O Estado de São Paulo, n. 45257, 14/09/2017. Política, p. A8.

 

STF legitima Janot e abre caminho para 2ª denúncia

 Beatriz Bulla / Breno Pires / Rafael Moraes Moura / Igor Gadelha

14/09/2017

 

 

COLABORAÇÃO SOB SUSPEITA / STF rejeita suspeição de procurador-geral e deve apreciar na próxima semana pedido de suspensão de eventual nova acusação contra Temer

 

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, na condução de investigações contra o presidente Michel Temer. Mas deixou para a próxima semana, quando Janot já terá deixado o cargo, a palavra final sobre a suspensão de uma eventual segunda denúncia contra o peemedebista. A defesa de Temer pediu a suspeição do procurador – o que foi rejeitado por unanimidade pelos nove ministros presentes – e tenta suspender o andamento de uma nova acusação até que se esclareçam os problemas que surgiram na delação da J&F.

Ao deixar o julgamento suspenso, o Supremo abre caminho para que Janot cumpra seu calendário e envie, ainda nesta semana, nova denúncia. Decano do STF, o ministro Celso de Mello afirmou, ao deixar a sessão, que Janot tem “plena liberdade”. “No presente momento, como não há ordem emanada pelo STF, o procurador tem plena liberdade para agir, sem esse tipo de limitação”, declarou.

A discussão poderia ser retomada pelo plenário do STF hoje, mas a presidente Cármen Lúcia decidiu pautar o julgamento de ações envolvendo o Código Florestal. Um dia antes, a presidente se reuniu com a subprocuradora Raquel Dodge, que assumirá o comando da PGR a partir de segunda-feira.

Há integrantes do STF que consideram que, após a chegada da peça, Fachin deverá esperar a solução do plenário antes de enviar a acusação para a Câmara.

O Palácio do Planalto já contava com uma derrota quanto ao pedido de suspeição, mas apostava que a Corte poderia suspender a possibilidade de Janot encaminhar nova denúncia neste momento. Para o criminalista Antônio Claudio Mariz, responsável pela defesa de Temer, as provas obtidas por meio da colaboração da J&F podem ter sido forjadas, conter mentiras e terem sido fruto de “artimanha”. “Acho temerário o processamento de uma denúncia em face dos dados que estão sendo colhidos”, afirmou Mariz.

O ministro Marco Aurélio Mello criticou a iniciativa da defesa, o que considerou uma tentativa de “obstaculizar a oferta de uma denúncia pelo Ministério Público Federal”. “Pela primeira vez em 27 anos me defronto com o pedido de o Supremo obstaculizar a oferta de uma denúncia pelo MP. A meu ver isso é grave. Porque quebra o sistema – o sistema não só legal, mas constitucional”, disse Marco Aurélio.

Após a manifestação do ministro, Mariz afirmou que o pedido não é para impedir a oferta de uma denúncia, mas sim para não dar prosseguimento à acusação se eventualmente a peça chegar à Corte. A possibilidade de sustar o envio de uma denúncia pelo MP por um pedido da defesa é temida por procuradores, que alegam que o trabalho da instituição estaria em risco.

Ao final da sessão, Fachin conversou reservadamente em plenário com outros três ministros, entre eles Celso de Mello. Os ministros mencionaram que, no caso de denúncia contra presidente da República, o STF apenas encaminha a peça para a Câmara e se pronuncia só depois de os deputados autorizarem o processo. Esse entendimento é usado, nos bastidores, por ministros que defendem que não cabe discussão sobre a validade de provas da J&F antes da análise pela Câmara.

Na PGR, a tendência é pela rescisão completa do acordo celebrado com Joesley Batista e executivos do grupo. Janot pretende dar o veredicto no procedimento de revisão do acordo antes de deixar o cargo. Há precedente no STF de que a “desconstituição” do acordo tem eficácia restrita às partes e não beneficia ou prejudica terceiros.

 

Defesa do MP. Ministros saíram em defesa do Ministério Público. A presidente Cármen Lúcia afirmou que os processos da Lava Jato não vão parar em razão de mudanças de mandato. “Há instituições sólidas hoje no Brasil e o Ministério Público é uma delas. O STF não permitirá que a mudança de nome altere os rumos, porque as instituições são mais importantes do que as pessoas evidentemente.”

