Correio braziliense, n. 19837, 14/09/2017. Política, p. 2.

 

Janot prepara flechas sem saber o efeito

Bernardo Bittar

14/09/2017

 

 

Com o adiamento da sessão que analisava se o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, poderia oferecer nova denúncia contra o presidente Michel Temer, é possível que as últimas flechadas da PGR não atinjam o Planalto. Janot precisa apresentar provas antes de deixar o cargo, mas, como o Supremo Tribunal Federal (STF) deixou a decisão para a semana que vem, a denúncia pode acabar invalidada. Na próxima segunda-feira, a chefia do Ministério Público Federal (MPF) passa a ser de Raquel Dodge.

Como a suspensão não foi concluída, Janot, em tese, pode apresentar nova denúncia contra Michel Temer. A expectativa é de que o peemedebista seja acusado de participação em organização criminosa. O risco, no entanto, é de que a peça fique parada no STF até a próxima quarta-feira, quando ocorre o julgamento do pedido da defesa de Temer de condicionar a nova denúncia à conclusão do julgamento sobre a omissão dos executivos da JBS. Outra possibilidade é a denúncia perder a validade, o que ocorre se os ministros entenderem que ela ainda não poderia ter sido oferecida pelo PGR. Janot deixa o cargo máximo do Ministério Público neste domingo, três dias antes de a sessão ser retomada.

A possibilidade de proibir uma nova denúncia contra o presidente começou a ser analisada no plenário da Corte, mas apenas a defesa de Michel Temer e o Ministério Público tiveram tempo de se manifestar. Pouco depois das 18h, a ministra Cármen Lúcia, chefe do Supremo, suspendeu a solenidade “por causa do horário”. Os magistrados vinham de um recesso de aproximadamente 30 minutos.

O advogado de Temer, Antônio Claudio Mariz de Oliveira, afirmou que, apesar do preparo e da honradez de Janot, “por razões desconhecidas”, ele não estaria agindo com a “indispensável imparcialidade”. Representante do Ministério Público, o subprocurador-geral da República Nicolao Dino afirmou que “as acusações contra Janot são absolutamente infundadas”.

A defesa do presidente quer paralisar a tramitação de nova denúncia até o fim das investigações sobre suposta omissão de executivos da JBS em suas delações premiadas porque parte do material entregue por Joesley Batista e Ricardo Saud será usada pela PGR na acusação contra Temer. “Acho temerário o processo de uma denúncia em face dos dados que estão sendo colhidos”, disse o advogado Antônio Mariz.

 

Suspeição

Ontem, o STF também analisou o pedido de arguição de suspeição do PGR nas denúncias contra Michel Temer. O Supremo decidiu por unanimidade manter Janot à frente das investigações envolvendo o presidente da República. A defesa de Temer alega que o Ministério Público o está perseguindo. Ao todo, nove dos 11 ministros votaram. Dois estavam fora. Eram Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Mendes acompanhou o julgamento do gabinete dele no STF, e Barroso estava fora do país.

O relator do processo, ministro Edson Fachin, afirmou que o regimento interno do STF não prevê a hipótese de um procurador-geral da República ser considerado suspeito, e que, por isso, não há razão para se falar em “inimizade capital” entre Janot e Temer. A expressão foi usada pela defesa, tentando justificar o que foi qualificado como “perseguição”.

Em seu voto, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que o procurador-geral estava exercendo o “ônus constitucional” de sua competência ao denunciar o presidente da República. “Se, eventualmente, usou expressão um pouco mais, digamos, inusitada, essa expressão também foi endereçada a outros investigados”, explicou.

Ainda segundo ele, isso mostra que Temer “não foi alvo exclusivo” das ações de Rodrigo Janot. “Também outros partidos, outros políticos foram igualmente atingidos. Portanto, não há que se cogitar hipótese de suspeição”, completou. Um pedido de arguição de suspeição ocorre quando existem indícios de que um juiz, um membro do Ministério Público ou até um servidor da Justiça tenha sido parcial em um caso por ter motivo para estar interessado nele. Recentemente, o próprio Gilmar Mendes foi alvo de ação semelhante, ao mandar soltar um preso da Operação Lava-Jato — pai da mulher de quem ele foi padrinho de casamento.