O globo, n.30760 , 25/10/2017. PAÍS, p.6

Moro: ‘Estamos falando de corrupção, não de minissaia’

GUSTAVO SCHMITT

DIMITRIUS DANTAS

 

 

Juiz diz que hora não é de discussão sobre moral, mas sobre crimes

 

Ao rebater críticas contra o uso de delações premiadas e as prisões preventivas decretadas na Operação Lava-Jato, o juiz Sergio Moro defendeu ontem medidas duras para que as investigações contra corrupção avancem, e os crimes sejam interrompidos. De acordo com o juiz, a discussão não é sobre uma questão moral, como “a altura da minissaia”, mas sobre estancar a corrupção sistêmica no país.

— Não estou falando de deterioração moral. Não estamos falando aqui de altura de minissaia. Estamos falando de crimes de corrupção. Não queremos pautar condutas éticas das pessoas — disse Moro, durante um seminário do jornal “O Estado de S. Paulo”.

Foram debatidos o futuro da Lava-Jato e o legado da operação Mãos Limpas, que levou empresários e políticos à cadeia na década de 1990 na Itália. O encontro também teve a a participação do procurador da Lava-Jato Deltan Dallagnol.

Para Sergio Moro, é necessária uma resposta institucional contra os desvios. Sem citar nominalmente, ele lembrou o caso do ex-ministro Geddel Vieira Lima, que está preso, após a Polícia Federal encontrar R$ 51 milhões em espécie num apartamento em Salvador ligado ao peemedebista.

— Eu posso falar com um pouco mais de conforto porque não é um caso meu. Se formos estudar um pouco a história desse indivíduo, temos notícias dessa pessoa envolvida em práticas criminosas que datam da década de 1990. Será que, se as instituições tivessem dado uma resposta naquela época, não teríamos eliminado esse apartamento? — afirmou o juiz da Lava-Jato.

Ao falar sobre o legado da operação e do clima de desesperança no país, Moro disse que não se combate a corrupção com processos judiciais. O juiz defendeu reformas legislativas.

— A redução da impunidade pelo processo judicial não é suficiente. Os processos são muito difíceis. São necessárias reformas para diminuir incentivos e oportunidades de corrupção — disse o magistrado.

Ao justificar a necessidade de mudanças, Moro citou como exemplo a prática de indicações de cargos na Petrobras por pessoas que arrecadam recursos para os partidos.

— Isso (referindo-se ao loteamento dos cargos) foi uma das fontes de corrupção. E não se veem movimentos para alterar esse quadro — alertou o juiz, reiterando que é importante a mobilização da sociedade para superar o que chamou de “corrupção sistêmica”.

Moro ainda refutou as acusações de que há muitos casos de réus na Lava-Jato cujas prisões preventivas se arrastam antes da condenação, como foi o caso de José Dirceu, libertado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Moro destacou que a maioria dos julgamentos de réus presos ocorre em questão de meses. Para o juiz, se há preocupação para esse tipo de prazo, deveria haver o mesmo critério, “abrindo a porta das prisões”, não só para quem prática crime de colarinho-branco, mas também para outros criminosos que também aguardam julgamento em segunda instância nas prisões do país:

— Se for pensar, no entanto, em excesso de prazo de prisão preventiva para além da sentença de primeira instância, tem que se pensar em outros prazos. Tem que se pensar em abrir as prisões brasileiras porque não são só criminosos de colarinho-branco respondendo em fase recursal. Se formos aplicar essa medida, temos que abrir a porta da prisão.

Ao responder se a corrupção revelada pela Lava-Jato se igualaria à liberação de emendas para parlamentares pelo governo do presidente Michel Temer para salvar o mandatário de denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), Moro ponderou que não poderia falar de caso concreto, mas defendeu mudanças nas práticas políticas.