Correio braziliense, n. 19834, 11/09/2017. Política, p. 3

 

Miller fica de fora da prisão

11/09/2017

 

 

Dos três pedidos de prisão feitos ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, levou dois. Os executivos da J&F Joesley Batista e Ricardo Saud são acusados de omitir informações no acordo de delação premiada. O chefe do Ministério Público Federal (MPF), entretanto, não recebeu a autorização para prender o ex-procurador Marcelo Miller. A derrota de Janot é simbólica, afinal, entre os próprios integrantes do MPF, acreditava-se em dois pesos e duas medidas envolvendo Miller e o outro integrante da Procuradoria-Geral da República (PGR) Ângelo Goulart Vilela, que é acusado de repassar informações sigilosas de investigações relacionadas a empresas do grupo J&F, dono da JBS.

Próximo de Janot, Miller chegou a atuar na Operação Lava-Jato e, pelo menos seis meses antes de pedir exoneração das funções de procurador, atuava no Rio de Janeiro. Mesmo assim, existe a suspeita de jogo duplo em favor de executivos da J&F e uma suposta proteção, o que teria provocado uma reação do procurador-geral da República ao pedir a prisão do ex-subordinado.

O advogado é o pivô da investigação que pode culminar na rescisão da delação de Joesley e Saud, que tem como base áudio enviado pela defesa dos colaboradores em anexo complementar sobre o senador Ciro Nogueira (PP). Ele integrou a força-tarefa da Operação Lava-Jato e atuou nas delações do ex-senador Delcídio do Amaral e do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.

Após deixar o MPF, ele passou a integrar o escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe, e integrou o time de advogados que negociaram o acordo de leniência da J&F. O ex-procurador ainda fazia parte do Ministério Público quando começou a conversar com os executivos, ao final de fevereiro. Ele pediu exoneração das funções no mesmo mês, mas a deixou de fato apenas em abril. No áudio dos delatores, alvo de investigação, ele é mencionado por Joesley como um procurador da República que atuaria em benefício do grupo.

Justificativas

Em comunicado divulgado ontem, a defesa de Miller repudiou “veementemente o conteúdo fantasioso e ofensivo das menções ao seu nome nas gravações divulgadas”. Ele ainda afirmou que “jamais fez jogo duplo ou agiu contra a lei”. Ao fim, conclui que sempre acreditou na Justiça e nas instituições e que está à disposição para prestar esclarecimentos e auxiliar nas investigações.

Entre os argumentos a favor do cliente, a defesa detalhou que ele não tinha contato com Janot e não atuava na Lava-Jato desde outubro de 2016.Os defensores ainda afirmaram que Miller nunca atuou na Operação Greenfield, que investigou irregularidades envolvendo a J&F, nem na Procuradoria da República em Brasília. “Enquanto procurador, nunca atuou em investigações ou processos relativos ao Grupo J&F, nem buscou dados ou informações nos bancos de dados do Ministério Público Federal sobre essas pessoas e empresas. Pediu exoneração em 23/2/2017, tendo essa informação circulado imediatamente no MPF. Nunca obstruiu investigações de qualquer espécie, nem alegou ou sugeriu poder influenciar qualquer membro do MPF”, disseram os advogados.

Em nota, a J&F informa que  Joesley e Saud não mentiram, nem omitiram informações no processo que levou ao acordo de colaboração premiada. A companhia ainda alegou que os executivos estão cumprindo o acordo de delação celebrado com o MPF e homologado pelo ministro do STF Edson Fachin.

A empresa ainda enfatizou que ambos se apresentaram voluntariamente à Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. “Em todos os processos de colaboração, os colaboradores entregam os anexos e as provas à Procuradoria e depois são chamados a depor. Nesse caso, Joesley Batista e Ricardo Saud ainda não foram ouvidos”, disse a defesa. Segundo a nota, no dia 31 de agosto, “cumprindo o prazo do acordo, além dos áudios, foi entregue uma série de anexos complementares, e os dois colaboradores ainda estão à espera de serem chamados para ser ouvidos”.

Frase

“Enquanto procurador, nunca atuou em investigações ou processos relativos ao Grupo J&F”

Informou a defesa de Marcelo Miller