Correio braziliense, n. 19822, 30/08/2017. Política, p. 3.

 

 

Delação nas mãos de Fachin

Renato Souza

30/08/2017

 

 

A delação do operador financeiro Lúcio Funaro, o mais novo “homem-bomba” da República, chegou ontem ao gabinete do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal. Cabe ao relator da Lava-Jato no STF homologar o acordo de Funaro com a Procuradoria-Geral da República (PGR). Só depois disso, o Ministério Público Federal pode utilizar as informações prestadas pelo operador para fazer investigações. Antes de validar a delação, o ministro deve convocar o colaborador para confirmar que o acordo foi assinado de forma espontânea. O conteúdo da delação é mantido em sigilo.

A expectativa é de que a delação do doleiro atinja em cheio a cúpula do PMDB. Funaro fechou o acordo com o MPF no último dia 22. Em depoimento, acusou autoridades com foro privilegiado de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras. Ele é processado pela Justiça Federal de Brasília no âmbito de três investigações da Polícia Federal que resultaram nas operações Greenfield, Sépsis e a Cui Bono? (que significa “a quem interessa?”). As ações envolvem suspeitas de desvios de recursos públicos e fraudes na administração de quatro dos maiores fundos de pensão de empresas públicas do país: Funcef (Caixa), Petros (Petrobras), Previ (Banco do Brasil) e Postalis (Correios).

Nas investigações da Lava-Jato, Funaro é apontado como o operador do esquema de pagamento de propina para deputados do PMDB na Câmara. Ele é  testemunha-chave nos processos envolvendo o ex-deputado Eduardo Cunha e os ex-ministros Henrique Eduardo Alves e Geddel Vieira Lima. As informações que o doleiro repassou em depoimento à Justiça Federal foram suficientes para resultar na prisão de Geddel, que acabou posteriormente revogada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

 

Denúncia

O conteúdo da delação deve ser usado em diversos processos que tiveram origem nas investigações da Lava-Jato. Antes mesmo de fechar o acordo de colaboração com a Justiça, Lúcio Funaro informou que ainda tinha revelações sobre o presidente Michel Temer. Na delação, de acordo com fontes que tiveram acesso ao documento, o doleiro contou que recebeu dinheiro mesmo após ter sido preso. No entanto, ele não confirmou que os recursos foram repassados para impedir que ele contasse o que sabe para as autoridades. Perante os investigadores, Funaro afirmou que o dinheiro se refere a “assuntos anteriores”.

Os procuradores do Ministério Público, no entanto, acreditam que a propina foi repassada para tentar impedir a delação do doleiro. Se confirmada, essa prática pode ser interpretada como uma tentativa de obstruir os trabalhos da investigação.  A expectativa é de que uma segunda denúncia contra o presidente Michel Temer seja apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ainda esta semana. Caso se confirme, ela segue o mesmo trâmite da primeira. O processo contra Temer está parado por conta da denúncia ter sido barrada no plenário da Câmara, em 2 de agosto.

A investigação já realizada só pode ter continuidade após o mandado presidencial. Em um vídeo, divulgado nas redes sociais antes de viajar para a China, Temer criticou o que ele chama de “gente que quer parar o Brasil”. O discurso foi visto como uma declaração prévia sobre as próximas ações do Ministério Público. “Sabemos que tem gente que quer parar o Brasil, e esse desejo não tem limites. Quer colocar obstáculos ao nosso trabalho, semear a desordem nas instituições, mas tenho a força necessária para resistir”