Mais indícios do jogo duplo

Guilherme Mendes e Aline Brito

12/09/2017

 

 

Antes de assumir uma vaga no escritório que negociou a delação da J&F, o ex-procurador Marcelo Miller já tratava sobre a colaboração premiada enquanto estava no Ministério Público. A acusação, feita pelo procurador-geral Rodrigo Janot, está no pedido de prisão feito contra Miller e os executivos da J&F Joesley Batista e Ricardo Saud.

Na ação, protocolada na última sexta-feira no Supremo Tribunal Federal, Janot afirma que e-mails entregues pelo escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe comprovam a ação do ex-procurador. O material, não revelado, mostraria que o ex-procurador já tratava da leniência da J&F, antes de vir a integrar a equipe de advogados do escritório. Ainda segundo o procurador-geral, Miller discutia com uma advogada da Trench, Rossi e Watanabe a questão de “voos para reuniões, referências a orientações à empresa J&F e inícios de tratativas”. O pedido de prisão foi parcialmente acolhido pelo ministro Edson Facchin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal — apenas Joesley e Saud acabaram atrás das grades.

Após sair do MP, Miller foi recrutado para o Trench, Rossi e Watanabe. O ex-procurador teria auxiliado os executivos da J&F, sendo depois citado em gravações de Joesley Batista e Ricardo Saud. Em nota, o escritório informou que está auxiliando as autoridades competentes e que os profissionais mencionados nas investigações não fazem mais parte do quadro de advogados.

Na avaliação do professor de direito penal da Universidade Mackenzie Humberto Barrionuevo, o ex-procurador pode ter incorrido no crime de corrupção passiva. “Mas, para isso ter ocorrido, ele tem que ter atuado em favor da empresa, violando dever funcional e recebendo para isso.” Para Glauter Del Nero, professor no Complexo Damásio de Jesus, o crime de corrupção “não exige a consumação de um resultado para que se concretize”. Caso não tenha havido troca de favores, Glauter não enxerga que houve crime.

 

Busca e apreensão

Ontem, a Polícia Federal fez buscas na casa de Marcelo Miller no Rio de Janeiro. A PF encerrou, por volta das 8h, a ação. Os agentes haviam chegado ao prédio do ex-procurador, num bairro nobre da Zona Sul da capital fluminense, por volta das 6h.  Os agentes deixaram o local em dois carros, um da Polícia Federal, e outro, da Procuradoria-Geral da República. Os policiais saíram carregando dois malotes com evidências apreendidas no apartamento de Miller.

A defesa do ex-procurador informou, por meio de nota, que seu cliente “recebeu com tranquilidade o pedido de buscas no seu apartamento e colaborou, apresentando tudo o que foi solicitado”. “(Miller) Ressalta que continua à disposição, como sempre esteve e sempre estará, para prestar qualquer esclarecimento necessário e auxiliar a investigação no restabelecimento da verdade”, prosseguiu o comunicado, assinado pelos advogados André Perecmanis e Paulo Klein.