no Rio de Janeiro, reuniu artistas; faixa contém erro de pontuação

 

‘Credibilidade’

“Apenas o Supremo pode corrigir o Supremo, e apenas a Corte pode – e deve, permita-nos dizer – conter ação e comportamento de Ministro seu que põe em risco a imparcialidade. Um caso que seja em que a Justiça não restaure sua inteira imparcialidade, põe em risco a credibilidade de todo Poder Judiciário”

 

PARA LEMBRAR

Ministro se opõe a Janot

Nos últimos meses, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e membros do Ministério Público Federal, especialmente o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, têm entrado em constante embate direito. Em 8 de agosto, por exemplo, no mesmo dia em que a defesa do presidente Michel Temer encaminhou pedido de suspeição contra Janot, o ministro do STF voltou a criticar o chefe da Procuradoria. Gilmar afirmou que o Ministério Público virou “terra de ninguém” com um “festival de investigações sem controle judicial”. Janot, por sua vez, já reagiu publicamente às críticas de Gilmar. Em março, sem mencionar o nome do magistrado, o procurador-geral acusou o ministro de sofrer de “decrepitude moral” e “disenteria verbal”. Também como uma forma de responder aos ataques, Janot também pediu ao Supremo a suspeição de Gilmar para julgar casos envolvendo os empresários Eike Batista e Jacob Barata Filho, conhecido como o “rei do ônibus” do Rio.

 

 

 

 

Ex-governador entrega imagens de políticos recebendo dinheiro

Segundo reportagem do ‘Jornal Nacional’, da TV Globo, filmagens cedidas por Silval Barbosa fazem parte de sua delação

 

O ex-governador de Mato Grosso Silval Barbosa (PMDB) entregou à Procuradoria-Geral da República, como forma de corroboração à sua delação premiada, vídeos que mostram políticos do Estado recebendo maços de dinheiro.

Segundo reportagem do Jornal Nacional, da TV Globo, o exgovernador afirmou que as gravações foram feitas pelo então chefe de gabinete, Silvio Cesar. De acordo com Silval, ele era o funcionário responsável por entregar os valores. O dinheiro, conforme relato do ex-governador, era proveniente de esquemas de propina no Estado.

O acordo de delação premiada de Silval foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no início deste mês. Na semana anterior à homologação do acordo do ex-governador, o ministro Luiz Fux, do Supremo, afirmou que se tratava de uma delação “monstruosa”.

Entre os políticos flagrados nas imagens estão o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (PMDB), que chegou a colocar tantas notas em seus bolsos que parte delas caiu no chão. O vídeo mostra Emanuel Pinheiro agachando-se para juntar as cédulas espalhadas.

O deputado federal Ezequiel Fonseca (PP) aparece nas imagens recebendo o dinheiro em uma caixa de papelão. O então deputado estadual Hermínio Barreto (PR) é flagrado com os maços em uma mala.

A prefeita de Juara (MT), Luciane Bezerra (PSB), também pode ser identificada no vídeo levando o dinheiro na bolsa. O ex-deputado estadual Alexandre César (PT) aparece levando notas em uma mochila.

Silval, que foi governador de Mato Grosso entre 2010 e 2014, fez delação após prisão na Operação Sodoma, sob suspeita de liderar esquema de recebimento de propina em troca da concessão de incentivos fiscais.

À TV Globo, Emanuel Pinheiro, disse que não fez nada ilícito e que vai comprovar isso na Justiça. O deputado estadual Oscar Bezerra declarou que a mulher dele, Luciane Bezerra, recebeu dinheiro para quitar dívidas de campanha eleitoral. Segundo a reportagem, o advogado de Silvio Cesar disse que não comentaria porque a delação está sob sigilo. Os demais citados não foram localizados.

 

Cargo. Silval Barbosa em 2014, quando era governador

 

 

 

Moro aceita denúncia e Bendine se torna réu

Por: Julia Affonso / Ricardo Brandt / Luiz Vassallo / Fausto Macedo

 

O juiz Sérgio Moro aceitou a denúncia do Ministério Público Federal contra o ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobrás Aldemir Bendine na Lava Jato. O executivo, agora réu, é acusado de receber R$ 3 milhões em propina da Odebrecht. Segundo a denúncia, Bendine primeiro fez um pedido de propina de R$ 17 milhões, quando era presidente do BB, “para viabilizar a rolagem de dívida de um financiamento da Odebrecht Agroindustrial”.

A empreiteira, no entanto, de acordo com a investigação, optou por pagar R$ 3 milhões. O valor, diz a força-tarefa, foi repassado em três entregas em espécie, no valor de R$ 1 milhão cada, em São Paulo.

Em contrapartida ao pagamento de propina pela Odebrecht, Bendine – já presidente da Petrobrás –, segundo a força-tarefa, chegou a solicitar ao departamento jurídico da companhia parecer sobre a possibilidade de levantamento do bloqueio cautelar imposto pela estatal contra a Odebrecht Óleo e Gás.

À época da denúncia, o advogado Pierpaolo Bottini, que defende Bendine, disse que “a atuação de Aldemir Bendine no Banco do Brasil e na Petrobrás pautou-se pela legalidade, e não houve benefício a Odebrecht ou a qualquer outra empresa”. A Odebrecht diz colaborar com as investigações. /JULIA AFFONSO, RICARDO BRANDT, LUIZ VASSALLO e FAUSTO MACEDO

 

Aécio Neves

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, solicitou ao Supremo Tribunal Federal que o pedido de prisão do senador Aécio Neves (PSDB-MG) seja analisado na Primeira Turma da Corte.