Em seu voto, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que Janot estava exercendo o seu dever constitucional ao denunciar o presidente da República. De acordo com o ministro, o presidente da República não foi o “alvo exclusivo” das ações de Janot. “Também outros partidos, outros políticos foram igualmente atingidos. Portanto, não há que se cogitar hipótese de suspeição”, afirmou.

A defesa mais enfática veio do decano Celso de Mello. “É preciso reconhecer que o MP independente constitui certeza e garantia dos direitos dos cidadãos.” Ele disse que o MPF não deve “curvar-se aos desígnios dos detentores do poder” e que Janot tem atuação “responsável, legítima e independente”.

Uma das vozes mais críticas a Janot na Corte, o ministro Gilmar Mendes não participou da primeira parte da sessão. Ele também é alvo de pedidos de suspeição feitos pelo próprio Janot. 

 

Discurso

Na estratégia de rebater uma eventual segunda denúncia, o presidente Michel Temer pretende fazer um pronunciamento político em tom mais enérgico assim que a ação for apresentada.

 

Decisão

“Pela primeira vez em 27 anos me defronto com o pedido de o Supremo obstaculizar a oferta de uma denúncia pelo MP.”

Marco Aurélio Mello

MINISTRO DO STF

 

“Também outros partidos foram atingidos. Não há que se cogitar hipótese de suspeição.”

Ricardo Lewandowski

MINISTRO DO STF

 

“Acho temerário o processamento de uma denúncia em face dos dados que estão sendo colhidos.”

Antônio Cláudio Mariz

ADVOGADO DE TEMER

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Procurador-geral acusa Agripino Maia de desvios em estádio

Breno Pires / Rafael Moraes Moura

14/09/2017

 

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou ontem uma denúncia contra José Agripino Maia (RN), senador e presidente do DEM, em um inquérito aberto para investigar recebimento de propina relacionada a obras da Arena das Dunas, estádio em Natal que foi palco de jogos na Copa de 2014.

A investigação foi aberta em 2015 para apurar se o senador recebeu propina da OAS em troca de auxílio político à construtora para facilitar a liberação de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A empreiteira venceu a licitação da obra na gestão de Rosalba Ciarlini (DEM) no governo potiguar.

O relatório da Polícia Federal sobre o caso, finalizado no mês passado, atribuiu o recebimento de propina de R$ 2 milhões da OAS ao senador. A PF vê envolvimento do empreiteiro José Aldemário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, da OAS.

Os crimes investigados em relação a Agripino Maia eram corrupção passiva e lavagem de dinheiro. No entanto, como a denúncia ainda não está disponível para visualização no Supremo Tribunal Federal, não é possível verificar se a acusação se deu por uma ou pelas duas acusações. A assessoria de imprensa da PGR afirmou não poder confirmar porque a denúncia foi enviada sob sigilo. No STF, o caso tramita sem sigilo.

De acordo com o relatório da PF, o recebimento das vantagens ilícitas se deu tanto por meio de doações eleitorais oficiais como por repasses em espécie, que transitaram por contas do próprio investigado e também por contas de parentes, entre 2012 e 2014, totalizando pelo menos R$ 2 milhões.

A investigação baseou-se no resultado da análise de mensagens de texto extraídas do celular de Léo Pinheiro, bem como nas informações colhidas na delação premiada do doleiro Alberto Youssef e do carregador de malas Rafael Angulo Lopez.

“Diante dos suficientes indícios de materialidade e autoria, foram então imputadas as condutas de corrupção passiva qualificada e lavagem de dinheiro ao senador José Agripino Maia; lavagem de dinheiro a Raimundo Alves Maia Júnior; corrupção ativa a José Aldemário Pinheiro Filho; além de crime de prevaricação a Carlos Thompson Costa Fernandes, conselheiro do TCE-RN à época dos fatos”, informou a PF.

 

Defesa. Em nota, o senador disse que “repudia” a acusação. “Em todos os depoimentos tomados e registrados ao longo do referido inquérito não consta nem sequer uma referência de pedido ou recebimento de valores em troca de qualquer tipo de retribuição ou vantagem.” Agripino Maia disse que defende o combate à corrupção, mas “não aceita ações que generalizam e maculam a dignidade, a imagem e o capital político de homens públicos”. 

 

Defesa. Agripino nega ter recebido propina em obra