Correio braziliense, n. 19841, 18/09/2017. Política, p. 4.

 

Repúdio ao discurso de intervenção militar

Hamilton Ferrari

18/09/2017

 

 

O Exército repreendeu o discurso de um general que defendeu a intervenção militar caso a “situação política do país” não seja resolvida pelas próprias instituições. O comandante da corporação, Eduardo Villa Bôas, disse que “não há qualquer possibilidade” de intervenção militar. O secretário de Economia e de Finanças do Exército, general Antonio Hamilton Martins Mourão, fez a declaração na última sexta, em uma palestra na Loja Maçônica Grande Oriente, em Brasília.

Mourão declarou que o Exército terá que “impor” a solução do problema político se o Judiciário não tomar as medidas. “Nós temos planejamentos, muito benfeitos. Então, no presente momento, o que nós vislumbramos: os poderes terão que buscar solução. Se não conseguirem, chegará a hora em que nós teremos que impor uma solução. E essa imposição não será fácil, terá problemas, podem ter certeza disso aí”, afirmou Mourão.

Villas Bôas alegou que desde 1985 o Exército não é responsável por turbulência na “vida nacional” e que assim vai prosseguir. “Defendemos a manutenção da democracia, a preservação da Constituição, além da proteção das instituições”, afirmou. Villas Bôas destacou que o assunto foi “conversado” e “superado” internamente. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, conversou com o comandante do Exército no sábado para entender o que estava ocorrendo e, segundo o general, o contexto das declarações foi explicado. Ontem, o general Mourão recuou e disse que não estava pregando a intervenção militar. Declarou também que a interpretação das suas palavras “é livre” e que não discursava em nome do Exército.

 

Repercussão

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública afirmou que o discurso do general causa “estranheza” e “preocupação”. Além disso, destacou que é grave o fato de Mourão estar fardado na palestra, “representando” o Exército. “Ela é ainda mais grave por ter sido emitida pelo secretário de economia e finanças, responsável pelo gerenciamento de recursos da Força e, portanto, soar como chantagem aos poderes constituídos em um momento de restrição orçamentária”, informou.

Mourão nasceu em Porto Alegre e está no Exército desde 1972, época da ditadura militar. Ele foi exonerado do Comando Militar do Sul em 2015 depois que fez críticas ao governo de Dilma Rousseff e à classe política. Em sua conta no Facebook, o general é saudado por defensores da intervenção: “Mourão para presidente, já”. Ele disse que não pretende se candidatar. “Não sou político. Sou soldado”, afirmou. Ele passará para a reserva do Exército até março do ano que vem.

Durante o discurso, Mourão se classificou como integrante da comunidade de inteligência, graduado como oficial na Escola do Serviço Nacional de Informações (ESNI), que foi criado depois do golpe militar de 1964 e durou até 1990. O serviço de informações foi utilizado pelos militares para encontrar pessoas que tinham posições contrárias à ditadura.